Indústria quer Reintegra retroativo a janeiro para mitigar efeitos do tarifaço de Trump
Setores devem se reunir nos próximos dias para avaliar medidas dos governos federal e estadual e traçar plano de ação
O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Ricardo Cavalcante, disse nesta quinta-feira (14) que o prazo de vigência do Reintegra (Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários) precisa ser melhor avaliado pelo Governo Federal. O Reintegra faz parte do plano de contingência Brasil Soberano apresentado nessa quarta-feira (13) por Lula.
Segundo Cavalcante, o setor industrial solicitou ao Governo Federal que o Reintegra valesse a partir de janeiro deste ano para que fossem devolvidos créditos tributários em cima do montante exportado até julho deste ano.
"O Reintegra, a nossa ideia, era que ele pudesse nos devolver de janeiro a julho o que a gente exportou para os Estados Unidos, como capital de giro para as empresas poderem se fortalecer e continuarem com as suas atividades. Mas, da forma como saiu, é daqui para frente. Então, eu estava vendendo até julho, em agosto não estou vendendo. Então, eu vou ganhar 3,1% de quê? De zero. Então, vou ganhar zero", pontuou Cavalcante.
Com a medida apresentada nessa quarta-feira (13), os exportadores brasileiros receberão parte dos tributos pagos ao longo da cadeia produtiva, na forma de crédito tributário, em até 3,1% para grandes e médias empresas, e as micro e pequenas, com até 6%.
Segundo a medida do Governo Federal, as novas condições do Reintegra valerão até dezembro de 2026 e terão impacto de até R$ 5 bilhões.
O dirigente da Fiec ainda afirmou que esperava que dentro do plano de contingência fosse anunciado o pagamento de pelo menos parte da tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos para viabilizaar as exportações até que a negociação com os países fosse concluída.
Ele avaliou como positivas as medidas apresentadas até agora, mas que espera pelas regulamentações e afinamentos dos textos, que segundo o empresário, ainda estariam "muito vagos".
"A medida provisória só chegou na mão da gente lá para as 17 horas (de quarta). A gente (ainda) está analisando porque tem coisas que vão ser regulamentadas, mas boa parte do que a gente solicitou saiu", comentou.
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Entidade ainda estuda formas de ajudar os setores
Cavalcante lembra que a entidade segue estudando a medida provisória e aguardando os textos finais que devem vir após passagem pelo Congresso Nacional, sanção do presidente Lula e regulamentação.
Ele revela que, com as medidas divulgadas, devem ser feitas discussões setoriais. No caso do Ceará, a Fiec trabalha com 19 setores impactados.
"Cada um tem uma peculiaridade diferente da outra. Então, não dá para olhar as medidas e achar que vai resolver o problema de todos juntos. Então, desde ontem, a gente está aqui na Fiec junto com todos os empresários e exportadores discutindo as melhores formas".
Sobre a possibilidade de compra de produtos por outros estados, além do Ceará, como os pescados, frutas e a água de coco, o empresário disse que essa negociação ainda não foi iniciada e que agora, com as medidas do governo federal, elas podem começar a ocorrer.
Segundo o dirigente da Fiec, os setores estão otimistas de que apenas as compras do Governo do Ceará para merenda escolar, hospitais e o programa Ceará sem Fome já devam ser bastante mitigadoras do impacto, principalmente, os alimentos perecíveis, como os pescados.
Celeridade é ponto-chave
O presidente da Fiec também exemplificou que empresários trabalham com recursos mês a mês. Por isso, seria muito importante que toda a regulamentação, tanto federal quanto estadual, ocorra ainda dentro deste mês de agosto.
Ele ressaltou a importância das linhas de crédito que foram abertas, mas disse que ainda não se sabe como serão as taxas de juros e distribuição do quantitativo.
O presidente da Fiec ressaltou a importância do mercado norte-americano para o mundo e disse que o Brasil não pode deixar que essas portas se fechem por problemas políticos.
"Os compradores querem os nosso produtos, eles são os que melhor pagam e se o Brasil não negociar, a China está louca pra entrar lá, a Índia, a União Europeia. E vocês sabem que em mercado, em negócio, quando um sai, o outro entra. E a gente não pode perder esse espaço", disse.
Ele também afirma que aguarda a regulamentação das medidas estaduais até esta sexta-feira (15), lembrando que todas as medidas solicitadas pelo empresariado foram atendidas pelo Governo do Estado.
Principais medidas do Plano Brasil Soberano:
EIXO 1: Fortalecimento do setor produtivo
Linhas de crédito
- R$ 30 bilhões do Fundo Garantidor de Exportações (FGE) serão usados como funding para concessão de crédito permitindo taxas acessíveis;
- Prioridades por: dependência do faturamento em relação às exportações para os EUA; tipo de produto e porte de empresa. Serão priorizados os mais afetados;
- As pequenas e médias empresas também poderão recorrer a fundos garantidores para acessar o crédito;
- O acesso às linhas estará condicionado à manutenção do número de empregos.
Prorrogação de prazos do regime de drawback
- Extensão excepcional do prazo para comprovação da exportação de produtos fabricados a partir de insumos importados ou adquiridos no Brasil com suspensão tributária;
- O governo vai prorrogar, por um ano, o prazo para que as empresas consigam exportar suas mercadorias que tiveram insumos beneficiados pelo regime. Esses produtos poderão ser exportados para os EUA ou para outros destinos. Com isso, elas não terão que pagar multa e juros se não conseguirem exportar aos EUA no prazo originalmente previsto;
- A medida vale para as empresas que contrataram exportações para os Estados Unidos que seriam realizadas até o final deste ano. Dos US$ 40 bilhões exportados em 2024 para os Estados Unidos, US$ 10,5 bilhões foram realizados via regime de drawback;
- A prorrogação não tem impacto fiscal, pois apenas posterga o prazo para cumprimento dos compromissos de exportação assumidos pelas empresas brasileiras.
Diferimento de tributos federais
- A Receita Federal fica autorizada a fazer diferimento de cobrança de impostos para as empresas mais afetadas pelo tarifaço;
- Como funcionará: adiamento do pagamento dos próximos dois meses para empresas mais afetadas.
Compras públicas: apoio a produtores rurais e agroindústrias
- De forma extraordinária, por ato infralegal, União, Estados e Municípios poderão fazer compras para seus programas de alimentação (para merenda escolar, hospitais etc) por meio de procedimento simplificado e média de preço de mercado, garantidos a transparência e o controle dos processos;
- A medida vale apenas para produtos afetados pelas sobretaxas unilaterais.
Modernização do sistema de exportação
- Ampliação das regras da garantia à exportação, instrumento que protege o exportador contra riscos como inadimplência ou cancelamento de contratos;
- As mudanças visam fortalecer empresas exportadoras de média e alta intensidade tecnológica e investimentos produtivos em economia verde;
- O Plano Brasil Soberano permitirá que bancos e seguradoras utilizem essa garantia em mais tipos de operações;
- Prevê mecanismos de compartilhamento de risco entre governo e setor privado, utilizando o Fundo Garantidor do Comércio Exterior (FGCE) como mecanismo de primeiras perdas, aumentando o acesso a crédito e reduzindo custos.
Fundos garantidores
- Aportes adicionais de R$ 1,5 bilhão no FGCE, de R$ 2 bilhões no Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), do BNDES, e R$ 1 bilhão no Fundo de Garantia de Operações (FGO), do Banco do Brasil, voltados prioritariamente ao acesso de pequenos e médios exportadores.
Novo Reintegra para empresas afetadas
- O Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários (Reintegra) para as Empresas Exportadoras devolve aos exportadores brasileiros parte dos tributos pagos ao longo da cadeia produtiva, na forma de crédito tributário, ajudando a reduzir custos e aumentar a competitividade no mercado externo;
- A medida antecipa os efeitos da Reforma Tributária, desonerando a atividade exportadora;
- Atualmente, empresas de grande e médio porte de produtos industrializados têm alíquota fixada em 0,1%; enquanto micro e pequenas, por meio do programa Acredita Exportação, recebem de volta 3% de alíquota;
- A medida aumenta em até 3 pontos percentuais o benefício para empresas cujas exportações de produtos industrializados foram prejudicadas por medidas tarifárias unilaterais. Ou seja, para continuarem competitivas no mercado norte-americano, grandes e médias empresas passam a contar com até 3,1% de alíquota, e as micro e pequenas, com até 6%;
- As novas condições do Reintegra valerão até dezembro de 2026 e terão impacto de até R$ 5 bilhões.
EIXO 2: Proteção para o trabalhador
O plano cria a Câmara Nacional de Acompanhamento do Emprego para monitorar o nível de emprego nas empresas e suas cadeias produtivas, fiscalizar obrigações, benefícios e acordos trabalhistas, e propor ações voltadas à preservação e manutenção dos postos de trabalho.
Entre as atribuições previstas estão:
- Acompanhar diagnósticos, estudos e informações relativas ao nível de emprego nas empresas e subsetores diretamente afetados pelas tarifas dos EUA;
- Ampliar a análise para identificar impactos indiretos na geração e manutenção de empregos em empresas da cadeia produtiva;
- Monitorar obrigações, benefícios e repercussões nas folhas de pagamento decorrentes de acordos para preservar empregos e mitigar os efeitos das tarifas dos EUA;
- Promover negociação coletiva e mediação de conflitos para manter o emprego;
- Aplicar mecanismos relacionados a situações emergenciais, como lay-off e suspensão temporária de contratos, dentro da lei;
- Fiscalizar o cumprimento das obrigações acordadas e a manutenção dos empregos por meio da Inspeção do Trabalho;
- Utilizar a estrutura regional das Superintendências do Trabalho para engajar trabalhadores e empregadores em negociações para atender às necessidades das empresas afetadas;
- Monitorar a concessão e o pagamento de benefícios trabalhistas aos empregados das empresas diretamente afetadas.
EIXO 3: Diplomacia comercial e multilateralismo
No eixo de diplomacia comercial e multilateralismo, o Brasil negocia acordos que abrem novas oportunidades para empresas nacionais:
- Negociações concluídas: União Europeia; EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio);
- Em negociação: Emirados Árabes Unidos e Canadá;
- Em processo de diálogo: Índia; Vietnã;
- Essas iniciativas fortalecem a inserção internacional do Brasil, ampliam o leque de destinos para produtos nacionais e aumentam a resiliência da economia frente a barreiras comerciais unilaterais. Cabe lembrar que, em menos de três anos, o país abriu 397 novos mercados.