Quais os impactos políticos da obra da transposição para a campanha de Bolsonaro
Presidente visitou Pernambuco e Ceará, nesta terça-feira (8), para acompanhar obras da Transposição
De vaia cearense à “jeguiata”, as visitas de Jair Bolsonaro (PL) ao Nordeste são repletas de acenos para tentar atrair o eleitorado da região. No entanto, é na Transposição do Rio São Francisco que o presidente tenta colar sua imagem, com eventos constantes em estados da região, trazendo para si os ganhos políticos de quem concluiu a obra iniciada ainda no Governo Lula (PT).
"O que foi desviado da Petrobras daria para fazer 50 transposições, então olha o atraso que o Brasil experimentou com quem ocupou a Presidência, que tinha compromisso apenas com o próprio bolso e com o poder", disse o mandatário em Jati, no Cariri, nesta terça-feira (8). O presidente esteve no município para liberar as águas da Transposição no Cinturão das Águas do Ceará.
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Ele ainda esteve em Salgueiro, Pernambuco, no outro trecho da obra. Só no Ceará, o presidente já esteve três vezes, desde que tomou posse, para participar de eventos envolvendo projetos hídricos para a região. No caso da Transposição, ele cumpriu agenda em 2020, em Penaforte, para acompanhar a chegada das águas ao Ceará.
"Vamos dizer a verdade, a obra (da Transposição) não funcionava porque não teve a prioridade devida nos governos anteriores. Estamos, hoje, resgatando uma dívida histórica (...) O presidente Bolsonaro nos orientou que não deixássemos nenhuma obra paralisada, que levássemos o Nordeste no coração e abraçassemos quem mais precisa", ressaltou, em Jati, o ministro Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional.
Na quarta-feira (9), Bolsonaro cumpre agenda no Rio Grande do Norte, na chegada das águas do rio São Francisco ao estado, em Jardim de Piranhas, último trecho da obra.
Entre grupos bolsonaristas, há a expectativa de que Bolsonaro promova uma "jeguiata" durante a visita, um passeio sobre jegues com aliados. É do Rio Grande do Norte o principal articulador das obras da transposição no Governo, o ministro Rogério Marinho, cotado como pré-candidato ao Senado pelo RN.
Em busca de eleitores
Conforme o cientista político Josênio Parente, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), a oito meses das eleições, o atual presidente precisa correr contra o tempo para reverter a rejeição entre os nordestinos e, segundo ele, a transposição pode ser um atalho para isso. De acordo com pesquisa divulgada pelo Instituto Datafolha em 14 de dezembro do ano passado, a rejeição a Bolsonaro na região atinge 67%, acima da média nacional de 60%.
“Ele precisa ganhar essa simpatia do nordestino, mas é o ponto mais desafiador para ele por conta da alta rejeição. Ele vai precisar se prender à transposição, que tem um impacto maior sobre a população, e, para isso, vai trazer a imagem de que Ciro e Lula fizeram, mas não terminaram”, aponta o professor.
A cientista política e professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, Monalisa Torres, acrescenta ainda o peso eleitoral da região. “O Nordeste é o segundo maior colégio eleitoral do Brasil, atrás apenas do Sudeste, aqui tem muito voto e Bolsonaro sabe que precisa penetrar no Nordeste. Para isso, uma parte da estratégia dele é conquistar a simpatia do povo com essas obras”, afirma.
“Principalmente do eleitorado do Interior, daquelas famílias que, de alguma forma, se beneficiam desses grandes projetos, porque são obras também de grande impacto político, econômico e social, então claro que isso gera uma disputa por quem vai levar o bônus”, acrescenta.
Obra histórica
Iniciada no segundo mandato de Lula, a obra da transposição atravessou os governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), seguindo na gestão Bolsonaro. O emedebista, em 2017, inaugurou o começo do Eixo Leste.
Já em 2020, Bolsonaro deu início ao funcionamento de uma parte do Eixo Norte. Quando o atual presidente assumiu, a execução física já estava acima de 90%. A possibilidade de canalizar as águas do São Francisco foi pensada ainda no Império, mas o projeto atualmente executado é diferente do pensado à época.
“Sem dúvidas, atrelar à própria imagem a essas obras de combate à estiagem ainda gera apelo no eleitorado, mesmo com a questão da seca minimizada atualmente em todo o Nordeste. No Sertão, é uma questão que ainda pesa, porque é uma área onde a agricultura é forte e depende de fatores naturais, por não adotar processos tão modernos”, afirma Josênio Parente.
Ao mesmo tempo em que se apresenta como o responsável por concluir a obra, Bolsonaro reforça críticas aos antigos gestores do projeto. Em Jati, as críticas foram direcionadas ao ex-presidente Lula. No Ceará, a “paternidade” da transposição também é disputada por outro político que almeja ocupar a Presidência da República: Ciro Gomes (PDT). O pedetista foi ministro da Integração Nacional durante a idealização do projeto.
Segundo Monalisa Torres, os três políticos tem um perfil semelhante de “personificar políticas públicas”, o que irá provocar uma queda de braço na campanha eleitoral deste ano.
“Os três disputam esse lugar de alguém que realiza, que vai lá, resolve e tenta incorporar na sua própria imagem a realização dessas grandes obras. Então, é óbvio que eles vão disputar essa paternidade da transposição, que, a despeito de ter sido iniciada no Governo Lula e de ter a digital de Ciro Gomes, de fato está sendo entregue pelo Bolsonaro, ele que está inaugurando", conclui.