Com aumento generalizado de preços, lojas de R$ 1,99 somem das ruas de Fortaleza
Crise fez lojas de variedades subirem o preço único ou ampliarem a faixa de valores
Foi-se o tempo que com uma cédula de dois peixinhos era possível voltar para casa com algum brinquedo, item de utilidade doméstica ou lembrancinha. Com o aumento generalizado de preços, as lojas de variedades precisaram subir o valor mínimo para além dos R$ 1,99.
O Diário do Nordeste rodou ruas do Centro, Messejana e Montese, bairros de Fortaleza que costumavam ter comércios de miudezas. Não foi encontrada nenhuma loja que ainda mantém o preço único em dois reais.
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Lojistas relatam que, com o aumento nos preços de matérias-primas e de frete, comercializar itens por um valor tão baixo se tornou inviável. Consumidores sentem falta da economia, mas mantêm o consumo em lojas de variedades, mesmo com os valores mais altos.
De acordo com o presidente do Sindicato do Comércio Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas), Cid Alves, ainda existem estabelecimentos de R$ 1,99 na periferia, mas a tendência é que aos poucos eles se tornem de R$ 3,99, R$ 4,99 e assim por diante.
Tudo mais caro
Como grande parte dos produtos vendidos em lojas de variedades são importados, esses itens foram afetados diretamente pela variação cambial nos últimos dois anos.
O custo do frete internacional subiu de forma considerável devido a problemas de logística, o que trouxe problema para as lojas que vendiam para o consumidor final a R$ 1,99.
O que acontece é que essas lojas de R$ 1,99 agora estão vendendo outros produtos produzidos por outras empresas internacionais que não tiveram na época um volume grande de vendas e agora precisam desovar no mercado internacional. São produtos similares, de boa qualidade, mas que não eram reconhecidos. Tem muita marca nova no mercado
Cid Alves destaca que essas marcas novas possibilitaram segurar os preços baixos por mais tempo, mas à medida que os estoques forem acabando, o custo ficará mais alto. O presidente do Sindilojas afirma que é inviável abastecer lojas com um ticket médio tão baixo sem o mercado internacional.
Segundo ele, as lojas de R$ 1,99 sumiram no Centro e em bairros mais tradicionais, mas resistem na periferia como forma de renda para famílias.
“Diminuiu o valor das compras de lojas de R$ 1,99, mas nos bairros existe muito ainda, a gente não vê no Centro, na Aldeota. Em outros bairros muitas pessoas subsistem pelas lojinhas de R$ 1,99”, defende.
Mudança de preços
Na Messejana, a loja O Mundo das Variedades surgiu como uma loja de R$ 1,99, mas mudou de perfil após a pandemia. Os produtos são parecidos, mas hoje o preço mínimo é de R$ 2,50 e há produtos de até R$ 200 reais a venda.
De acordo com uma vendedora que preferiu não se identificar, os clientes continuaram comprando normalmente, já que os produtos vendidos são necessários no dia a dia. “Os clientes reclamam, mas é isso mesmo. A nova realidade da gente é essa”, diz.
A dona de casa Maria Graciana Maciel, de 72 anos, é uma dessas clientes. Ela nem lembra a última vez que conseguiu comprar um produto por menos de R$ 2.
A gente comprava vasilha de plástico, prato com colher e copo, vasilha para sal, essas coisinhas de plástico. Agora compro ainda, mas mais caro. Em um dia a gente vem e é um preço, no outro quando vem já é outro. Não existe mais nada barato
A Arcamania, rede que possui seis lojas na Capital, também tinha uma ação de tudo por R$ 1. Hoje, a loja mudou o modelo de trabalho para atender um público mais amplo, variando as faixas de preço.
Na loja da rua General Sampaio, no Centro, há apenas um item de R$ 0,99: uma caixa com bombinhas de São João para crianças. Segundo a gerente da loja, Adriana Furtado, os clientes buscam esses itens mais baratos, mas não se restringem a eles. O ticket médio da loja é de por volta de R$ 50.
Uma mudança que ela relata após a pandemia é a exigência dos consumidores com relação a preços.
“Eles estão mais exigentes em relação a preço, isso é visível. Eles estão pesquisando mais, inclusive pela internet, pelos sites. Mudou um pouquinho já o modo de pensar. Eles pesquisam mais, andam mais de loja em loja”, pontua.
Consumo
A técnica de enfermagem Carolina Pantoja, de 24 anos, conta que sempre costumou frequentar lojas de variedades em busca dos preços baixos, mas mudou seu padrão de consumo quando os preços saíram da faixa dos R$ 1,99.
Eu passei a consumir menos, só vim comprar mesmo porque era uma necessidade. Antes era mais costumeiro passar e comprar, agora não, só quando estou precisando mesmo
A professora particular Adrielly Silva, de 20 anos, costuma consumir de lojas de preço único, mas prefere sempre quando há dias de promoção. Ela afirma pesquisar sempre os preços para conseguir um valor mais em conta.
Ela relata ter conseguido comprar maquiagens a R$ 1,99 há algumas semanas, em uma promoção, mas que o preço não é comum.
“Eu comprei batons na promoção, tinha base também, gloss. Estava em promoção e fui adquirindo, mesmo sem ter a necessidade, só porque o preço estava barato”, lembra.
Preço único
Na rua Floriano Peixoto, no Centro, a loja Lojão do 18 terá de mudar de nome em breve. De acordo com o gerente Eleldo Figueiredo, a partir do próximo dia 2 o preço único mudará de R$ 18 para R$ 20.
A loja de roupas e acessórios tinha preço único de R$ 15 até o final de 2021, mas o preço único precisou subir devido ao aumento nas matérias-primas e nos combustíveis, o que impacta o valor do frete.
“A gente tá avisando aos consumidores [da mudança de preços] para não pegar eles de surpresa. Estamos aumentando por conta dos aumentos, os combustíveis subiram novamente”, lamenta.
Mais a frente na mesma rua, a loja Empório Make há 4 anos mantém o preço único de R$ 10. O gerente Caio Leão garante que o negócio se mantém viável mesmo com a inflação e não há planos de mudar o valor oferecido ao consumidor final.
Para ele, o segredo para conseguir manter o preço é um bom relacionamento com fornecedores e um bom time de compras. A loja remaneja os produtos a venda quando não é possível manter dentro do preço único estabelecido.
"Tem produtos que não pertencem mais ao nosso leque, a gente muda para outros. Mas aí quando tem um relacionamento bom com fornecedor ele informa a gente de promoções e oportunidades, temos um setor de compra bem dedicado para sempre pegar produtos novos", diz.
Segundo ele, a procura só cresce em Fortaleza. Hoje, a marca já possui 5 lojas na capital.