Super Silva, o Homem-Aranha cearense, roda o mundo com o circo e impressiona com ousadia no trapézio

Nascido e criado no picadeiro, João Weliton da Silva dedica-se à arte circense desde os 10 anos de idade; aos 50, coleciona experiências do Brasil à China

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: O número “Passeio aéreo”, feito e criado por Super Silva; quem viu, assegura: trata-se de uma das façanhas mais inacreditáveis de presenciar a olho nu
Foto: Ismael Soares

Fortaleza, Ceará, década de 1980. João Weliton da Silva aprendia números circenses e já traçava o futuro. Mirrado, aos 10 anos fez a primeira apresentação no circo do padrinho e não parou mais. Pegou gosto e jeito. Hoje, aos 50, comemora o fato de ter se tornado o Super Silva, verdadeiro Homem-Aranha cearense. “Amo o que faço”, diz.

É preciso mesmo muito amor para literalmente voar de um lado para o outro a 15 metros de altura. Ou andar de cabeça para baixo com toda a ginga e destreza. Tudo sem proteção, munido apenas de coragem, talento e técnica, evoluída no correr das décadas. Ofício desafiador, o artista confessa. Mas não menos fascinante.

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Detalhes dessa apresentação capaz de impressionar plateias do mundo inteiro podem ser conferidas no Circo Americano durante temporada em Fortaleza. Super Silva rompe o picadeiro na metade do espetáculo e comprova por que é um dos grandes nomes do trapézio, dentro e fora do Brasil. Cria da Messejana, circula o planeta sob a lona.

“Pra quem gosta de adrenalina, é um prato cheio. A diferença do meu trapézio para os demais é que, além de ser nas alturas, depende muito da estabilidade do corpo. Além disso, nos mais comuns, o trapezista pode errar a posição e cair na rede – ou seja, não vai se machucar ou vai se machucar pouco. No meu caso, se eu errar a posição e me largar lá de cima, só Deus”.

Legenda: Não à tona Weliton Silva é chamado de "Homem-Aranha cearense"
Foto: Ismael Soares

Essa vocação para ousar tem história. Weliton é filho de pais circenses – o pai era palhaço trapezista, a mãe bailarina e cantora. Criado em ritmo de itinerância, logo se acostumou a ver os parentes animando gente e provendo sustento por meio de um trabalho mágico. O circo da família, escola e caminho, projetou sonhos maiores.

O menino se interessou em aperfeiçoar o saber e pouco a pouco galgou importantes palcos. Antes de ser contratado pelo Circo Americano, integrou a trupe de empresas tão grandes quanto, percorrendo Europa, Ásia, Estados Unidos e vários Estados brasileiros. “Já fiz muita coisa nessa vida e percebi que meu negócio é o ar. Estando no ar, tô legal”.

O número que realiza com tanta pompa, descrito no começo deste texto, chama-se “Passeio aéreo”. Quem viu, assegura: trata-se de uma das façanhas mais inacreditáveis de presenciar a olho nu. Feito o famoso herói dos quadrinhos, Weliton utiliza o próprio corpo para se projetar e fazer piruetas, graças, gestos que emudecem o cidadão mais incrédulo. É real e surreal.

Rotina intensa

É também o motivo pelo qual não dispensa cuidados. O cotidiano é frenético: todos os dias o cearense acorda cedo para tomar café e se dedicar à academia durante uma hora e meia. Na sequência, faz um lanche mais reforçado e parte para o treino. Não almoça. A alimentação mais densa é feita após o espetáculo, deixando o corpo bem leve para o número.

“Durante o trabalho, já sofri duas quedas. Passei anos parado. Isso dificulta um pouco o ofício, mas tendo fé na vida e em Deus, vamos seguindo. Todos temos altos e baixos, e com circo não é diferente”. O legado que a profissão lhe proporciona certamente é ponto alto. Ao rodopiar livre pelo ar, Weliton já conquistou imóveis, carros, um sítio e algo a mais.

A possibilidade de ver a própria família seguir os passos dele representa um marco. Maestria passada de geração em geração: os filhos, Webert, 33, e Wediton, 32, também são reconhecidos internacionalmente pelo talento. A companheira, Janete, vai no mesmo rastro, outra cria do circo desde pequena. 

Legenda: Weliton não pensa em parar tão cedo; observa que, com a idade, o que poderia se tornar difícil, ganha textura ainda mais viva
Foto: Ismael Soares

Quando encara os netos – dois meninos e duas meninas serelepes – Super Silva se enche de emoção ao pensar que também eles podem trilhar esse caminho. Quem sabe serão os próximos Super? A alcunha foi atribuída a ele por um diretor do Ringling Bros. and Barnum and Bailey Circus, um dos mais tradicionais do mundo, fechado em 2017.

“Foi por volta de 2003, nos Estados Unidos. Quando ele veio com essa proposta do novo nome, achei estranho. Disse: ‘Rapaz, acho que não vai dar certo, não’. Mas não é que pegou? Hoje as pessoas me chamam de Silva, Super Silva, Welinton, Aranha”.

Próximos passos

Essa fama em várias frentes talvez justifique a vontade de permanecer. Weliton não pensa em parar tão cedo. Observa que, com a idade, o que poderia se tornar difícil, ganha textura ainda mais viva. “Me sinto muito satisfeito em motivar outras pessoas que, por causa de mim, aprendem o número que faço – gente na Europa, na Ásia, no mundo todo”, vibra.

“Parece que, quanto mais a idade passa, mais a gente vai melhorando, tendo mais garra. Quando se é novo, sobe no aparelho como se fosse nada, faz de qualquer jeito. Com os anos, vai pegando experiência, tendo mais consciência do fazer”.

Legenda: Super Silva ainda quer abrir o próprio negócio, o Super Circo, e ver cada vez mais pessoas encantadas com essa arte
Foto: Ismael Soares

Circulando pelos continentes com tudo pago pelas empresas, mas sempre retornando com carinho a Fortaleza – lugar de morada e reinício – Weliton quer ir além. Abrir o próprio circo, o Super Circo, é um deles. Aguarda apenas um dos filhos chegar da Europa para montar tudo. Está animado, uma vez guardar verdade bonita no peito.

“Enquanto tiver criança e gente apaixonada por esse divertimento, o circo não vai acabar. Ele é e será pra sempre uma das atividades mais fantásticas feitas ao vivo. É diferente de um filme, de uma novela, nos quais as pessoas repetem, consertam e tal. O circo é adrenalina, na hora. Ver o trapezista, o palhaço, o globo da morte, o homem-bala saindo de um canhão voando… Isso emociona as pessoas. E, pra mim, nunca vai mudar”.

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