Obras de Hard Rock Jeri ainda nem começaram, mas empresa já vendeu primeira fase do projeto
Empreendimento tem terreno cercado em um dos maiores cartões postais da região, a Lagoa Paraíso
Não é só na praia de Lagoinha, município de Paraipaba, que a marca Hard Rock quer instalar um resort no Ceará. Há quase dois anos, uma das guitarras mais famosas do mundo também está presente no pórtico de entrada de Jijoca de Jericoacoara. Além disso, na praça central da vila de Jeri é possível ter mais informações sobre o empreendimento em um rooftop instalado como ponto de venda que está, atualmente, em funcionamento.
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A área já cercada para a construção, com a identificação “HRH Jericoacoara Empreendimento Hoteleiro SPE LTDA” tem apenas duas placas com números de licença de instalação dado pela Secretaria do Meio Ambiente de Jijca de Jericoacoara (Setma), com data de início em junho de 2022 e validade até 08 de agosto de 2026 e pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), essa com validade já vencida em 14 de março deste ano.
O hotel de luxo, que prevê 515 unidades habitacionais, 11 comerciais, spa, duas mega piscinas e 2 mil metros quadrados de áreas para eventos, está no site da Residence Club, empresa responsável pela construção dos dois resorts previstos para o Ceará, com a frase "Coming soon", ou seja, "em breve".
Ao todo a área possui, de acordo com documento da prefeitura local, 12,26 hectares (122,6 mil metros quadrados), sendo que destes 55,4 mil metros quadrados seriam de área construída.
No mesmo local ainda tem a informação de que o preço de venda varia “de acordo com o tipo do imóvel, com a metragem das unidades e com a sazonalidade das semanas de uso escolhidas”. Isso porque o resort deve seguir o mesmo modelo de multipropriedade que foi vendido também em Lagoinha.
O empreendimento foi pensando em ser multipropriedade, regime onde o comprador vira dono de uma pequena fração do imóvel. Isso garantia o direito vitalício a uso do espaço por semanas ao ano, sem precisar pagar estadia.
O proprietário também tem a opção de alugar a unidade durante o seu período. Essa modalidade era uma aposta de captação rápida de recursos para, então, finalizar a construção.
Ao fazer contato pelo canal do site, o possível comprador é encaminhado para uma conversa de WhatsApp. Lá, um representante comercial tenta convencê-lo dos benefícios do hotel em Paraipaba.
Não é oferecido o resort de Jericoacoara e, ao ser questionado, recebe-se a seguinte informação: “Primeira fase de vendas de Jeri esgotado. Somente será vendida a segunda fase para proprietários”.
Como promete ser o lugar
Na descrição do imóvel no site da empresa responsável, o local promete ter arquitetura inspirada nos resorts internacionais do sudeste asiático, e um Beach Club exclusivo que mescla referências de Bali, na Indonésia, com a cultura local do Ceará, “em uma das localizações mais privilegiadas e famosas da Jijoca, a Lagoa do Paraíso”.
Além destes dois empreendimentos no Ceará, a empresa também está construindo um no Paraná e ainda promete hotéis com a bandeira internacional nas cidades de Recife, Natal, Campos do Jordão e Foz do Iguaçu. Estes outros, porém, ainda não disponíveis para mais informações.
Na época do lançamento, o valor geral de vendas estimado era de R$ 900 milhões e foi comemorado pelas autoridades, como o prefeito de Jijoca, Lindbergh Martins, que em nota, na época, disse que "um empreendimento desse porte, além de movimentar toda a cadeia produtiva e a economia local, possibilita que o setor empresarial se adeque às novas exigências, ocasionando uma melhoria na qualidade da mão de obra e oferecendo um serviço mais qualificado e profissional, gerando mais emprego e renda para a região como um todo e proporcionando opções de entretenimento, além de oferecer hospedagem e uma gastronomia diferenciada".
Porém, procurada agora, a Prefeitura de Jijoca de Jericoacoara, por meio de sua assessoria de comunicação, preferiu não se manifestar sobre o assunto.
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Sustentabilidade e meio ambiente são preocupação
No segundo semestre de 2021, quando foi apresentado o projeto do HRH Jeri, um ponto ressaltado pela então empresa responsável, a VCI S.A, era a preocupação com a sustentabilidade.
Assim, o local teria manejo da água gerada pelos hóspedes do hotel, por meio da criação de estação de tratamento de água e esgoto, equipamentos de energia renovável em todas as unidades, reciclagem de resíduos orgânicos e sólidos, programa de preservação das espécies locais, arquitetura de mínimo impacto na paisagem, projetos de promoção da identidade cultural da região e treinamento de conscientização sobre sustentabilidade para as comunidades locais e turistas.
Porém, a preocupação não está sendo vista por quem frequenta e trabalha na região. Tecnólogo Ambiental e condutor de Turismo e Esportes de Aventura, Marcelo Liochi, faz parte do Conselho Comunitário de Jeri e está preocupado com os rumos que a “ocupação hoteleira predatória” pode estar tomando nas margens do Parque Nacional de Jericoacoara.
Ele lembra que ao delimitar e cercar o local em que será construído o resort Hard Rock, a empresa suprimiu toda a vegetação, tornando a área um grande “descampado”. A empresa ainda teria fechado ruelas utilizadas para passeios no parque, dificultando o acesso local.
“Além do Hard Rock são mais cinco resorts, pelo menos, que temos conhecimento. São mais de seis mil habitações e sabemos que o município não tem estrutura para receber empreendimentos desse porte, se olharmos para questões como saneamento”, destaca.
Liochi também comenta que os moradores esperam a posse das novas administrações municipais, tanto de Jijoca de Jericoacoara como de Cruz, para cobrar medidas.
“Não foi feita nenhuma audiência pública e não temos conhecimento de pedido de EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental) para o Estado. Precisamos estar vigilantes para que a região seja preservada dessas ações predatórias”, comenta.
Sem respostas
A reportagem do Diário do Nordeste procurou a Semace para saber se esse empreendimento tem licença ambiental válida para construção e se ele está em uma área de proteção ambiental (APA), na margem do Parque Nacional de Jericoacoara.
No entanto, o órgão não respondeu. O espaço encontra-se aberto para esclarecimentos.
A reportagem também procurou a Hard Rock International questionando se a marca conta realmente com essa construção em Jericoacoara. Se sim, se tem prazo já estabelecido e os motivos pelos quais acreditam que a localização pode ser um bom ponto de resort da marca no Brasil.
A marca também não retornou a demanda do Diário do Nordeste. O espaço segue à disposição da Hard Rock International.
Além disso, a reportagem procurou a Residence Club, empresa que assumiu no início deste ano os empreendimentos que eram da VCI e é responsável pela obra.
A ela foi perguntado se o empreendimento já está sendo vendido e se a obra já iniciou. Caso contrário, se tem expectativa de começar a construção e as vendas.
A empresa também foi questionada sobre as características desse hotel que estará localizado nas proximidades da Lagoa Paraíso (um dos cartões postais da região).
Todas as perguntas ficaram sem respostas. O espaço continua aberto, caso a empresa retorne as demandas do Diário do Nordeste.