Dois submarinos destruídos desapareceram no litoral do CE com mais de 100 mortos há 80 anos

Assim como submarino que sumiu a caminho do Titanic, destroços podem estar no fundo do oceano

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Registro do avião Catalina, da Força Aérea dos Estados Unidos, do ataque ao U-507
Foto: Wrecksite

Há 80 anos, as atividades marinhas de dois submarinos produzidos na Alemanha tiveram fim ao norte da costa cearense, com apenas uma semana de diferença. Os Unterseeboots 507 e 164, ou simplesmente U-507 e U-164, foram atingidos e afundados por aviões americanos em embates durante a 2ª Guerra Mundial. Mais de 100 pessoas morreram.

Embora em condições diferentes, os casos lembram o desaparecimento do submarino Titan, desde o último domingo (18), que estava em expedição até o navio Titanic com cinco pessoas a bordo. A Guarda Costeira dos Estados Unidos informou nesta quinta (22) que foram encontrados destroços na área de buscas. 

Para conhecer a história dos dois submarinos afundados perto do Ceará, a reportagem consultou artigos e arquivos históricos de múltiplas fontes, como o Museu Virtual do Pecém, a Marinha do Brasil e o Comando de História e Patrimônio Naval dos Estados Unidos. 

"A informação que se tem é que eles continuam lá. Tem a posição do bombardeio, mas não temos a posição exata", explica o mergulhador Marcus Davis, pesquisador de naufrágios do Ceará, em conversa com o Diário do Nordeste. "Provavelmente, nunca foram retirados de lá".

O U-507, inclusive, foi responsável por levar o Brasil, até então um país neutro no conflito, a entrar na Guerra. O submarino promoveu uma série de ataques a navios brasileiros em 1942, em Sergipe e na Bahia, afundando seis deles e matando mais de 600 pessoas torpedeadas ou afogadas - incluindo mulheres e crianças.

Legenda: Localização dos bombardeios dos dois submarinos, segundo registros americanos e alemães
Foto: Elaborado pela reportagem/Google Maps

O Unterseeboot 507 pertencia à Marinha de Guerra Alemã (Kriegsmarine) e tinha longo alcance. Ele foi lançado em 1941 e, durante 15 meses, afundou 19 navios mercantes e danificou outro.

Nesse tempo, teve apenas um comandante: Harro Schacht (1907-1943), um “Korvettenkapitän” (capitão de corveta), condecorado com a Cruz de Ferro de 1ª classe, em 1942, e com a Cruz de Cavaleiro da Cruz de Ferro, em 9 de janeiro de 1943, quatro dias antes de falecer.

Construindo carreira na Marinha, Harro recebeu o comando do U-507 em outubro de 1941. Durante as patrulhas no Atlântico Sul, tinha como missão interceptar a navegação de países Aliados, grupo formado por Estados Unidos, Reino Unido, França e União Soviética. 

Legenda: Harro Schacht, comandante do U-507
Foto: Serviço de Documentação da Marinha

Com destino incerto, ele pediu autorização ao comando para operar livremente, recebendo resposta positiva horas depois.

Entre os dias 15 e 19 de agosto de 1942, Schacht afundou seis navios brasileiros: Aníbal Benévolo, Baependy, Araraquara, Arará, Itagiba e Jacira. Pressionado pela população em revolta, o Governo de Getúlio Vargas usou esses ataques como motivo para declarar guerra à Alemanha em 22 de agosto.

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Início da revanche

Porém, ele não estava sozinho nas águas nordestinas. O submarino U-164 foi responsável pela destruição do navio mercante sueco Brageland ao norte do Ceará, na madrugada do dia 1º de janeiro de 1943. No entanto, a tripulação foi previamente ordenada a deixar o navio; 28 pessoas saíram em botes salva-vidas e conseguiram chegar à cidade de Tutóia, no Maranhão.

Legenda: Navio Brageland, construído em 1937, foi afundado em alto-mar no primeiro dia de 1943
Foto: Museu Marítimo Nacional da Suécia

Em 3 de janeiro de 1943, foi a vez do U-507 entrar em ação derrubando o navio a vapor britânico Baron Dechmont, hoje conhecido como “Naufrágio do Pecém”, que repousa nas profundezas do mar.

Com a expansão da vigilância americana na costa do país, três dias depois, em 6 de janeiro, o U-164 foi atacado por bombas no litoral norte do Ceará e se tornou o primeiro dos 12 submersíveis do Eixo (grupo formado por Alemanha, Itália e Japão) a ser afundado no litoral brasileiro.

O ataque ocorreu pelo avião Catalina 83-P-2, sob o comando do tenente aviador William Render Ford, depois que o submarino foi avistado pelo engenheiro de voo Billy Goodell. Segundo o livro “Sighted Sub, Sank Same”, havia homens da tripulação no deck do submarino, aparentemente tomando banho e desavisados sobre o ataque iminente.

Dois desses homens correram para a escotilha, mas ela estava fechada. Com a explosão das quatro bombas, eles foram arremessados para o mar e se tornaram os únicos sobreviventes - depois, prisioneiros. O capitão de corveta Otto Fechner (1905-1943) e o restante tripulação, de cerca de 50 pessoas, faleceram na ocasião.

Fim do segundo carrasco

Apesar da perda do “colega”, o U-507 seguiu seu caminho e, no dia 8 de janeiro, afundou outro vapor britânico, o SS Yookwood, perto do Rio Grande do Norte. O capitão do navio e mais três pessoas foram levados como prisioneiros.

Cinco dias depois, o destacamento do tenente aviador Lloyd Ludwig, da Marinha Americana, que dava cobertura aérea a comboios aliados entre Natal e Belém, recebeu a informação de que um submarino estava seguindo um grupo no litoral norte do Ceará.

Então, na manhã de 13 de janeiro, os aviadores decolaram de Fortaleza em busca do U-507 a bordo de um avião Catalina PYB-10. Ao avistar a aeronave, o U-boot começou a submergir, mas os americanos soltaram quatro bombas chamadas de “cargas de profundidade”, levantando uma grande coluna d’água. 

Legenda: Registro precário do U-507
Foto: Serviço de Documentação da Marinha

Após o ataque, não foram vistos sobreviventes (havia 54 pessoas a bordo) ou destroços, levantando suspeitas sobre a eficiência do ataque. No entanto, o U-507 nunca reapareceu.

“Foi torpedeado e nunca encontrado, embora existam boatos que pode estar próximo à costa”, acredita o mergulhador e pesquisador Augusto César Bastos. “É provável que esteja em lugar bem profundo”.

Schacht e toda a tripulação do U-507 foram mortos no Atlântico Sul, incluindo os quatro prisioneiros britânicos. O capitão alemão recebeu uma promoção póstuma a Fregattenkapitän (capitão de fragata), em 1º de janeiro de 1944. 

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