Ambulantes de Guaramiranga dizem estar há 3 meses esperando alvará da Prefeitura

Trabalhadores afirmam que pediram autorização para trabalhar em setembro, mas não tiveram resposta.

Imagem mostra praça principal da cidade de Guaramiranga, no Ceará, área aberta com árvores e mobiliário urbano.
Legenda: Praça Rachel de Queiroz é uma das mais movimentadas da cidade serrana do Ceará.
Foto: Reprodução/Google Maps.

Vendedores ambulantes de Guaramiranga, no Maciço de Baturité, região serrana do Ceará, têm vivido um impasse junto à Prefeitura da cidade. Eles afirmam ter solicitado permissão para atuar nos espaços públicos há cerca de três meses, mas ainda não receberam resposta.

O imbróglio veio a público na última sexta-feira (5), quando uma ação de ordenamento realizada no município terminou em conflito entre comerciantes e a Guarda Municipal de Guaramiranga. O órgão recolheu mercadorias e removeu os ambulantes da Praça Rachel de Queiroz, a principal do município.

Um deles foi o vendedor Isa Vasconcelos, que comercializa produtos artesanais no local há 7 meses. Um vídeo que circulou nas redes sociais mostra o momento em que policiais militares o abordaram para que saísse. Isa trabalha circulando com um cesto nas mãos, sem espaço fixo na praça. 

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O vendedor declara que deu entrada no pedido de permissão ainda em setembro, observando que “a única data-prazo do edital era para as inscrições, sem data de conclusão da análise por parte da Prefeitura”.

“Conversei com todos os colegas ambulantes da cidade; todos fizeram o cadastro no prazo, mas ninguém recebeu comprovante da inscrição feita. Todos deixaram os contatos com a Prefeitura, que nunca concluiu a análise da documentação nem deu resposta”, pontua.

Isa afirma que voltou à Prefeitura “um mês depois do encerramento das inscrições”, mas continuou sem respostas se o cadastramento havia sido aprovado ou não. “E eles não deram a orientação de esperar. Se no momento da entrega dos documentos nos fosse dito que não poderia trabalhar até a entrega da autorização, eu não teria ido”, frisa.

Decreto de remoção

No dia 5 de dezembro, quando ocorreu a remoção dos ambulantes na praça principal de Guaramiranga, foi publicado pelo Município o Decreto 41/2025, que “regulamenta a ocupação e o uso do espaço público da Praça do Teatro Rachel de Queiroz, localizada na Rua Joaquim Alves Nogueira, Centro”.

O decreto delimita as áreas de livre circulação, as destinadas a estabelecimentos comerciais e as reservadas aos ambulantes. Segundo Isa, “o decreto não foi enviado para nenhum ambulante nem divulgado em nenhuma página da prefeitura”.

No site oficial, porém, a descrição inicial do decreto indica que se trata de documento de qualificação de organizações sociais na área da saúde, e não algo relacionado aos ambulantes:

Captura de tela do site oficial da Prefeitura de Guaramiranga, exibindo os detalhes do Decreto Municipal 041/2025, que trata da qualificação de organizações sociais na área da saúde, juntamente com uma pesquisa de satisfação do usuário.
Legenda: Título do decreto no site municipal, relacionado à saúde, não condiz com o teor sobre reordenamento de praça.
Foto: Reprodução.
 

“Na noite de sábado, fui trabalhar. Tenso, com medo, mas fui. E outros colegas ambulantes também foram. Tentaram impedi-los de entrar na praça, mas não funcionou. Não sabemos o que virá”, complementa Isa.

'Vamos esperar até quando?'

A falta de autorização para montar o estande onde vende livros em Guaramiranga há um ano tem “tirado o sono” da comerciante Vera Maia. Ela é dona de uma loja com sede em Pacoti, cidade vizinha, mas leva o projeto “Livraria na Praça” por várias cidades, “para dar mais acesso à leitura”.

Vera afirma que procurou a atual gestão da Prefeitura ainda no início do ano, para apresentar o projeto itinerante e obter autorização para montar o estande em espaço público. “Disseram que estava tudo certo, que eu poderia trabalhar normal”, conta.

Em agosto, contudo, quando a Prefeitura de Guaramiranga lançou o edital de cadastro para ambulantes, ela levou “todos os meus documentos, dei entrada, assinei, fiquei aguardando. Nenhuma resposta”, afirma.

Mas na semana passada, a Prefeitura delimitou um espaço de 3m por 3m pra eu trabalhar. Ficamos assim por duas semanas. Na sexta, dia 5, a fiscal informou que eu tinha que tirar tudo da rua. Fui à Prefeitura, procurei todos. Ninguém ajudou.
Vera Maria
Vendedora

A comerciante afirma que nunca obteve aval escrito para montar o estande, somente verbal, mas que entendeu a delimitação do espaço como uma permissão. “Isso não podia ser feito de forma arbitrária. Fiz uma compra de mercadoria pra atender ao público na alta estação, e como vou pagar? O que eu vou fazer com toda essa mercadoria?”, preocupa-se.

O cenário de desinformação também é compartilhado pela artesã Monara Uchôa. Ela lembra que, antes de setembro, a Secretaria de Turismo já havia solicitado o preenchimento de um questionário para cadastrar os ambulantes, em fevereiro. À época, a gestão teria garantido que “tudo continuaria do jeito que estava”. Os vendedores até receberam crachás.

Por isso, os cerca de 40 ambulantes, contabiliza Monara, se surpreenderam com a ação de ordenamento. “Desde setembro, não tivemos nada de retorno. Não disseram nada, não fizeram reunião, mas as pessoas continuaram expondo”, alega.

Hoje, ela relata que muitos trabalham com medo de terem as mercadorias - fonte de sustento das famílias - apreendidas pelo poder público. “Querem aparentar uma cidade linda, mas é uma situação muito delicada. Nossa história foi desvalorizada, desrespeitada e violentada. Esse segmento é nossa principal fonte de renda e estamos receosos de como vai ser”, indigna-se.

O que diz a Prefeitura de Guaramiranga

Após o episódio de conflito entre ambulantes e guardas, a gestão municipal reforçou, em nota, que “a proibição da permanência de vendedores ambulantes sem autorização baseia-se na Lei Municipal nº 105/2005”. 

“O comércio ambulante só pode ser exercido mediante licença especial, contendo dados obrigatórios do comerciante. A falta dessa licença implica apreensão de mercadorias, aplicação de sanções e vedação ao exercício da atividade fora dos locais permitidos, sobretudo quando houver risco de obstrução do trânsito”, complementa.

Conforme a gestão, “muitos interessados não procuraram a Prefeitura no período indicado” no edital de cadastramento, e “os que insistiram em atuar sem licença o fizeram em desacordo com a lei, assumindo o risco das medidas administrativas”, que são:

  • Multa;
  • Apreensão de mercadorias;
  • Interdição da atividade;
  • Cassação da licença de funcionamento.

O Diário do Nordeste questionou à Prefeitura de Guaramiranga, desde a última terça-feira (9):

  • Quantos ambulantes se cadastraram no edital lançado? 
  • Quantos tiveram aprovação e quantos foram recusados? 
  • Em que espaços é permitido que eles atuem? 
  • Por que tem havido essa remoção dos ambulantes dos espaços que ocupam? 
  • Como esse impasse em relação a ambulantes que trabalham há anos nos mesmos locais será resolvido? 

A assessoria de comunicação afirmou que buscaria uma resposta, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem. O espaço segue aberto para futuras manifestações do Município.

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