Privatização da Eletrobras: o que muda para o consumidor e quais os próximos passos

Venda da estatal não deve reduzir valores cobrados, mas Governo prepara manobra para subsidiar reajustes mais amenos

Escrito por Carolina Mesquita ,
Legenda: O modelo escolhido para a privatização da Eletrobras foi o de aumento de capital aberto
Foto: T. Schneider/Shutterstock

Com a aprovação do Tribunal de Contas da União (TCU) na segunda etapa da análise do processo de privatização da Eletrobras nessa quarta-feira (18) o Governo Federal agora possui caminho livre para dar continuidade à venda da estatal.

Entretanto, quais são os próximos passos do processo de privatização e o que deve mudar para o consumidor? 

O consultor de energia da Federação das Indústrias do Ceará (Fiec), Jurandir Picanço, lembra que a aprovação do TCU era a última etapa que faltava para a venda poder ser iniciada de fato.

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Tendo em vista a pressa do governo em concluir a transação ainda na gestão de Jair Bolsonaro, ele acredita que o edital deva ser divulgado em breve, seguido pela disponibilização das ações da empresa na Bolsa de Valores.

O modelo escolhido para a privatização da Eletrobras foi o de aumento de capital aberto, ou seja, novas cotas serão disponibilizadas para a venda até que a participação da União atinja 45% e ela deixe de ser o acionista majoritário. Entre as regras estabelecidas está o limite de controle de não mais que 10% por novo acionista.

Picanço esclarece que, sem um controlador, os acionistas vão participar de assembleias que irão eleger o conselho da empresa, responsável por tomar as decisões da companhia.

"Essa forma de gestão não é comum aqui no Brasil, mas já é muito visto nos Estados Unidos e tem dado certo", afirma.

O especialista ainda defende o modelo já que permite que a Eletrobras continue sendo uma grande empresa nacional, a única brasileira privada do setor com esse porte.

O setor elétrico brasileiro é formado por grandes empresas estrangeiras e pela Eletrobras. Nós temos, por exemplo, a Iberdrola, que é espanhola, a Enel, que é italiana, e a Eletrobras vai ser a única empresa privada nacional desse porte".
Jurandir Picanço
Consultor de energia da Fiec

Burocracia

Apesar da intenção de dar celeridade à privatização daqui pra frente, o diretor de regulação do Sindicato das Indústrias de Energia e de Serviços do Setor Elétrico do Estado do Ceará (Sindienergia), Bernardo Santana, não acredita que a conclusão se dê ainda esse ano.

A explicação para a espera mais longa é a burocracia dos processos, além da proximidade do período eleitoral, entre outras incertezas.

Como a privatização se dará por meio de aumento de capital, arranjos com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e com a Securities and Exchange Comission (SEC), organização semelhante à CVM nos Estados Unidos, onde as ações serão disponibilizadas, precisam ser acertados.

"A gente está vivendo um momento em que mudou o ministro de Minas e Energias do nada, muito em função de pressões inflacionárias envolvendo os combustíveis, além da disparada no preço da energia", pontua Santana sobre as incertezas do momento.

Impacto ao consumidor

Um dos pontos de atenção na privatização é a ideia do Governo Federal destinar parte do bônus de outorga à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fundo bancado pelos consumidores através da conta de luz e que subsidiaria como atenuante de reajustes tarifários.

A prática, no entanto, é alvo de críticas de Santana, já que também foi utilizada no governo Dilma e reduziu as tarifas em 20%, mas foi seguida por um aumento de 40% no ano seguinte.

"São medidas bruscas para demonstrar popularidade que pode gerar uma reação pior lá na frente. Uma melhor discussão é o teto do ICMS sobre a conta de energia que é vista no Congresso, mas os governadores não devem deixar passar tão fácil", avalia.

O consultor de energia da Fiec, Jurandir Picanço, também não enxerga nenhuma mudança expressiva para o consumidor no curto-médio prazo em decorrência da privatização, especialmente nos valores.

Isso porque a Eletrobras atuante de um setor totalmente regulado, com regras ditadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). 

"Quem estabelece as condições dos contratos, a tarifa das concessionárias, é a Aneel. Sendo estatal ou privada, a Eletrobras vai precisar atender a todos esses requisitos", esclarece.

Ainda assim, ele aponta que a expectativa é que a empresa se torne mais eficiente nos próximos anos, o que pode contribuir para uma redução da cobrança.

Rumos da estatal

Os especialistas também comentam a expectativa sobre alterações nos rumos e prioridades da Eletrobras.

Santana indica que a projeção é que o serviço fique melhor, que haja expansão da rede, maior eficiência, novos investimentos na produção de energia, principalmente em matrizes renováveis, e redução da folha salarial.

Ele argumenta que um enxugamento no quadro de funcionários é natural em processos de privatização e lembra que a estatal lançou um Plano de Demissão Voluntária (PDV) há não muito tempo.

"Se compararmos o número de funcionários que a Coelce possuía antes da privatização e hoje em dia deve ser menos da metade. Mas muitos serviços foram terceirizados. A redução da folha é natural nesse processo para aumentar o lucro dos acionistas", explica.

Mesmo ainda com muita incerteza, Jurandir espera que a Eletrobras continue com o porte e importância que possui.

"Eu tenho experiência de ter sido presidente de uma estatal e a privatização tem seus méritos, mas não veremos nenhuma mudança brusca. É como mudar a rota de um transatlântico, tem que ser aos pouquinhos", ressalta.

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