Vistoria de entidades no IJF avalia atendimentos em meio à greve da enfermagem

Em entrevista, a Comissão de Saúde da OAB-CE e o MPCE informaram que irão dialogar com a Prefeitura e tentar mediar a situação para as categorias

Escrito por Matheus Facundo , matheus.facundo@svm.com.br
Homem carregando maca com paciente no IJF
Legenda: Profissionais afirmam que estão com efetivo em torno de 30% no IJF durante o movimento grevista
Foto: Kid Júnior

Em meio à greve de enfermeiros do Instituto Doutor José Frota (IJF), o hospital recebeu neste domingo (2) uma visita do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e do Conselho Municipal de Saúde da Prefeitura de Fortaleza. O objetivo das entidades foi avaliar a situação do atendimento a pacientes no período de baixa nas escalas, que começou na última quinta-feira (29), com a demanda do pagamento do Piso da Enfermagem. 

Na sexta-feira (30), a Justiça expediu uma liminar ordenando a suspensão do movimento. Uma multa de R$ 15 mil por dia de descumprimento foi definida, mas só começa a valer quando os sindicatos forem notificados oficialmente por meios judiciais, o que ainda não ocorreu, segundo as entidades. E os trabalhadores pontuaram que não vão ceder a greve até que seja dado um retorno sobre as suas demandas. 

aviso de greve da enfermagem pelo pagamento do piso salarial colado em porta no IJF
Legenda: Piso salarial fez categoria entrar em greve no IJF
Foto: Matheus Facundo

O Diário do Nordeste acompanhou a vistoria na emergência superlotada e classificada pelo MPCE como "caótica". Mais de 80 pacientes estavam amontoados em macas nos corredores da unidade, e alguns não tinham nem previsão de transferência para um leito.

Em entrevista, a Comissão de Saúde da OAB-CE e o MPCE informaram que irão dialogar com a Prefeitura e tentar mediar a situação para as categorias. "A sociedade tem que ser preservada. Obviamente o que nós vimos aqui é uma situação muito crítica. Nós temos em torno de 100 pacientes nos corredores, enquanto nos verificamos que tem mais de 100 leitos vagos na enfermaria", pontuou o advogado Ricardo Madeiro, presidente da Comissão de Saúde da OAB-CE.

Enfermeiras conversando com órgãos durante visita no IJF
Legenda: A categoria conversou com os representantes da OAB e do MPCE
Foto: Matheus Facundo

Ele ponderou ainda que a superlotação já seja histórica, "se era uma situação ruim, hoje ela é péssima" por conta da greve. Madeiro frisou, ainda, que a entidade é "extremamente sensível ao movimento da enfermagem". 

O apelo que nós fazemos é que haja uma sensibilidade dos gestores públicos e que eles parem para escutar os profissionais e que haja essa mediação junto a eles. E a Ordem dos Advogados do Brasil está se propondo exatamente a isso. A intermediar e fazer com que os profissionais passem a ter o direito do seu piso salarial. E é justo que a sociedade tenha o atendimento digno que ela merece e que a Constituição garante
Ricardo Madeiro
Presidente da Comissão de Saúde da OAB-CE

A promotora de justiça Ana Cláudia Uchôa, do MPCE, ressaltou a situação na emergência do hospital e disse que é importante que haja uma mediação da greve: "A gestão precisa realmente isso, pois a população está precisando muito, e o trabalho da enfermagem é de muita importância". 

"Nós iremos realmente procurar a gestão municipal e estadual, pois esse é um hospital que tem pacientes de todo o Estado, então nós queremos que os governos se empenhem em resolver essa questão", aponta. 

O que relatam os pacientes?

O relato de pacientes e familiares é parecido e tem em comum a exaltação do trabalho dos enfermeiros que seguem na escala, apesar do movimento da categoria. Com a paralisação, o efetivo total cai e fica em torno dos 30%, "muitas vezes acima", conforme os profissionais da enfermagem. 

"Tem pouco enfermeiro, sim, tem. Mas elas estão fazendo tudo o que podem pela gente. Eu levei uma queda, tive um começo de AVC e estou aqui há oito dias. O que vi são que elas são pessoas competentes, e meninas que estão se dedicando à nossa saúde", relatou a Ana Maria de Oliveira Soares, enquanto ajudava outra paciente que conheceu no local. Ela está há oito dias na enfermaria do IJF.

No entanto, há de fato quem sofreu com o impacto da greve, como a jovem Taís Souza, de 25 anos, acompanhante da filha de três anos que aguarda uma cirurgia e um leito. O procedimento dela ia ocorrer na última quinta-feira (29), mas teve de ser cancelado pela falta de enfermeiros. 

"Eu não tiro a razão deles em questão de estar de greve e estar reivindicando o direito deles. Mas, a gente precisa também ver como que vai ficar o caso dessas crianças que estão aqui. Eu não consegui nem vaga para ela ser transferida para a enfermaria, e enquanto isso eu fico aqui, dormindo ao lado dela em uma cadeira", relata a mãe. 

'Falta diálogo', afirma Sindicato 

Ana Miranda, vice-presidente do Sindicato dos Servidores e Empregados Públicos do Município de Fortaleza (Sindifort), acompanhou a visita e pediu aos órgãos que intercedessem com eles, pois falta diálogo com Prefeitura de Fortaleza: "O nosso objetivo era que a gente pudesse dialogar tudo calmamente com tranquilidade, mas o prefeito nunca deu nem uma sinalização". 

"Chega um momento que a gente permite olhar para nós mesmos, ou então a gente entra em um sofrimento eterno. A população precisa saber que os heróis da pandemia precisam ser valorizados. O que resolve o nosso problema é a implementação do piso salarial da categoria considerando vencimento base de início de carreira. É esse o pleito da categoria", afirmou.

Em nota, a Prefeitura de Fortaleza pontua que está em diálogo com as categorias e informou neste domingo que o pagamento do Piso da Enfermagem depende do Governo Federal, "que precisa estabelecer os critérios e parâmetros relacionados à transferência de recursos, permitindo que o município possa pagar o piso nacional proposto". 

"O Supremo Tribunal Federal (STF) está analisando (ADI 7222) se os valores pagos a essas categorias por estados, municípios e autarquias devem ocorrer somente com recursos repassados pela União. O Município reitera ainda que tem dialogado com a categoria por meio das Secretarias da Saúde (SMS) e de Planejamento, Orçamento e Gestão (Sepog)", diz a gestão. 

Hospital teme impacto da greve 

A médica chefe da emergência do IJF, Lorena Gomes, pontou que o movimento tem um "impacto muito grande sobre a emergência": "A suspensão da greve não está sendo cumprida e isso faz com que a gente tenha um impacto direto nos pacientes que ficam no corredor".

Ela conta que a superlotação provoca "tumulto" e "insatisfação" nos pacientes e também sobrecarrega as equipes escaladas. No entanto, os corredores lotados "não são de hoje", conforme os enfermeiros e técnicos. Eles ressaltam que "nunca faltou enfermeiro".

Nesta segunda (3), o Sindifort convocou os profissionais do IJF para uma Assembleia que vai discutir e deliberar a possibilidade da suspensão da greve. O momento ocorre às 11h na sede do sindicato.

 

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