Da perda de plantações ao aumento do calor: como o CE pode ser afetado por mudanças climáticas
Pesquisadores analisam como os possíveis impactos da elevação da temperatura podem prejudicar a vida no Estado
Pense num Ceará de secas prolongadas, solo pobre para plantações e com dias mais quentes. O retrato de prejuízos para a vida no Estado – que pode estar concretizado em 60 anos – aparece como alerta de pesquisadores para conter as mudanças climáticas, que são aceleradas pela emissão de gases poluentes.
Isso pode ocasionar a perda de algumas plantas nativas, que são importantes para proteger o solo e determinantes para boas plantações. Além disso, as espécies também são relevantes para as nascentes de rios. Alguns locais, inclusive, podem ser mais afetados.
A realidade cearense apresenta 3 núcleos de desertificação que compreendem Irauçuba/Centro Norte, a região do Inhamuns e o Médio Jaguaribe, como mostra o monitoramento da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme). São localidades que já sofrem com a seca e podem ter essa degradação ampliada.
Os detalhes sobre as mudanças climáticas compõem um estudo com espécies vegetais da caatinga para avaliar os impactos disso no semiárido, que foi elaborado como mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Ceará (UFC).
O aumento da temperatura, a redução das chuvas e a perda da vegetação são alguns dos elementos avaliados. E isso pode acontecer devido ao aumento de um efeito natural, mas que ao invés de ser visto após centenas de anos, aparece em algumas décadas.
"Os impactos na perda de riqueza de espécies nativas, mesmo num cenário intermediário, está num nível elevadíssimo. Isso acarreta profundos impactos sociais e no clima da região", reflete o pesquisador Lucas Peixoto Teixeira.
Mudanças climáticas na caatinga
- Aumento médio da temperatura entre 2,9ºC e 4,5ºC
- Redução entre 50 mm e 70 mm da média mensal da quantidade de chuva no trimestre mais úmido
- Redução do aporte hídrico pelas chuvas
- Prolongação do período de seca
- Maior frequência de eventos extremos (muita chuva em poucos dias)
- Perda de espécies de plantas
Lucas, também atuante no Programa Cientista Chefe Meio Ambiente da Secretaria de Meio Ambiente do Ceará (Sema), avaliou como a perda da vegetação nativa – que não consegue se adaptar ao rápido aumento da temperatura – pode impactar o Estado.
O Ceará tem todo o seu território inserido na Caatinga e os resultados refletem diretamente para o Estado. O diagnóstico é que a gente pode ter, tanto no cenário intermediário quanto no mais pessimista, uma perda de riqueza muito profunda da flora nativa
Em outros estudos, a equipe da UFC avaliou que a espécie Holoregmia viscida, conhecida como fruto-de-são-cipriano e saco-de-carneiro, pode ser extinta em menos de um século devido às mudanças climáticas.
"A vegetação da Caatinga protege o solo contra as intempéries, como chuvas, exposição ao Sol por boa parte do ano”, explica Lucas sobre as consequências da perda de biodiversidade.
Esse é um exemplo dos serviços ecossistêmicos que podem ser perdidos, como acrescenta Marcelo Freire Moro, professor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar), onde está o curso de Ciências Ambientais da UFC.
“Mantém as nascentes e os rios saudáveis, protege o solo, serve para a manutenção de fauna, alimentação do gado e polinização. Perder a biodiversidade ameaça a própria condição de sobrevivência da humanidade em qualquer lugar”, resume o especialista.
Se os cenários mais negativos de mudanças climáticas se concretizarem, se a humanidade não reduzir as emissões de gás carbônico, nós vamos ter um ambiente mais difícil para a subsistência da população cearense com menos chuvas, mais secas e redução de plantas na caatinga
Isso também pode afetar as regiões de altitude, como a Serra de Baturité que abastece Fortaleza e a Região Metropolitana. Com menos chuvas, esses espaços podem reduzir a disponibilidade de água e impactar diretamente o cotidiano da população.
Em relação à temperatura, só para ter uma dimensão, a temperatura média no Ceará foi de 27,2ºC entre novembro e dezembro do último ano, conforme os registros da Funceme, consultados pelo pesquisador. Num cenário mais pessimista, esse índice poderia ser acima de 31ºC.
O que pode ser feito?
Os gases associados ao efeito estufa são emitidos no Ceará, principalmente, pelo transporte, geração de eletricidade, funcionamento da indústria, agropecuária e desmatamento.
Mesmo sendo uma questão global, medidas mitigadoras locais são relevantes para evitar que o cenário mais pessimista se torne realidade nas próximas décadas.
"Fazer inventários da flora e aplicar ações que reduzam o aumento dos gases de efeito estufa e a perda da biodiversidade pelo desmatamento e queimadas. Isso precisa ser feito urgentemente", propõe Lucas Peixoto.
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Outras pesquisas científicas se desdobram para entender como esse aumento da temperatura repercute no mar cearense. O efeito pode ocasionar até a extinção de algumas espécies como corais.
Nos últimos 50 anos houve aumento de 1ºC na temperatura do mar no Estado, mas apesar de parecer pouco, o dado é preocupante à medida que representa um crescimento de 25% em relação à média de 4ºC.
Os corais, que exercem uma função biológica de filtragem e alimento para animais marinhos, sofrem com esse aumento do calor e estão sob forte ameaça de extinção.