De briga com plateia a show elogiado, saiba como foram as duas passagens de Cazuza por Fortaleza

Apresentações no Ceará evidenciaram a aura do artista, cuja trajetória repleta de sucessos terminou precocemente 31 anos atrás

Escrito por Antonio Laudenir , laudenir.oliveira@svm.com.br
Cazuza nos braços dos amigos de Barão Vermelho: Roberto Frejat, Guto Goffi,  Maurício Barros e Dé
Legenda: Cazuza nos braços dos amigos de Barão Vermelho: Roberto Frejat, Guto Goffi, Maurício Barros e Dé
Foto: Diário do Nordeste 28/03/1985

Cazuza (1958-1990) esteve por duas oportunidades em Fortaleza. Fez shows em 1985 e 1988, respectivamente. Na primeira, à frente do Barão Vermelho, uma noite para esquecer. O evento realizado no Ginásio Paulo Sarasate terminou em confusão com o público. 

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Anos depois, o retorno marcou a presença de um cantor mais sereno e em busca de mediar sucesso e a luta contra a doença que o vitimou. De comum entre os dois momentos, a aura do artista cujo pouco tempo de carreira foi sinônimo de sucessos e quebra de paradigmas.

Em 28 de março de 1985, o Barão Vermelho realizou o primeiro show do grupo na capital cearense. Figura central, Cazuza já chamava atenção pelo carisma e talento na criação dos versos. Era o rosto e voz de uma banda no ápice. Com três discos de estúdio, a formação original desembarcava em Fortaleza para uma única apresentação.

Cazuza como rosto e voz do Barão Vermelho
Legenda: Cazuza como rosto e voz do Barão Vermelho
Foto: Diário do Nordeste 28/03/1985

Cazuza (vocal), Guto Goffi (bateria), Roberto Frejat (guitarra), Dé (baixo) e Maurício Barros (teclados) testemunhavam o sucesso do álbum "Maior Abandonado" (1984). Meses antes, janeiro de 1985, o quinteto realizara um show considerado histórico na primeira edição do Rock in Rio.

"Todo Amor Que Houver Nessa Vida", "Down em Mim", "Pro dia Nascer Feliz",  "Maior Abandonado" e "Bete Balanço" (trilha do filme homônimo lançado em 1984) eram alguns hits que explicavam a rápida ascensão no cenário musical brasileiro.

Chuva de latas

Por conta desse retrospecto, a apresentação do Barão Vermelho era cercada de expectativa. Para promover o evento, o Diário do Nordeste preparou um caderno especial. O material incluía letras, biografia dos músicos e até um poster colorido. 

O Ginásio Paulo Sarasate foi o palco do inédito encontro. A repórter Ana Lúcia Machado descreveu com detalhes alguns dos incidentes ocorridos naquela noite.

Por volta das 22 horas, Cazuza cantava quando uma lata de cerveja passou voando perto dele.

"Preferiu ignorar o fato, e continuar cantando. Quando a segunda lata, jogada ninguém sabe de onde, atingiu em cheio a sua cabeça, ele perdeu um pouco da esportiva e, meio irritado, chegou perto do público e exigiu que a brincadeira parasse"conta a reportagem.

A resposta do público: mais três latas arremessadas contra o cantor. Fulo da vida, Cazuza gritou no microfone: "Quem for homem, joga agora".

"Mal teve tempo de fechar a boca. Mais de 30 latas cairam sobre ele que, não teve outra alternativa que recuar para o camarim, abandonando o palco, transformado num campo de batalha", descreveu Ana Lúcia Machado. 

Mesmo com a retirada da banda, parte da plateia continuou lançando latas e até garrafas no palco. A pobre bateria, abandonada, ficou totalmente destruída. "No camarim, assustados, os integrantes do Barão Vermelho só conseguiam fazer uma pergunta: 'Por que?'" 

A redenção de Cazuza 

Poucos meses desse episódio em Fortaleza, julho de 1985, Cazuza deu tchau ao Barão Vermelho e seguiu o sonho da carreira solo. Lançou os discos "Exagerado" (1985), "Só se For a Dois" (1987), "Ideologia" (1988), "Burguesia" (1989) e "Por Aí" (1991).

Poster colorido dos visitantes
Legenda: Poster colorido de quem chegava repleta de sucessos nas paradas
Foto: Diário do Nordeste 28/03/1985

Meteórico, estabeleceu de vez seu nome no panteão de artistas que atuaram na chamada "época da reabertura política". O retorno ao chão cearense tinha como palco a extinta "Boite Hippopotamus".

"O Cazuza que vem a Fortaleza, à frente do paparicado e muito bem recebido show 'Ideologia', é um homem diferente. Mais maduro, menos exagerado — 'fui adolescente até os 29 anos' — e nada parecido com o roqueiro desbocado que saiu cuspindo cobras e lagartos em sua última apresentação por estas bandas", escreveu Odosvaldo Portugal Neiva ao Diário do Nordeste de 5 de novembro de 1988. 

A turnê do "poeta da geração exagerada" tinha direção assinada por Ney Matogrosso. O projeto viajou todo o Brasil e rendeu o disco ao vivo "O Tempo Não Para" (1989). Essa volta aos palcos do Ceará foi a última vez do cantor no Estado. Em 1990, Cazuza finalizou sua trajetória após uma corajosa luta pública contra o vírus HIV.