PP e União Brasil lançam federação e podem ver impasse no núcleo cearense em 2026
Juntos, partidos terão maior bancada no Congresso, maior número de prefeituras e maior parcela de recursos de campanha
Dirigentes nacionais do PP e do União Brasil oficializaram a “superfederação” na última terça-feira (29), em evento em Brasília, e os desafios em diretórios menores já começaram a aparecer. Até a aprovação do registro da “União Progressista” pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), serão meses de discussões para definir quem vai presidir o novo arranjo no Ceará e como este se comportará nas eleições de 2026.
O União Brasil espera prioridade na escolha da liderança, já que acomoda quatro dos cinco parlamentares da federação na bancada cearense.
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“A decisão no Ceará cabe ao União Brasil. O processo será iniciado hoje (terça-feira) e deve levar alguns meses até termos as convenções nacionais do União e do PP. Esse processo será concluído no segundo semestre. Até lá, vamos dialogar para que alcancemos uma decisão unânime”, pontuou Capitão Wagner, presidente estadual do partido.
O presidente PP Ceará, AJ Albuquerque, por sua vez, preferiu não dar detalhes sobre as pretensões do partido. “Vamos fazer uma reunião com os deputados federais para alinharmos o fortalecimento da nossa chapa. Devemos marcar a data após o evento de hoje (terça)”, afirmou.
De antemão, o impacto recai sobre o Legislativo, onde devem começar a se portar como uma só agremiação após liberação do TSE.
Na Câmara dos Deputados, a federação contará com a maior bancada, composta por 109 parlamentares. Entre eles, os cearenses AJ Albuquerque (PP), Danilo Forte (União), Dayany Bittencourt (União), Fernanda Pessoa (União) e Moses Rodrigues (União).
Na Assembleia Legislativa, entre titulares e suplentes, há Felipe Mota (União), Heitor Ferrer (União), João Jaime (PP), Leonardo Pinheiro (PP), Sargento Reginauro (União) e Almir Bié (PP). Já nas câmaras municipais pelo Estado, foram eleitos 109 vereadores do União Brasil e 149 do PP.
Os dois grupos também passarão a governar o maior número de municípios brasileiros, com mais de 1 mil prefeituras – 18 delas no Ceará, incluindo importantes colégios eleitorais, como Maracanaú e Sobral.
Mas os desafios não se limitam a esse primeiro momento, já que as eleições de 2026 vão demandar jogo de cintura de ambas as legendas para definir suas posições no pleito. Isso porque o PP integra a base do governador Elmano de Freitas (PT), que deve tentar reeleição e emplacar aliados no Senado.
Apesar de comportar nomes com boa relação com os governos petistas, o União Brasil também quer participar das disputas majoritárias no Ceará, mas, sob Wagner, na oposição.
Toda essa discussão passa também por processos burocráticos, que envolvem a construção de um programa, com seus objetivos políticos, e de um estatuto comum entre os partidos, requisitos para a aprovação do registro no TSE. O último documento abordará, entre outros pontos, normas para a escolha de seus candidatos nas eleições e os critérios de distribuição dos valores bilionários dos recursos financeiros nas três instâncias da agremiação.
Com um aporte total de R$ 954 milhões do Fundo Eleitoral em 2024 e com uma previsão de R$ 70 milhões de Fundo Partidário em 2025, naturalmente essas cifras serão colocadas à mesa na disputa pelo comando da federação. As tratativas já começaram.
O que são federações partidárias?
O modelo de federação partidária é fruto da reforma eleitoral de 2021 e está em vigência desde as eleições do ano seguinte. Em síntese, as regras que regem os partidos políticos no Brasil também valem para as federações, como as de arrecadação e aplicação de recursos em campanhas eleitorais, de contagem de votos, de prestação de contas etc.
Uma vez formalizado, o arranjo vale para todos os órgãos daquelas legendas em todo o País, que devem atuar de forma unificada por, no mínimo, quatro anos.
Segundo resolução do TSE de 2021, poderá participar do pleito a federação que, até seis meses antes da data da eleição, tenha registrado seu estatuto no tribunal e conte, em sua composição, com ao menos um partido político que tenha, até a data da convenção, órgão de direção definitivo ou provisório na circunscrição da disputa.
O registro desse documento e do programa da federação, além da obrigatoriedade de união por quatro anos, busca garantir convergência ideológica na composição. No caso do PP e do União Brasil, apesar da afinidade programática, há conflitos locais que dificultam a visualização prática de como seria esse arranjo nos estados e municípios, sobretudo com partidos com presenças tão marcantes no cenário político.
‘Não muda nada’
Da parte do PP local, não deve haver rompimento com o governo petista no Ceará, conforme afirmou ao colunista Inácio Aguiar o vice-presidente da legenda no Estado e secretário das Cidades, Zezinho Albuquerque. “Não muda nada”, disse.
O pai de AJ, que também tem bom fluxo com o Abolição, ainda afastou articulações precipitadas. “Isso será discutido em 2026. Agora, o apoio ao governador Elmano continua firme”, disse.
Efeito em cascata
Ainda que tenha minimizado fissuras nesse momento, a declaração de Zezinho representa um descompasso com o que tem indicado a direção nacional sobre o PT. Chefe do PP e senador da República, Ciro Nogueira (PP-PI) garantiu à revista Veja que não estará com Lula (PT) em 2026 e sinalizou que, até lá, deve entregar cargos na Administração Federal.
“Eu não tenho dúvida que isso vai acontecer. Não é uma discussão que aconteceu na federação, espero que ocorra logo assim que concluirmos o processo de se consolidar. Eu vou defender que nós reunamos a federação para tomar uma decisão, porque todo viés que colocamos no nosso discurso político, no nosso manifesto, é completamente diferente do que pensa o presidente Lula, do que pensa esse governo atrasado”, pontuou.
Atualmente, o PP tem o Ministério dos Esportes, com André Fufuca, e a Caixa Econômica Federal (CEF), com Carlos Antônio Vieira Fernandes, além de outros cargos do segundo e do terceiro escalão do governo.
“O Brasil foi feito de grandes ciclos políticos. O ciclo do PDS no passado, depois veio o ciclo do MDB, depois o ciclo do PSDB com Fernando Henrique. E eu acho que agora está se encerrando o ciclo do PT, com o presidente Lula. E nas eleições passadas de 2024, o Brasil mandou um grande recado de apoio ao centro no nosso país”, declarou, ainda, em entrevista ao portal Metrópoles.
Essa divergência entre a direção nacional e estadual do PP não causou grandes problemas em anos anteriores – Ciro apoiou Jair Bolsonaro (PL) nas eleições ao Planalto, assim como AJ –, mas com a oficialização de uma federação, a dinâmica muda. As siglas, por exemplo, não podem firmar coligações com outras sem o aval da agremiação federada.
Pela força desse tipo de associação, dirigentes locais devem alinhar a estratégia ao que pensam Antônio de Rueda, chefe nacional do União Brasil, e Ciro Nogueira, que vão presidir a federação juntos até o fim do ano. Em dezembro, será realizada eleição.
Vale lembrar que o União Brasil é resultado da fusão, em 2022, entre o DEM e o PSL (partido ao qual o ex-presidente Jair Bolsonaro era filiado antes de ir ao PL). Rueda é, então, um representante da ala bolsonarista da extinta sigla. Apesar disso, mantém acenos ao Governo Lula, onde ocupa três ministérios.
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A legenda ainda manteve seus assentos na reforma ministerial promovida pelo Planalto recentemente, tendo, inclusive, sido beneficiada pela boa vontade do governo, em meio ao impasse envolvendo o Ministério das Comunicações.
Após o pedido de demissão de Juscelino Filho, o deputado federal Pedro Lucas (MA) chegou a ser anunciado como seu substituto, mas declinou. O engenheiro Frederico de Siqueira Filho, então, assumiu o posto no fim de abril. Diante do mal-estar causado, Rueda disse que Lula foi “muito elegante” ao aceitar a nova indicação do partido.
Já o atual vice-presidente da sigla, ACM Neto, ex-prefeito de Salvador (BA), não mantém tanta cortesia, e elogiou Bolsonaro durante o evento de lançamento da federação.
“Bolsonaro é um personagem político com um tamanho e densidade eleitoral inegável no campo da direita. Ninguém pode querer construir um projeto de enfrentamento ao PT sério, competitivo e vitorioso sem considerar isso. Tem que considerar o peso e o tamanho de Bolsonaro, é preciso dialogar”, disse.
Além disso, já existe no União Brasil um pré-candidato ao Planalto. Trata-se do governador de Goiás, Ronaldo Caiado. “Hoje nessa federação dos dois grandes partidos, que transferem a todos nós a responsabilidade sobre nossos ombros de sabermos ganhar o processo eleitoral de 2026”, declarou Caiado na ocasião.
Observa-se, então, um enorme esforço para equilibrar pratos nesse contexto, considerando as diferentes alas do União Brasil, os esforços do Planalto e do partido para manter aliança, os acenos de correligionários à oposição e os conflitos locais, estes comuns ao PP.