Desmatamento no Ceará afetou área equivalente a 13 parques do Cocó em 2021
No Estado, as ações de retirada da vegetação nativa tiveram crescimento entre 2019 e 2021. No ano passado, por dia, o Ceará perdeu 57 hectares
O desmatamento avançou com expressividade nos últimos dois anos no Ceará. O Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, do MapBiomas, constata que o desmate no Estado passou de 854 hectares (ha), em 2019, para 20.820 hectares em 2021. Em termos comparativos, com a retirada da vegetação nativa, o Estado perdeu, em 2021, uma área equivalente a 13 parques do Cocó (1.581,29 ha) - maior parque natural em área urbana do Norte e Nordeste.
Entre 2020 e 2021, o desmatamento no Estado avançou em 11.858 hectares, uma elevação proporcional de 132%, conforme o documento do MapBiomas. Com isso, o Ceará figura na triste e preocupante lista dos estados nos quais o desmatamento mais foi ampliado, em proporção, nesse intervalo de tempo.
Os dados não são detalhados por municípios no relatórios, mas mostram que, dentre os locais, duas unidades de conservação estão entre as mais desmatadas no Brasil: Serra da Ibiapaba e da Chapada do Araripe. Integram também a lista Pernambuco, Paraíba, Minas Gerais e Sergipe, pois todos tiveram mais de 80% de aumento de perdas da vegetação nativa entre 2020 e 2021.
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O MapBIomas, iniciativa do Observatório do Clima, realizado por uma rede de universidades, ONGs e empresas de tecnologia, também monitora os alertas gerados por sete sistemas de monitoramento em operação no Brasil, com base em sensores e geoprocessamentos.
No Ceará, como indica o documento, os alertas sobre desmatamentos também cresceram de forma expressiva no período mencionado. Em 2019, o Estado teve 29 avisos do tipo, enquanto em 2021, o número passou para 2.598 alertas.
Questionada sobre o assunto, a Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema) informou, por meio de nota, que realiza a proteção e revitalização dos ecossistemas no Estado para deter a degragadação e restaurar espaços naturais.
Entre os anos de 2021 e julho de 2022 foram registradas 174 ocorrências relativas a desmatamento atendidas pela equipe da Diretoria de Fiscalização (Difis). Além disso, a Difis registra o total de quase 400 ha de áreas embargadas, conforme dado repassado pela Sema
"Ações de reflorestamento, criação de unidades de conservação, apoio à elaboração dos Planos Municipais de Proteção da Mata Atlântica, Planos de Manejos das Unidades de Conservação (UCs), viveiros para produção de mudas de espécies nativas do bioma", estão entre as ações citadas.
Por que as ocorrências aumentaram?
As ampliações de alertas e ocorrências, diz o relatório, refletem tanto o crescimento do desmatamento como também a melhora no sistema de detecção do Sistema de Alerta de Desmatamento da Caatinga (SAD Caatinga).
O geógrafo e professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade Federal Fluminense (UFF), Flávio Rodrigues do Nascimento, reitera a avaliação quanto ao aprimoramento dos sistemas, mas enfatiza o fato de que as ocorrências irregulares aumentaram.
Um dos fatores, ressalta ele, que figura entre os principais motivos de desmatamento, “é a busca por mais terras para incorporar à agricultura e a pecuária”.
Embora o Ceará não tenha terras tão agricultáveis, pelo que se analisa, isso (desmatamento) tem acontecido em função da abertura de novas terras para o desenvolvimento da agricultura e acompanhado a pecuária, ou agropecuária
Neste ano, o relatório passou a identificar os principais vetores que pressionam para a ocorrência do desmatamento no Brasil. São eles:
- Agropecuária: 97,8%
- Garimpo: 0,6%
- Mineração: 0,1%
- Expansão Urbana: 0,2%
- Outros: 1,3%
No Brasil, o desmatamento cresceu 20% entre 2020 e 2021. No ano passado, o País teve 3.925 hectares desmatados por dia. Por estado, o Pará lidera o ranking do desmatamento com 24,31% da área desmatada no País, seguido do Amazonas, com 11,75%
Caatinga é um dos biomas mais desmatado
Dos seis biomas brasileiros monitorados, Amazônia, Cerrado e Caatinga são os que mais sofrem com o desmatamento. Amazônia e Cerrado juntos representaram 89,2% da área desmatada detectada, segundo o relatório. Quando somada a Caatinga, os três biomas responderam por 96,2% das perdas.
No Ceará, o bioma predominante é a Caatinga. Flávio do Nascimento destaca que, embora seja o terceiro no ranking, “isso não quer dizer que o desmatamento na caatinga tenha sido pequeno”.
“Não dá para comparar a Amazônia e o Cerrado porque a disposição e o tipo de bioma mostram mais terras agricultáveis, mais ocupadas por florestas, e são áreas mais demandáveis ao desmatamento”, completa, enfatizando que o monitoramento da Caatinga é fundamental.
O impacto, explica ele, é que o desmatamento “é um dos maiores problemas ambientais do mundo e contribui para a desertificação”. No Ceará, explica ele, “um estado muito seco, a desertificação é um conjunto de problemas que tem como ponta de lança o uso inadequado do solo, sobretudo, com o desmatamento”.
Dentre os principais efeitos do desmatamento, o geógrafo elenca:
- Quebra de uma cadeia de serviços ambientais com a extinção da fauna
- Mudanças que alteraram as condições climáticas locais e regionais
- Comprometimento da formação de umidade relativa do ar impactando na formação de chuvas
- Assoreamento de rios e extinção de nascentes, com isso o processo de formação de água é extremamente comprometido
- Mudança da condição da dinâmica da paisagem
Ações de combate
O relatório aponta ações realizadas por órgãos como secretarias do Meio Ambiente e Ministérios Públicos para combater as ações ilegais. Das informações utilizadas no relatório, no Ceará, as ações da SEMA e do MPCE em 2021 chegaram a 18 alertas de desmatamento, 0,5% do número total de alertas validados entre 2019 e 2021.
A área total desses alertas, diz o documento, somaram 220 hectares, o que corresponde a 0,7% do desmatamento verificado no Estado.
Para reduzir o avanço do desmatamento, Operação Mata Atlântica em Pé acontece por meio de 17 Ministérios Públicos estaduais, incluindo o Ceará, junto às instituições públicas estaduais competentes no tema de monitoramento, controle e combate ao desmatamento.
Os MPs são responsáveis por fazer o levantamento das áreas desmatadas com apoio da Fundação SOS Mata Atlântica e MapBiomas Alerta e pela identificação dos proprietários, de eventuais licenças ambientais obtidas, do histórico de uso e conservação da área e cruzamento com bancos de dados específicos do tema. Além disso, a Operação deve realizar a fiscalização, autuação e responsabilização pelos danos ambientais.
Em 2021, foram fiscalizados 41 polígonos, em 14 municípios diferentes, oportunidade em que os órgãos fiscalizadores lavraram 17 autos de infração, e 16 de embargos, como informou o MPCE por meio de nota. No período, foram aplicados R$ 1,6 milhão em multas.
"Em razão do novo relatório apresentado agora em 2022, novo procedimento será instaurado para averiguar o mapeamento do desmatamento, objetivando, além da implementação das responsabilizações legais, o estudo de estratégias de atuação junto às instituições parceiras, para com o confronto das informações, operacionalizar uma fiscalização mais efetiva, e aplicação de sanções mais severas", completou.