O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura comemora, neste fim de semana, 25 anos de existência. Como o tempo passa! O lugar tem a mesma idade que tenho de carreira e lembro muito bem de como começamos e de como nossos caminhos se encontraram. Senta que lá vem história!
Há 25 anos, eu estava na inauguração do Dragão, era um dos artistas que faziam performances pelas ruas do entorno e pela praça, interagindo com o público, celebrando aquele marco para a história de Fortaleza. Toda aquela construção branca e vermelha fazia brotar também uma imensa expectativa de viver esse espaço e de concretizar a promessa de uma revolução na cidade.
Com o passar dos anos, vi muita arte acontecer por ali, inclusive a minha. Perdi as contas de quantas vezes me apresentei naquele teatro, de quantas vezes Gisele Almodóvar deu o ar da graça naquele palco. Modéstia a parte, eu tinha um orgulho imenso quando via a fila enorme que atravessava o palco do planetário para ver os espetáculos do coletivo As Travestidas. O Dragão escreveu muito da nossa história e nós também contamos a dele.
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Lembro de uma vez que fizemos uma edição do Festival das Travestidas - uma mostra que reunia as obras do repertório em uma semana de programação. No último dia, saímos todas montadas pela praça, indo ao encontro de um trenzinho a la “Carreta Furacão”. Paramos as ruas do Dragão do Mar. Ao invés de Homem Aranha, Fofão e Mickey, eram as drags e travestis que faziam a bagunça, uma loucura.
Lá, assisti filmes incríveis e me vi nas telas das salas de cinema também. Olha nossos caminhos se encontrando de novo. Só no Dragão eu encontrava uma curadoria de filmes que não se via em cinemas de shoppings pela cidade e com um preço bem mais acessível. Acho que isso foi preservado.
Vivi tardes e mais tardes, entre compromissos de trabalho e experiências de vida, a doçura de passear por aquele lugar, de atravessar as pontes vermelhas, a parede “infinita”, ver exposições, tomar um café ou ficar para uma cerveja nos bares por ali, como o Bixiga. Tempo bom!
Entre gestões e mais gestões, algumas mais comprometidas com a classe artística, outras completamente alheias, vi e vivi o Dragão passar por muitas fases. Sempre fui um artista, de certa forma, combativo sobre as injustiças com a classe, então entre os altos e baixos, fiz também os meus barracos, cobrando cachês atrasados e o que nos era de direito.
Talvez por ter aproveitado a época de ouro em termos de efervescência daquele lugar (e não me refiro só ao centro cultural), hoje lamento muito o abandono e a transformação de tudo ao redor virar algo sem vida, escuro, perigoso, vazio e muito distante da cultura vanguardista. Sempre que passo por lá, é como visitar um velho amigo. Nem sempre o encontro é amistoso, muitas vezes vou embora entristecido, saudoso, mas ainda é como chegar em casa.
E se tem uma coisa que nada me apaga é a crença no amanhã. Quando olho hoje, com os olhos de espectador até mais do que de artista, porque há muito não me apresento por lá, vejo que aos poucos se está construindo um Dragão diferente, que busca integrar centro cultural, casas, bares, pessoas, escola, rua. Em passos pequenos, claro, porque a máquina que gere e atrasa tudo é muito maior, mas com figuras com força de vontade e desejo de mudança.
Para a nova era do Dragão, desejo sorte, mudanças efetivas, sessões de teatro e cinema lotadas, praça cheia, vida, vida, vida e arte. Que o novo Dragão do Mar que se inicia a partir de agora seja mesmo revolucionário.
Estarei lá no cantar de mais um parabéns pra você.
*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor