Executivos da Americanas criavam dois balanços, um real e outro falso, para fraudar contas, diz PF

Apurações indicam que objetivo dos suspeitos era esconder o rombo bilionário na empresa

Escrito por Redação ,
Lojas americanas. Executivos da Americanas criavam dois balanço, um real e outro falso, para fraudar contas, diz PF
Legenda: Para produzir o relatório fictício, eles inventavam verbas concedidas por fornecedores, forjavam empréstimos em bancos e fabricavam operações com cartão de crédito
Foto: reprodução

A investigação da Polícia Federal descobriu que executivos das Americanas criavam dois balanços: um baseado em dados reais, que demonstravam a crise financeira da empresa, e outro com informações falsas, com lucros maquiados. Conforme revelado pelo Fantástico nesse domingo (30), o objetivo dos suspeitos era esconder o rombo bilionário nas contas da empresa.

Para produzir o relatório fictício com resultados positivos, eles inventavam verbas concedidas por fornecedores, forjavam empréstimos em bancos e fabricavam operações com cartão de crédito.

Em deleção premiada, os ex-funcionários Flávia Carneiro, antiga responsável pela Controladoria da empresa, e Marcelo da Silva Nunes, ex-diretor financeiro, entregaram mensagens, planilhas e parte da contabilidade da companhia, que foram utilizadas como provas.

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Em uma das conversas, de outubro de 2018, Flávia aponta ao diretor operacional Carlos Padilha que há números inconsistentes em um arquivo fornecido por ele. No trecho, ela aponta um erro no lucro líquido: "O LL [lucro líquido] ficou 60,9 ao invés dos 61,4 do seu aquivo. Tinha diferença de IR [imposto de renda] no seu cálculo. Podemos seguir assim". Em resposta, o executivo diz que o dado inflacionado deve ser mantido e explica o motivo: "Pra não irritar o Miguel". 

O nome citado por Carlos seria uma referência ao antigo CEO do Grupo Americanas, Miguel Gutierrez, acusado de ser o principal responsável pelo esquema que manipulou o resultado financeiro da empresa — que decretou falência em 2023. Além dele, são apontados como envolvidos os ex-executivos Anna Christina Ramos Saicali, considerada braço-direito de Miguel, José Timotheo de Barros, Marcio Cruz e outros 11 diretores, além de Flávia.   

Segundo a investigação da Polícia Federal, as contas da empresa foram inflacionadas, por mais de uma década, sob a gestão do antigo CEO, que chegou a ser preso na última sexta-feira (28) em Madri, na Espanha, após ter o nome incluído na lista de procurados da Interpol — a polícia internacional. Ele foi solto no sábado (29), depois de prestar depoimento.

Por ser um empreendimento de capital aberto na bolsa, a Americanas era obrigada periodicamente a tornar públicos os balanços financeiros. Em anúncio, no ano passado, ela divulgou que a dívida com os credores estava próxima dos R$ 43 bilhões. O motivo do rombo era o esquema criado pela diretoria de Miguel, que provocou um prejuízo de R$ 25 bilhões nas contas. Com essas operações falsas, os executivos tiveram ganhos milionários.

O caso chamou a atenção da Polícia Federal, que iniciou a investigação com apoio do Ministério Público Federal (MPF). Além da delação dos antigos funcionários, as autoridades contaram com as informações fornecidas pela própria companhia sobre as contas. 

Os três maiores acionistas e controladores da Americanas — Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira — não são alvo da operação. Após a descoberta do rombo, o trio investiu R$ 5 bilhões na recuperação judicial da companhia, e promete investir outros R$ 7 milhões.

'A vida como ela é'

Em um dos e-mails obtidos pela apuração, datado de maio de 2022, Marcelo da Silva Nunes conversa com o então diretor operacional, José Timotheo de Barros, sobre o balanço real das contas da Americanas. Na ocasião, ele se refere ao relatório como "A vida como ela é" e questiona se o documento deve "circular para todos".  

O arquivo era referente ao resultado do primeiro trimestre de 2021. Somado, o prejuízo no período foi de mais de R$ 209 milhões. No entanto, na época, ao divulgar os dados ao mercado, a empresa afirmou falsamente um lucro positivo de R$ 129,4 milhões

Para manter as fraudes em sigilo, a antiga administração se reunia secretamente para tratar de assuntos considerados mais sensíveis em uma sala afastada, longe dos demais funcionários, e que ganhou o apelido de “blindada”. No local, que ficava no segundo andar da sede da empresa, no Rio de Janeiro, segundo a PF, várias reuniões foram convocadas para que eles tratassem pessoalmente sobre a estratégia do esquema.

Nesta semana, a corporação cumpriu cerca de 15 mandados de busca e apreensão na casa de ex-diretores da Americanas. A Justiça ainda determinou a prisão dos principais nomes da ex-diretoria: Miguel Gutierrez e Anna Saicali.

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