Legislativo Judiciário Executivo

Como o Legislativo e o Executivo têm atuado para combater a violência política de gênero?

Iniciativas a nível federal e estadual tentam oferecer proteção e suporte às mulheres que estão na política

Escrito por Luana Barros , luana.barros@svm.com.br
Frente Parlamentar de Combate à Violência Política de Gênero
Legenda: A Frente Parlamentar de Combate à Violência Política de Gênero foi instalada nesta segunda-feira (21) na Assembleia Legislativa do Ceará
Foto: Alece

A cada 30 dias, sete casos de violência política de gênero são registrados no Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça. Com apenas dois anos desde que esta categoria de violência foi tipificada como crime, os dados ainda são considerados subnotificados — em uma realidade em que, se a chegada das mulheres aos cargos eletivos é difícil, o exercício do mandato também é permeado por violências. 

Agora, faltando pouco mais de um ano para as próximas eleições municipais, medidas são adotadas tanto no âmbito do Executivo como do Legislativo para a proteção, mas também suporte de mulheres que são alvos de ataques por exercerem liderança política. As iniciativas vão desde a abertura de mais canais de denúncias até a estruturação de mecanismos para monitoramento de casos.

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Na Assembleia Legislativa do Ceará, por exemplo, a Frente Parlamentar de Combate a Violência Política de Gênero foi instalada nessa segunda-feira (21), com a presença da titular do Ministério das Mulheres, Cida Gonçalves

A deputada Larissa Gaspar (PT) foi a autora do requerimento para a criação do grupo — apoiado por 19 colegas do Legislativo, incluindo toda a bancada feminina na Casa. A meta, explica a parlamentar, é evitar a "naturalização" da violência sofrida por mulheres na política. 

"Ajudar essas mulheres, parlamentares e candidatas, a buscar seus direitos. Uma vez, a violência acontecendo, que a gente possa dar esse suporte para que elas, realmente, façam a notícia crime e não deixe essa violência se tornar invisível e dessa forma naturalizada. Para a gente evitar a naturalização da violência política contra a mulher, precisa que a gente conheça os instrumentos legais que estão à disposição da proteção da atuação política das mulheres e que a gente possa realmente de fato dar esse suporte".

Monitoramento de casos

Presidente da Frente Parlamentar, Larissa Gaspar foi vítima, em março deste ano, de ataques proferidos por um vereador da cidade de Russas. As deputadas Jô Farias e Juliana Lucena, ambas do PT, também foram alvo das ofensas ditas pelo parlamentar durante discurso na tribuna da Câmara de Vereadores do município. 

Com denúncia apresentada pelo Ministério Público Eleitoral, o parlamentar foi o primeiro condenado por violência política de gênero no Ceará. A condenação foi destacada por Gaspar durante a instalação da Frente Parlamentar, que ressaltou a importância de mostrar a outras mulheres que elas não estão só e que é possível denunciar os ataques sofridos. 

Um dos eixos de atuação da Frente Parlamentar será a conscientização quanto às legislações e políticas públicas de enfrentamento à violência, inclusive com a disponibilidade de construção de momentos formativos nos municípios, a partir da articulação com vereadoras ou gestoras municipais das cidades cearenses. 

"Para que a gente fale sobre isso, não deixe que isso seja um sofrimento sozinho daquela mulher e que faça com que ela desacredite da política, faça com que ela não queira mais participar desses espaços", disse. 

Além desse trabalho de conscientização e de suporte a mulheres, o grupo instalado no legislativo cearense deve trabalhar em mecanismos de monitoramento de casos de violência política contra mulheres no estado. 

Orientação para os legislativos estaduais

Iniciativa inédita em Assembleias Legislativas, a instalação da Frente Parlamentar contou com a presença da ministra das Mulheres do Governo Lula (PT), Cida Gonçalves. Para a ministra, a criação do colegiado é "fundamental e estratégica". "São espaços (como a Frente) em que de fato podem mostrar para as mulheres que lugar de mulher é onde ela quiser", disse. 

A iniciativa no Ceará conversa, inclusive, com grupo de trabalho criado na pasta das Mulheres do Governo Federal, que tem como foco exatamente o enfrentamento a violência contra as mulheres na política institucional. Segundo Gonçalves, foi realizada uma escuta de mulheres que estão na vida pública, como vereadoras e deputadas estaduais. 

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"Das parlamentares, e das que eu tenho ouvido nos estados, a maioria delas tem dito o seguinte: 'Ministra, eu não quero continuar no mandato agora. Agora. Imagina ser candidata'. Não tem um apoio, não tem uma solidariedade e 'apanham' sozinhas na Câmara de Vereadores e na internet", exemplifica. 

Com a finalização da fase de escuta, agora deve ser iniciada, pelo GT do Ministério das Mulheres, a elaboração de relatório. "Vendo de que forma é que nós vamos conseguir pensar a estratégia e quais são as recomendações que o grupo de trabalho vai encaminhar para as Assembleias Legislativas e pros governos do estado", detalha.

Cida Gonçalves acrescentou que ainda não há um prazo para quando essas recomendações serão enviadas. Enquanto isso, acrescentou a ministra durante o discurso, o foco deve continuar a ser aquilo que ela chamou de "raiz do problema" da violência política de gênero: "o ódio contra as mulheres". 

"Nós não podemos aceitar isso caladas. Não podemos aceitar as candidaturas laranjas, não podemos aceitar que o partido não tenha o mínimo de 30% de candidatas reais. E nós precisamos dizer que nós mulheres... Dizer que, primeiro, nós não queremos morrer. Segundo, nós não queremos nos calar e terceiro, nós não queremos voltar para a cozinha, para o fogão". 
Cida Gonçalves
Ministra das Mulheres

Articulação no Congresso Nacional

Presente na solenidade na Assembleia Legislativa, a senadora Augusta Brito (PT) conta que já apresentou proposta de criação de uma Frente Parlamentar com o mesmo tema no Senado Federal, mas admite que, no legislativo federal, a apreciação do pedido está sendo "um pouco mais demorado". 

Ela cita ainda a articulação para ocupar a presidência da Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra a Mulher — colegiado que reúne tanto deputados como senadores. Ela lembra que, na legislatura anterior, a relatoria era da deputada federal Luizianne Lins (PT) e que existe, agora, uma intenção de manter a petista no mesmo cargo. 

A mobilização tanto a nível federal como estadual, acrescenta a senadora, deve ter impacto direto nas eleições municipais de 2024, inclusive com a perspectiva de estimular as mulheres a disputar um cargo eletivo como vereadora ou prefeita. 

"É para refletir, o que vai ser construído agora através da Frente e de tantas outras ações, nas eleições. Tanto fazendo com que as mulheres realmente e verdadeiramente tenham a possibilidade de serem candidatas. Candidatas, eu diria não laranja, candidatas ativas e tendo a expectativa realmente de ter mandato e depois disso tendo seus mandatos atuantes e ativos também, representando não só a sociedade como um todo, mas especialmente sobretudo as mulheres", ressalta.

Novo canal de denúncias

A vice-governadora Jade Romero (MDB) concorda que mobilizações como essas "encorajam as mulheres a colocarem seus nomes à disposição". Entretanto, acrescenta ela, que também é titular da Secretaria de Mulheres do Governo do Ceará, é necessário que haja um movimento dentro dos partidos. 

"A gente precisa também fortalecer a sensibilização dos partidos políticos, para que não sejam cumprimento dessas cotas só por cumprir, para que essa participação feminina aconteça de fato e de direito. (...) As mulheres não podem ser utilizadas como artifício de cumprimento dessas metas. O que a gente quer, na verdade, é a participação efetiva da vida pública, dentro dos partidos, dentro do governo, nas prefeituras, nas câmeras".
Jade Romero
Vice-governadora

O aumento dessa representatividade, acrescenta Romero, vem aliada a uma não normalização da violência sofrida pelas mulheres que alcançam cargos eletivos. Ela cita que a Frente Parlamentar instalada na Assembleia tem o "total apoio" do Governo do Ceará, mas que existe uma elaboração de políticas públicas no âmbito do Executivo estadual para o enfrentamento à violência política contra as mulheres. 

A Secretaria das Mulheres tem estudado, junto com a Controladoria Geral do Estado (CGE), a construção de uma Ouvidoria da Mulher dentro da gestão estadual. O foco será ser um suporte para as mulheres na busca por seus direitos — indo desde a consulta para saber se tem direito a ser atendida por políticas públicas do Estado até a possibilidade de denúncia por casos de violência. 

"E pode ter esse recorte, essa questão para receber denúncias de violência política de gênero. É importante que as mulheres possam compreender, que não atinge somente parlamentares, mas lideranças como um todo, a vida pública das mulheres e para que a gente possa combater e ampliar a nossa representatividade", disse. Romero disse que a Secretaria das Mulheres e a CGE estão "afinando alguns detalhes" para a criação da Ouvidoria, mas que ainda não há um prazo para o início do funcionamento.

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