'Aluno ouro' diz que rotina em escola integral de Fortaleza mudou a vida: 'estimulante se destacar'

Em Fortaleza, o aluno da rede pública municipal Tiago Marques de Melo, ao vivenciar os efeitos da pandemia ressignificou a percepção sobre a educação

Escrito por Thatiany Nascimento , thatiany.nascimento@svm.com.br
Tiago Marques de Melo
Legenda: Em 2022, no 8º ano, Tiago foi medalhista de ouro na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA).
Foto: Fabiane de Paula

A pandemia de Covid teve efeitos devastadores, além da saúde, na educação. Mas, apesar dos impactos negativos, em algumas realidades, se tornou um marco, alterando experiências de ensino e aprendizado e as dividindo entre antes e depois desse momento.

Em Fortaleza, no bairro Conjunto Ceará, aos 13 anos, o aluno da rede pública municipal Tiago Marques de Melo, testemunha exatamente esse processo, ao constatar que as próprias percepções sobre a escola mudaram. A relevância da educação se impôs. O ambiente foi ressignificado e os resultados já despontam

Tiago ingressou na rede pública no ano de início da pandemia. Ele cursava o 6º ano e passou por diversas adaptações: aulas remotas, distância, novos colegas e professores, e no avançar do processo, chegou ao retorno presencial às salas de aula. Foi tempo de construir novos laços e ressignificar o próprio percurso. 

Esta matéria integra a série “Terra de Sabidos", publicada pelo Diário do Nordeste com patrocínio da Assembleia Legislativa do Ceará e cujo foco é contar histórias de estudantes da rede pública estadual do Ceará  e da rede municipal de Fortaleza, que, via educação, tiveram as trajetórias alteradas, conquistado oportunidades, e reconhecimentos local, estadual e nacional.​ 

Escola de tempo integral

Na Escola Prisco Bezerra na qual a rotina, segundo ele, “é puxada”, já que o equipamento é uma das unidades de tempo integral na Capital, vieram experiências inéditas. O interesse, a motivação e o desempenho mudaram, conta. E nesse percurso, em 2022, no 8º ano, Tiago foi medalhista de ouro na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA). 

Foi a 1ª vez que ele, filho de professores da rede municipal (a mãe hoje é da gestão de uma escola e o pai é professor em outra), participou de olimpíadas escolares. O processo abriu portas, e Tiago relata querer mantê-las abertas. A expectativa é participar de outras tantas olimpíadas que forem possíveis nos 4 anos ainda que terá na educação básica. 

Tiago Marques de Melo
Foto: Fabiane de Paula

Na unidade, conta o  professor de ciência da Escola Prisco Bezerra, Pedro Henrique Aragão, além da OBA, os alunos participam da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), Olimpíada Brasileira de Física e da Olimpíada de Ciência Energética. 

“Na escola, a gente tenta fazer de forma bem generalizada (o estímulo, a participação nas olimpíadas), quando é na hora da inscrição, inscrevemos todos que podem participar. Porém, alguns procuram muito mais, procuram tirar muito mais dúvidas, se engajam muito mais, tem um maior interesse. Essa é uma forma que a gente vê de tentar sempre puxar, sempre acreditar nos nossos alunos e que eles podem querer”. 
Pedro Henrique Aragão
Professor

Na prova da OBA, Tiago achava que seria “bem difícil” e completa: “difícil foi, só que eu achava que seria mais”. Dentre as questões, explica, “tinham as de cálculos, raciocínio e  conhecimento próprio”.  

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Sobre o resultado, Tiago conta: “quem fica no grupo da escola é minha mãe. Eu estava deitado e minha mãe do outro lado da casa, e ela gritou e avisou que eu tirei medalha de ouro. Eu senti alegria e muita surpresa. Muito pelo fato da dificuldade que eu estava pensando que ia ser a prova”. 

A percepção de que o resultado “é surpreendente”, evidencia aspectos indesejáveis, mas comuns na trajetória de muitos estudantes, e mais ainda nos da rede pública: a desconfiança sobre a própria capacidade e conhecimento. 

“Quando saem os resultados são sempre uma surpresa muito grande para eles, porque a autoestima deles, às vezes, não é tão elevada. Acham que participar de uma olimpíada, ganhar medalha, é algo impossível”, reforça o professor de Ciência. 
 
Tiago completa que “a olimpíada é estimulante porque pode mostrar que você se destaca”, e acrescenta: “não tem o que perder fazendo uma olimpíada. Se você não tirar um lugar bom, você só não tirou um lugar bom. Mas se você tirar um lugar bom, você tem benefícios”.

Preferências e futuro

Nas preferências estão matemática e geografia. Sendo que o apreço à primeira tem um elemento a mais: Tiago relata ter tido muita dificuldade quando fazia o Fundamental I. Hoje, o caminho é menos tortuoso. 

Tiago Marques de Melo
Foto: Fabiane de Paula

“Acho essa escola bem melhor do que a que eu frequentava. Mas muito porque agora eu entendo o que eu estou fazendo. Do quinto ano para baixo, eu achava que escola era algo besta. Não tirava notas boas. Mas no sexto ano, teve a pandemia, e eu finalmente entendi o que é uma escola e isso fez eu me empenhar bem mais nos meus estudos”.
Tiago Marques de Melo
Estudante da escola pública

Nos planos há o desejo de ingressar no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). A motivação vem de casa, “gosto de pensar no meu irmão, como ele tá em uma faculdade, isso também me inspira um pouco”.

Os planos de futuro se aliam à esperança de ser alguém “bom”, segundo o próprio Tiago. Aos 11 anos, ele define que esse avanço precisa ser “socialmente e economicamente”. Estudar, diz ele:  “é uma das coisas mais importantes, é criar o seu futuro”. 

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