Márcio Benjamin prova que existe um jeito nordestino de contar histórias de terror

O potiguar participou de diálogo durante a Mostra Sesc de Culturas Sertão Central apresentando seu novo livro, “Agouro", e tecendo comentários sobre a literatura contemporânea de horror

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@diariodonordeste.com.br
Legenda: Escritor potiguar Márcio Benjamin Costa supera os clichês do terror
Foto: FOTO: DAVI PINHEIRO

Esqueça os clichês das tramas de terror. No lugar deles, temáticas como a fome que assolou a população cearense no começo do século XX; os mistérios da narrativa envolvendo a Pedra do Reino, em Pernambuco; e uma vasta quantidade de histórias contadas ao pé do ouvido, passadas de geração em geração. Esses são os verdadeiros ingredientes que integram a fértil imaginação do escritor potiguar Márcio Benjamin Costa.

O autor participou de um diálogo neste sábado (27), na Casa de Saberes Cego Aderaldo, sobre o livro “Agouro”, sua nova aposta no segmento literário, em que desenvolve enredos de terror baseados em fatos brasileiros reais – que, por si só, já são bastante assustadores. O momento rendeu acaloradas partilhas sobre o que cada um guarda em si de mais obscuro.

“A minha avó foi uma grande contadora de causos, histórias de assombração, e isso me levou a escrever narrativas a partir dessa perspectiva. O terror sempre esteve na minha vida, só que eu não sabia que se chamava assim. Do mesmo jeito foi com o folclore e a cultura nordestina”, explica Márcio.

Reunidos, esses componentes tornaram-se matéria-prima para a mais recente obra sob sua assinatura, desenvolvida durante cerca de três anos e ainda em fase de finalização, prestes a ser lançada – com prefácio de Bráulio Tavares, texto de orelha de Cesar Bravo e ilustrações do quadrinista paraibano Chico Shiko.

A motivação para desenvolvê-la, além de injetar maior fôlego sobre o assunto, foi potencializar a valorização da oralidade, preocupação observada em todo o caminhar profissional do artista e advogado.

Cenários

Não é de hoje que Márcio atravessa cenários horripilantes nas tramas que deseja contar. “Maldito sertão” (2016) e “Fome” (2017) também são de autoria do escritor e justificam o porquê de ele ser um dos nomes mais interessantes e badalados quanto ao modo de conciliar o pop e o tradicional na literatura.

“Maldito Sertão”, por exemplo, ambienta narrativas de suspense e terror em pleno Nordeste brasileiro, resgatando, do baú das mais tenebrosas memórias da infância, criaturas capazes de congelar a espinha. 

Por sua vez, no romance “Fome”, definido como um “apocalipse zumbi no sertão”, Márcio recorre aos mortos vivos e os situa numa pequena cidade do interior que está passando por uma cruel e prolongada seca. 

Indagado sobre quais os desafios de conferir novas perspectivas sobre um gênero já tão maciçamente trabalhado, o autor é enfático: “Ironicamente, é possível, sim, escrever novas histórias de terror focando no clássico. Causos podem ser renovados e as pessoas geralmente se interessam em lê-los, tendo em vista que a memória afetiva do sertão ainda é muito forte”.

Prova disso é que, em seu ofício de advogado – atuando especificamente com Previdência Social – o profissional já escutou diversas histórias de agricultores, pescadores, entre outros tipos do sertão, atestando o caráter múltiplo que esses relatos possuem.

Amplitudes

Mediador do papo literário com Márcio Benjamin na Casa de Saberes Cego Aderaldo, o escritor de Quixeramobim, Bruno Paulino – que também já escreveu um livro focando no horror sertanejo, “Pequenos assombros” – destaca que o acabamento linguístico dos livros do potiguar aliado às inovações que ele traz em linhas e entrelinhas o permitem ser uma referência na área. 

“São narrativas que herdam a pegada do cinema, com muita agilidade e de tirar o fôlego, e que fogem dos estereótipos do sertão antigo, dessa coisa do causo. Ele tem isso como ponto de partida, mas vai além”, sublinha. 

Para ele, amedrontar pelo narrar nunca haverá de cessar porque o gênero tem como matéria-prima o medo, sentimento que pode ser ressignificado a partir das vivências de cada pessoa e época. “No futuro, a humanidade vai continuar sentindo essa angústia, tendo em vista que é algo universal. Nossa proposta é que, a partir do aprumo da linguagem, possamos aproximar novas histórias dos leitores”.

No momento, Márcio Benjamin está escrevendo o spin-off de “Fome”, “A Procissão”, imergindo a audiência ainda mais no tenebroso do mundo. É esperar para conferir.

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