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O que está em jogo na busca de partidos por prefeitos no Ceará

Ao longo do mês de maio, pelo menos oito mandatários trocaram de partido no Ceará já de olho nas eleições do próximo ano

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Republicanos e PT foram os partidos que receberam mais filiações ao longo do último mês
Legenda: Republicanos e PT foram os partidos que receberam mais filiações ao longo do último mês
Foto: Fabiane de Paula

O ano nem é eleitoral, mas as movimentações políticas ao longo dos últimos meses já antecipam a definição de forças para o pleito municipal que só irá ocorrer em outubro do próximo ano. A bola da vez está com os prefeitos, que já fazem cálculos para as disputas locais ao mesmo tempo em que são cortejados por lideranças políticas em busca de reforçar os partidos.

Ao longo do mês de maio, oito desses mandatários deixaram suas siglas e se filiaram a outras legendas. Dirigentes partidários reconhecem que há muitas conversas em curso e sinalizam para um novo equilíbrio de forças no Estado. 

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A mesma avaliação é feita por analistas políticos que destacam a influência do ministro da Educação, Camilo Santana (PT) e do governador Elmano de Freitas (PT) sobre os gestores municipais. Paralelo a isso, o PDT, maior partido em número de prefeituras, enfrenta a maior crise interna no Ceará enquanto mira em manter o posto ou pelo menos “reduzir danos”. 

“Penso nas eleições municipais como uma antessala para a disputa estadual, porque é ali que você vê essa movimentação, é onde se começa a ver quem tem relevância em determinada região para atrair lideranças e consolidar uma base”
Monalisa Torres
Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece)

Essa análise também é reforçada pelo cientista político Cleyton Monte, professor universitário e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

“O prefeito, no geral, é a maior expressão política de um município, e quanto mais forte, maior e mais economicamente destacado for o município, mais importante é aquele prefeito”, aponta

“Então os partidos querem ampliar o número de prefeitos para que tenham um mapa político favorável para a eleição seguinte, justamente porque, tendo o prefeito, você tem a possibilidade de montar uma base. Um prefeito bem avaliado geralmente tem apoio da maioria da Câmara Municipal, então aquele partido do prefeito passa a ser também um partido de vários vereadores"
Cleyton Monte
Cientista político, professor universitário e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Mudanças partidárias

É de olho nessas bases que, ao longo do mês de maio, oito mudanças partidárias já foram feitas. O principal destino dos prefeitos foi o Republicanos, sigla que deu uma guinada à esquerda com a filiação do ex-senador Chiquinho Feitosa, atual presidente da legenda no Estado e um aliado de primeira ordem de Camilo Santana.

Desembarcaram no Republicanos os agora ex-emedebistas Júnior do Titico, de Ipueiras; Orlando Filho, de Mombaça, e Telvânia Braz, de Paramoti. Soma-se ao trio de recém-filiados Dra. Lígia Protásio, eleita pelo PP e prefeita interina de Santa Quitéria. Quem também chegou ao Republicanos foi a prefeita Rozário Ximenes, eleita pelo DEM em Canindé.

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Segundo maior partido do Ceará em número de prefeituras, o PT recebeu os mandatários Flávio Teixeira Filho, eleito pelo PTB e atual chefe do Executivo de Amontada, e Tiago Ribeiro, ex-Cidadania e prefeito de Cascavel.

A troca feita por Bismarck Maia, prefeito de Aracati que deixou o PDT pelo Podemos, completa a lista de mudanças recentes. Além da filiação, ele assumiu a liderança da sigla e levou o partido para a base governista. Essas trocas partidárias entre aliados do grupo governista indicam uma tentativa de capilarizar a influência em outras legendas, ampliando ainda mais o arco de aliança.

Conforme destaca Monalisa Torres, historicamente, os grupos políticos mais longevos no Ceará sempre se sustentaram com amplo apoio nos municípios. “Porque é de onde saem os votos que vão eleger e reeleger a base parlamentar, é do município que saem os votos que vão eleger o próprio governador”, afirma.

Ao mesmo tempo, aponta a professora, os prefeitos tendem a um “situacionismo”. "O município também precisa dessa aproximação, principalmente esses mais dependentes de transferências estaduais, é muito difícil ser oposição”, diz.

Cortejando prefeitos

Oficialmente, no entanto, isso não é confirmado pelos dirigentes partidários, que mantêm tom cauteloso. Exemplo disso está no PT, em que Antônio Filho, o Conin, presidente da sigla no Ceará, diz que “assunto de eleição só em 2024”.

“O fortalecimento do PT e dos partidos da base aliada vai ser resultado do trabalho, que precisa ser muito intenso até a gente começar a falar em eleição”, pondera. O petista, contudo, admite que prefeitos têm buscado o PT. “Estamos conversando, mas esse não é o foco no momento”, afirma, mesmo com a ascensão da sigla.

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Desde o ano passado, o Partido dos Trabalhadores deu um salto no número de prefeitos filiados. Ainda em 2022, em meio ao impasse de quem seria o candidato governista para comandar o Estado, a sigla ganhou 12 novos mandatários que, insatisfeitos, se desfiliaram de siglas como PDT, PSB, PCdoB, Psol e Republicanos.

Além das trocas partidárias, os dirigentes partidários têm à disposição mais de dez prefeitos atualmente sem partido políticos. São mandatários que, em sua maioria, deixaram siglas como PDT e PSD em meio ao impasse sobre as eleições de 2022. 

Professora de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor) e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Mariana Dionísio chama atenção justamente para esses nomes, que podem garantir bases estratégicas para um partido. 

“Há dois nomes que se aproximaram recentemente do PT e que estão sob o radar do partido: Professor Marcelão, de São Gonçalo, que já fez até campanha para o Capitão Wagner, e Vitor Valim, prefeito de Caucaia, conhecidamente empático à extrema direita. Eles estão tentando aproveitar esse movimento à esquerda no Ceará e já sinalizaram uma reviravolta partidária no mínimo interessante se filiando ao PT”
Mariana Dionísio
Professora de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor) e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

Lideranças estratégicas

Nesta lista estão ainda outros gestores de municípios estratégicos, como Nezinho Farias, de Horizonte; Dr. Guilherme, de Barbalha; e Júnior Castro, de Chorozinho, todos sob liderança do ministro Camilo Santana.

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“O partido do governador é o partido que tem maior poder de atração, que é o caso neste momento do PT, partido do governador, do ministro da Educação e do presidente da República, diferente do PDT, por exemplo, que está dividido, não tem uma máquina expressiva, além de Fortaleza, não tem renome, não tem uma bancada expressiva, não tem recursos destacados e as suas lideranças estão divididas, então esse movimento tende a favorecer ao PT e aos seus partidos”, aponta Cleyton Monte.

“Agora, tem isso também, muitas vezes pode fazer parte de uma estratégia do governador fortalecer os partidos aliados, não apenas o seu próprio partido”, acrescenta o cientista político.

Perdas e ganhos

Mesmo com o cenário atrativo para que prefeitos se filiem ao PT, outras lideranças partidárias governistas têm se mostrado otimista com o cenário. Em entrevista ao Diário do Nordeste no mês passado, Cid Gomes foi questionado sobre a perda de quadros do PDT para outras siglas, mas ele minimizou a evasão. “É natural que os partidos queiram ampliar seus filiados”, disse apenas.

No caso do Podemos, o próprio senador atuou para que Bismarck Maia deixasse o PDT e passasse a comandar a sigla até então oposicionista como estratégia de agregar mais uma legenda.

Entre outros nomes governistas, a expectativa é intensificar as filiações. Comandante do Republicanos, Chiquinho Feitosa disse que, sob as bênçãos de Camilo Santana, mais de 20 prefeitos devem desembarcar na sigla. 

“Estamos aqui hoje no primeiro momento de filiação, filiando (em articulação) mais de 20 prefeitos no Republicanos, lideranças e vice-prefeitos, tudo alinhado com Camilo e com o Elmano, porque nós fazemos parte desse Governo, desse projeto”
Chiquinho Feitosa
Ex-senador e presidente do Republicanos-Ceará

Presidente do MDB, o deputado federal Eunício Oliveira seguiu a mesma linha em entrevista ao Diário do Nordeste nesta semana.

“Não se preocupem que o MDB vai ficar muito maior do que o MDB é hoje, mas nós não vamos para essa disputa de prefeito A e prefeito B. Eu tenho sido muito procurado por prefeitos, inclusive, temos quatro vindo para o MDB”
Eunício Oliveira
Deputado federal e presidente do MDB-CE

Outra liderança governista, Zezinho Albuquerque (PP), secretário das Cidades do Ceará e pai do deputado federal AJ Albuquerque, presidente do PP Ceará, disse que a sigla planeja ampliar seus quadros para chegar ao pleito do próximo ano fortalecida. 

“Estamos de braços abertos para receber outros filiados que entendem que o PP é o partido para que eles possam crescer e trabalhar em prol do desenvolvimento do seu município ou do Estado”, ressaltou.

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