Supermercado de Fortaleza limita venda de café em meio à alta de preço; prática é abusiva, diz Procon

A alta do custo desse produto deve-se à quebra da safra devido à crise climática, conjuntamente com o aumento da demanda global

Escrito por
Bruna Damasceno bruna.damasceno@svm.com.br
(Atualizado às 11:47)
Café limitado
Legenda: A prática não é permitida sem justificativa, exceto em casos específicos, como em estado de calamidade pública
Foto: Diário do Nordeste

Em meio à alta do preço do café, um supermercado limitou a venda do item de uma marca em oferta, no bairro Aldeota, em Fortaleza. Não há, contudo, risco de escassez do produto no Ceará. Conforme especialistas em defesa do consumidor, a prática não é permitida sem justificativa, exceto em casos específicos, como em estado de calamidade pública.

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O café em questão era da marca Pilão, na versão a vácuo de 250 gramas, comercializado por R$ 12,89. Em lojas de outras bandeiras, o mesmo pó é encontrado por R$ 14,29 a R$ 22,00. O Diário do Nordeste realizou a pesquisa durante a tarde dessa quarta-feira (12). 

Segundo o diretor-executivo do supermercado Frangolândia, José Ximenes, o ato se justifica porque a empresa “vende para o varejo e se esforça para ser a mais barata”. “Se vender em quantidade maior, faltará para os clientes do dia a dia, mas é importante que tenha e respeite para os nossos clientes”, afirmou, ponderando estar com o estoque abastecido. 

Já o diretor da Associação Cearense de Supermercados (Acesu), Nidovando Pinheiro, disse não haver risco de desabastecimento do café no Ceará e que o setor não está limitando a venda do produto. Conforme comunicado oficial da entidade, enviado após a publicação desta matéria, esse caso está de acordo com a legislação (leia nota completa no fim do texto). 

Prática é abusiva, e multa pode chegar a R$ 18 milhões 

De acordo com a presidente do Departamento Municipal de Proteção e Defesa dos Direitos do Consumidor (Procon Fortaleza), Eneylândia Rabelo, os supermercados não podem limitar a quantidade de compra de café, bem como de outros itens.

Rabelo considera esse cenário como especulativo, já que não há informações oficiais sobre falta do produto ou outros fatores que justifiquem a restrição de compra, diferentemente da realidade vivenciada no período da crise sanitária da Covid-19, por exemplo. 

"Naquele momento de agravamento da pandemia, a limitação era uma forma de possibilitar que todos os consumidores tivessem acesso a máscaras e álcool de forma igualitária, num cenário de escassez do produto e de alta de preços por parte de atravessadores que se aproveitavam para obter lucros abusivos", disse. 

Conforme o Procon, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 39, veda a prática de limitar a quantidade de produtos ou serviços adquiridos por consumidores, exceto em situações com justificativa plausível. 

O CDC estabelece que "recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque e, ainda, de conformidade com os usos e costumes" configura prática abusiva, sujeita a penalidades como multa, cujo valor pode chegar R$ 18 milhões.

A advogada especialista em Direito do Consumidor e presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Ceará (OAB-CE), Cláudia Santos, reitera que o artigo 39 do CDC ampara o consumidor nesses casos.

"Não há justificativa. Somente se a empresa enfrentasse um desabastecimento no mercado, ela poderia limitar a venda, pois estaria agindo em prol da coletividade. Caso não haja essa possibilidade, incide diretamente o Código de Defesa do Consumidor", enfatizou.

  • Como denunciar: ligue para o Procon pela Central de Atendimento ao Consumidor 151. 

Café subiu mais de 50% em Fortaleza; entenda os motivos 

Na Grande Fortaleza, a inflação do café subiu para 53,14% nos últimos 12 meses, até janeiro. Somente no último mês, o aumento foi de 9,86%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

O economista Alex Araújo explicou que a alta do custo desse produto, observada nos últimos dois anos, deve-se à quebra da safra devido ao clima, conjuntamente com o aumento da demanda global. A crise climática afetou as principais áreas produtoras, como o Brasil, Vietnã e Colômbia.

“Diversos países que não tinham uma cultura de consumo de café passaram a consumir, ainda que de forma modesta se comparado, por exemplo, com o consumo per capita brasileiro, o suficiente, contudo, para aumentar a procura pela bebida”, apontou. 

Um deles é a China, onde o consumo saltou de 300 mil sacas de 60 kg por ano para 6 milhões, conforme dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) referentes à comparação entre as safras 2019/2020 e 2024/2025.

Para o economista, a perspectiva de curto prazo é de preços ainda pressionados.

“Alguns especialistas sugerem um potencial de alta da ordem de 20% somente no primeiro semestre deste ano. Infelizmente os preços só devem se acomodar na safra 2025/26 que começa a ser colhida no segundo semestre”, analisou. 

Acesu diz que prática está de acordo com a lei

Em nota, a Associação Cearense de Supermercados (Acesu) afirmou que “eventuais limitações comerciais quantitativas de venda de determinados produtos, especialmente aqueles em ofertas promocionais, praticadas pelo varejo alimentício, não se trata de uma imposição arbitrária, mas de uma prática legítima e justificada legalmente pelo interesse coletivo/social”.

“A medida visa garantir que um maior número de consumidores e suas famílias tenham acesso às mercadorias ofertadas, evitando a compra em grande escala por poucas pessoas e assegurando uma distribuição mais igualitária dos produtos em estoque para a sociedade como um todo. Essa prática está alinhada a exceção legal prevista no artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), configurando, assim, uma justa causa para as eventuais excepcionalidades/limitações quantitativas praticadas”, informou. 

A entidade ressaltou que orienta os associados a comunicar de forma clara e ostensiva qualquer restrição quantitativa. “A Acesu reafirma seu compromisso com o equilíbrio e a harmonia nas relações de consumo, assim como a obediência à norma consumerista, trabalhando para que os supermercados e os seus clientes consumidores sejam beneficiados de maneira justa e transparente”, finaliza a nota. 

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