Confira 5 destaques do depoimento de Walter Delgatti da CPMI do 8 de janeiro
Delgatti mencionou a participação direta do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e da deputada Carla Zambelli (PL-SP), entre outras figuras, em esquemas golpistas
O hacker Walter Delgatti Neto relatou, nesta quinta-feira (17), uma série de episódios e personagens que teriam tentado descredibilizar o processo eleitoral e alterar o resultado do pleito do ano passado. O depoimento foi cedido à CPMI do 8 de janeiro.
Na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, Delgatti mencionou a participação direta do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e da deputada Carla Zambelli (PL-SP), entre outras figuras, em esquemas golpistas que antecederam os atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
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Conhecido como "Hacker da Vaza Jato" – referência ao vazamento de conversas entre membros da operação que prendeu o presidente Lula (PT) e outros – Delgatti teria sido convocado por bolsonaristas para atividades ilegais relacionadas às eleições de 2022.
Ele também relatou a participação do Exército Brasileiro nos episódios e entrou em um embate com o ex-juiz da Lava Jato e atual senador Sergio Moro (União-PR).
Grampo contra Moraes
Delgatti revelou que foi contatado por Zambelli a mando de Bolsonaro para que assumisse a autoria de um grampo ilegal contra Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-presidente teria garantido ao hacker que ele não seria preso por isso.
A conversa teria ocorrido via telefonema em 2022, antes do primeiro turno das eleições, com a intenção de minar a confiança da população no processo eleitoral.
Segundo Delgatti, ele foi informado que o grampo já havia sido realizado e que teria conversas comprometedoras do ministro.
“Ele (Bolsonaro) disse no telefonema que esse grampo fora realizado por agentes de outro país. Não sei se é verdade, se realmente aconteceu o grampo porque não tive acesso a ele”, afirmou.
“Ele disse que, em troca, eu teria o prometido indulto. E ele ainda disse assim: ‘Fique tranquilo. Caso algum juiz te prender, eu mando prender o juiz’. E deu risada. Eu concordei porque era uma proposta do presidente da República. Por medo, retornando à minha residência, entrei em contato com jornalista da Veja e contei isso a ele”, completou.
Em fevereiro deste ano, a Veja publicou o esquema relatado pelo hacker na CPMI. Antes disso, em agosto do ano passado, a revista revelou a visita de Delgatti ao Palácio da Alvorada, em agenda extraoficial do ex-presidente.
Envolvimento da Defesa
Ainda segundo Delgatti, em 10 de agosto, Zambelli e Bolsonaro o receberam para um café da manhã no Palácio da Alvorada, a fim de discutir a instalação de um “código malicioso” em uma urna eletrônica.
Também participaram da reunião o então ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, e o coronel do Exército Marcelo Câmara. Antes disso, o ex-presidente já teria se reunido com o presidente nacional do PL, Waldemar da Costa Neto, e o marqueteiro Duda Lima, responsável pela campanha à reeleição, para tratar do tema.
Na ocasião, Bolsonaro também teria sugerido que Delgatti auxiliasse técnicos do Ministério da Defesa a apontar fragilidades das urnas eletrônicas ao TSE.
À época, o tribunal autorizou uma inspeção dos códigos-fonte da urna por parte do Exército, que passou a ter acesso aos códigos-fontes dos programas de computador que são embarcados na máquina de votação.
“Ele (Bolsonaro) disse que eu estaria salvando o Brasil. Era a liberdade do povo em risco. Eu precisava ajudar ele a garantir a lisura das eleições”, apontou Delgatti.
Ele explicou que a conversa evoluiu até chegar à parte técnica, que Bolsonaro disse não entender e, por isso, seria necessário enviá-lo ao Ministério da Defesa. “Lá com os técnicos você explica tudo isso”, teria dito o ex-presidente.
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“Ele chama o coronel Marcelo Câmara e fala: ‘Eu preciso que você leve ele até o Ministério da Defesa’. O coronel contrariou: ‘Não, mas lá é complicado’. E o Bolsonaro disse: ‘Não, isso é uma ordem minha. Cumpra’. Eu fui levado até o Ministério da Defesa pela porta dos fundos”, relatou.
A visita à Defesa teria ocorrido outras quatro vezes, inclusive com a receptividade do então chefe da pasta, o general Paulo Sérgio Nogueira. O hacker teria orientado a elaboração do relatório entregue ao TSE antes do primeiro turno, apontando supostas vulnerabilidades das urnas eletrônicas.
“O código-fonte ficava apenas no TSE, e apenas servidores do Ministério da Defesa teriam acesso. Então, eles iam até o TSE e me passavam o que viam. Tudo o que passei a eles consta no relatório que foi entregue ao TSE. Posso dizer hoje que, de forma integral, aquele relatório tem exatamente o que eu disse. Não tem nada menos e nada mais. Eu apenas não digitei. Mas fui eu que fiz ele porque tudo o que consta nele foi orientado por mim”, completou.
Embate com Moro
Sendo um dos pivôs da suspeição de Moro como juiz, à época da Operação Lava Jato, naturalmente Delgatti entrou em conflito com o agora senador na sessão.
Em certo momento, Moro disse o depoente era condenado por estelionato, ao que o hacker respondeu que foi “vítima de perseguição” naquela ocasião, que teria ocorrido em Araraquara (SP).
"Inclusive, equiparada à perseguição que vossa excelência fez com o presidente Lula e integrantes do PT. E ressaltando que eu li as conversas de vossa excelência, li a parte privada e posso dizer que o senhor é um criminoso contumaz, cometeu diversas irregularidades e crimes", retrucou.
Moro, então, pediu ao senador Cid Gomes (PDT), que presidia a sessão no momento, para que advertisse o hacker. "Peço escusas", ponderou Delgatti.
E o ex-juiz respondeu: "Bandido aqui, desculpe senhor Walter, que foi preso é o senhor. O senhor foi condenado. O senhor é inocente como o presidente Lula, então?".
"O senhor não foi preso porque recorreu à prerrogativa de foro por função", respondeu o hacker.
Falso mandado contra Moraes
Além do telefonema sobre o grampo de Moraes, Walter Delgatti revelou que Zambelli lhe pediu para invadir as redes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para inserir um mandado de prisão falso contra o ministro do Supremo.
“A deputada me disse que eu precisava invadir algum sistema de Justiça ou do TSE em si. Alguma invasão que mostrasse a fragilidade do sistema de Justiça. Dizendo que seria uma ordem também do presidente (Bolsonaro). Porém, apenas a deputada me disse isso, não ouvi isso do presidente”, afirmou.
“Fiz a invasão do CNJ e de todos os tribunais do país. Tive acesso a todos os processos, a todas as senhas de todos os juízes e servidores e fiquei por quatro meses na intranet da Justiça brasileira”, completou. É por esse motivo, inclusive, que ele está preso desde o início do mês em São Paulo.
Atividade de campanha
Delgatti também revelou que Zambelli teria prometido a ele um emprego na campanha de Bolsonaro à reeleição, mas a proposta empacou. À época, ele estava desempregado e proibido de acessar a internet por ser investigado pela Operação Spoofing, da Polícia Federal.
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"Ela [Zambelli] disse que havia uma oportunidade de emprego para mim, no caso, seria na campanha do Jair Bolsonaro, do ex-presidente", declarou, explicando, ainda, que os dois se encontraram por acaso e trocaram contatos antes da oferta.
Como a participação direta na campanha não vingou, ficou sob sua responsabilidade o gerenciamento das redes sociais da deputada federal, cuja campanha à reeleição foi vitoriosa.
Contudo, posteriormente, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu o acesso dela às páginas na internet.
Antes disso, o hacker ainda chegou a receber R$ 3 mil. O valor aumentou após conversas com Costa Neto, Duda Lima e o próprio Bolsonaro, chegando a R$ 40 mil.