Candidatos denunciam fraudes à cota para negros em seleção de residência médica no CE

Organização alerta que a constatação de falsidade na declaração pode levar à anulação de matrículas

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Participantes interessados deveriam gravar vídeos reconhecendo autodeclaração e detalhando por que se consideram pretos ou pardos
Foto: Freepik

Candidatos à residência médica do Ceará denunciam fraudes nas inscrições nas cotas para negros no processo seletivo 2024, conduzido pelo Apoio às Residências em Saúde (Ares), vinculado à Universidade Federal do Ceará (UFC). A organização do certame, porém, relata que não identificou inconsistências na publicação da lista de classificados nesse grupo.

Participantes do processo que preferiram não se identificar enviaram à redação fotos de candidatas com inscrições deferidas nas cotas, mas que, na leitura dessas pessoas, seriam identificadas como brancas.

Em comunicado postado no portal da seleção um dia após questionamento da reportagem do Diário do Nordeste, a coordenação geral do processo confirmou que “foram realizadas algumas manifestações administrativas, as quais apontam que alguns participantes não teriam direito a tal benesse, uma vez que seriam brancos”.

No entanto, no mesmo documento, afirma que a banca analisou as características fenotípicas dos participantes pelas fotos e vídeos enviados, sem contato presencial com eles, “sendo publicada uma lista com os nomes dos participantes que realizaram os procedimentos acima e que foram considerados negros (assim compreendidos entre pretos e pardos)”.

O anexo V do edital da seleção solicitava não só que o candidato gravasse um vídeo de autodeclaração como pardo ou preto, mas também explicasse que características pessoais apresentava para se configurar nesse grupo populacional. A instrução era clara: o candidato “deverá dizer a frase: eu, “dizer o nome”, me auto declaro, “dizer a opção”, porque “relatar a justificativa”.

Conforme o documento:

  • “Pardo” se refere a quem se declara pardo e possui miscigenação de raças com predomínio de traços negros; 
  • “Preto” é quem que se declara preto e possui características físicas que indicam ascendência predominantemente africana.

O comunicado sugeriu aos participantes que não são negros (pretos ou pardos) a possibilidade de desistir do pedido de cota antes da divulgação do resultado preliminar da 2ª etapa, de análise curricular. Conforme o calendário de atividades, isso está previsto para 4 de janeiro, ou seja, os desistentes têm até 2 de janeiro para a manifestação. 

Alertou ainda que, “caso constatada a falsidade da declaração, o participante será imediatamente excluído da seleção e, se houver sido matriculado, ficará sujeito à anulação de sua matrícula após o procedimento administrativo em que lhe seja assegurado o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis”.

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Erro de análise?

O Diário do Nordeste questionou novamente à coordenação da seleção se qualquer problema nas autodeclarações não deveria ter sido informado aos candidatos antes da divulgação da lista de deferimento de inscrições aceitas, ou identificado antes das manifestações administrativas.

Em resposta, a coordenação garantiu que “não há qualquer inconsistência no comunicado” e que o documento “não quer dizer que a análise da banca seja equivocada”. Segundo ela, “a banca analisou a referida ação afirmativa a partir dos critérios objetivos determinados”.

A nota reforça que, “caso seja comprovada a má-fé de algum participante, será cominada a consequência do edital (exclusão do certame), sem prejuízo das demais ações que as leis impõem”.

Conforme o edital deste ano, participantes negros têm direito de concorrer a 20% do total de vagas reservadas, de acordo com o quadro de distribuição de vagas, igual ou superior a três, por especialidade/instituição.

O que é residência médica?

A residência é o período em que o médico tem a oportunidade de, sob supervisão, combinar a aquisição de conhecimentos teóricos com a experiência clínica e obter o aperfeiçoamento da competência profissional adquirida na graduação, desenvolvendo competências importantes para a atividade médica.

O processo de seleção para ingresso no Programa de Residência Médica não tem caráter de concurso público, mas de uma modalidade de ensino de pós-graduação, oferecida a médicos sob a forma de cursos de especialização, caracterizado por treinamento em serviço.

Desde 2011, a Seleção Unificada para Residência Médica no Estado do Ceará (Surce) realiza um exame de admissão em hospitais universitários federais, da rede estadual do Ceará e da rede municipal de Fortaleza, bem como de algumas instituições filantrópicas. 

Em 2016, a Surce evoluiu com a criação do Ares, que tem por objeto ser o apoio gerencial para a implementação/execução dos Programas de Residência Médica nas instituições participantes.

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