A cerca de um ano e meio das eleições, o prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), está imerso em uma mudança de alinhamento da sua base, com perda de aliados históricos e a atração de antigos opositores ligados a adversários como o secretário da Saúde de Maracanaú, Capitão Wagner (União), e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Um divisor de águas do pedetista foi o envio para a Câmara Municipal, no fim do ano passado, da taxa do lixo. A inclusão do novo imposto na conta dos fortalezenses foi aprovada na Casa, mas dividiu a base do prefeito, fez aliados mudarem de lado e correligionários se voltarem contra o mandatário. Soma-se a isso uma crise interna sem precedentes do PDT do Ceará.
Para minimizar os danos, Sarto tem atraído para seu lado antigos críticos de sua gestão. Em um dos casos mais recentes de aproximação direta com a oposição ocorreu com a nomeação do ex-candidato a vice-governador do Ceará, Raimundo Gomes de Matos (PL), para um cargo na gestão municipal.
O correligionário do ex-presidente Jair Bolsonaro agora comanda a Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), órgão sob responsabilidade da Prefeitura. Em entrevista ao colunista de Política do Diário do Nordeste, Wagner Mendes, o agora secretário disse que a indicação ocorreu por conta de sua amizade com o prefeito desde quando ambos eram deputados.
Contudo, dias antes da nomeação, o filho de Raimundo, o vereador Pedro Matos (PL), havia se declarado como parte da base do prefeito Sarto. O secretário ainda revelou que consultou opositores do grupo governista antes de aceitar o cargo.
"Conversei com o Pedro (Matos), conversei com o Junior Mano, Acilon e disseram que não tinha nenhum impedimento (para assumir), e que teria apoio para trabalhar. Liguei também pro Capitão Wagner. Durante a minha trajetória política eu sempre fui muito transparente. Não poderia assumir uma posição dessa sem ouvir os liderados e as pessoas com que nós pactuamos politicamente", disse.
Aproximação com o PL
A integração de Pedro Matos à base não é um caso isolado no PL. Dentro da sigla estão Ana do Aracapé e Tia Francisca, aliadas históricas do atual prefeito de Fortaleza. Recentemente também se filiou à sigla mais um aliado do mandatário, o vereador Bruno Mesquita. Ao todo, dos seis nomes do PL no Legislativo municipal, quatro são aliados de Sarto.
O prefeito e seus aliados ainda têm feito acenos a partidos da oposição por meio de lideranças políticas estaduais e federais. Na última segunda-feira, por exemplo, o pedetista recebeu o líder do União Brasil na Câmara – legenda oposicionista em Fortaleza. Elmar Nascimento veio à Capital acompanhando os pedetista André Figueiredo e Weverton Rocha, senador do Maranhão.
No Ceará, a principal força do União Brasil é justamente Capitão Wagner, derrotado pelo prefeito nas eleições de 2020.
Aliados de Sarto a nível estadual também têm feito aproximações com partidos opositores. Os deputados estaduais Antônio Henrique, Cláudio Pinho e Queiroz Filho, todos do PDT, participaram, nesta semana, de uma fiscalização de equipamentos de saúde ao lado de integrantes do União Brasil e do PL: Felipe Mota, Sargento Reginauro, Carmelo Neto, Dra Silvana e Pastor Alcides Fernandes compunham a comitiva.
“Dores de Fortaleza”
Outra abertura de diálogo do prefeito com a oposição ocorreu em fevereiro, quando ele cumpriu agenda em Brasília. Entre as agendas, Sarto encontrou o senador Eduardo Girão (NOVO), que é seu adversário político e principal aliado de Capitão Wagner no Ceará.
"Podemos ser adversários, mas jamais inimigos", disse o parlamentar tranquilizando o prefeito. "Vim aqui ponderar as dores de Fortaleza para que ele como senador influente da República nos ajude a fazer a gestão de Fortaleza", disse Sarto.
O encontro repercutiu na Capital, com algumas lideranças políticas questionando a relação entre o prefeito e o senador. O gestor minimizou as críticas e disse que vai "visitar todos deputados e senadores que abrirem as portas".
Turbulência na base
Se o prefeito José Sarto tem conseguido sucesso nas articulações com ex-opositores, na base o cenário é bem mais turbulento. Desde as eleições de 2022, o PDT no Ceará está rachado: de um lado estão pedetistas alinhados ao ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, de outro estão os mais próximos ao senador Cid Gomes.
Na divisão, Sarto se manteve ao lado do antecessor na Prefeitura, grupo esse que saiu derrotado das eleições do ano passado. Não bastasse a turbulência dos correligionários, o prefeito enfrentou problemas na base ao enviar para a Câmara a taxa do lixo.
A proposta enfrentou rejeição da oposição e até de integrantes da base. Parlamentares como o então líder do PDT na Casa, Júlio Brizzi (PDT), o então vice-líder do governo na Câmara, Léo Couto (PSB), e a vereadora Enfermeira Ana Paula (PDT) se manifestaram duramente contrários à proposta, com críticas diretas ao prefeito.
No caso dos correligionários, as críticas escalaram até para ataques pessoais contra o mandatário. Léo Couto e Júlio Brizzi ainda deixaram as funções de liderança na Casa. Esse grupo de parlamentares chegou a entrar na Justiça com integrantes do PL, União Brasil, PT e Psol para questionar a aprovação da taxa na Justiça.
Sarto ainda viu uma nova escalada na crise do PDT, agora com ele próprio no centro dos embates. Em entrevista ao podcast ‘As Cunhãs’, divulgado em 28 de fevereiro, o senador Cid Gomes criticou a gestão municipal. O pedetista disse que as ações de Sarto em Fortaleza não podem "ficar na Aldeota". "Ele tem que trabalhar e parecer que está trabalhando. Ele tem que ser flagrado cinco horas da manhã no cruzamento da José Bastos", disse Cid.
Perda de aliados
A saída de Júlio Brizzi, Léo Couto e Ana Paula da base não foram as únicas. Outros dois aliados do prefeito declaram o afastamento do prefeito desde a última semana. Eudes Bringel (PSB) foi o primeiro.
“A gente começou a sentir algumas retaliações por não ter acompanhado o prefeito Sarto e passamos a ser tratado como oposição. Não sabia que ser base seria fechar os olhos e apertar o dedo toda hora. As coisas começaram a não ter defesa. Aumento da taxa de ônibus, empréstimos sem ser bem esclarecido, demandas da gente que não estavam sendo atendidas”, disse o socialista.
Na última terça feira (28), mais uma perda. A vereadora Estrela Barros (Rede) anunciou que estava retirando o apoio à gestão municipal. “Eu jamais poderia votar em uma taxa de lixo para o meu povo. Devido a essa posição, tenho sofrido retaliações. Demissão em massa de um povo carente que não tem nada a ver com isso”, queixou-se.