Caciques políticos x outsiders: relembre as disputas pelo Senado no Ceará e veja os nomes cotados para 2026

Os mandatos de Cid Gomes e Eduardo Girão chegam ao fim no próximo ano. Base e oposição articula sucessores dos parlamentares

Escrito por
Igor Cavalcante igor.cavalcante@svm.com.br
Cid Gomes e Eduardo Girão encerram o mandato no próximo ano e prometem não disputar a reeleição
Legenda: Cid Gomes e Eduardo Girão encerram o mandato no próximo ano e planejam não disputar reeleição
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Se a disputa pelo Governo do Ceará, historicamente, concentra as atenções dos eleitores e políticos, no pleito do próximo ano, a corrida rumo ao Senado Federal promete dividir esse protagonismo. A mais de um ano do pleito, as duas vagas a serem abertas têm sido combustível para tentativas de lideranças da oposição de se unirem, ao mesmo tempo, a base governista avança de olho nesse espaço no Legislativo nacional e já soma quase uma dezena de nomes cotados para disputar a Câmara Alta do Congresso Nacional.

As cadeiras cearenses no Senado são ocupadas, tradicionalmente, por caciques políticos com longos currículos de atuação pública no Estado. De acordo com o cientista político Pedro Barbosa, que também é diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa, o pleito do próximo guarda particularidades que fazem as duas vagas serem tão concorridas.

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“Diferentemente de outras eleições, não há, até o momento, o que poderíamos chamar de candidaturas naturais ou incontestáveis, nem do lado governista nem do oposicionista. Cid Gomes (PSB), que seria um nome natural do lado governista, tem relutado a uma candidatura à reeleição, e Eduardo Girão (Novo), a preço de hoje, não está entre os nomes escolhidos por nenhum dos núcleos oposicionistas no estado”, aponta.

Em entrevistas recentes, Cid Gomes tem sido enfático ao afirmar que não pretende disputar a reeleição. Já Girão, desde que disputou o cargo em 2018, sempre prometeu que não concorreria à reeleição por ser contra esse mecanismo eleitoral.

“Se pensarmos na eleição de 2022, o fato de Camilo Santana ser candidato já resolveu as candidaturas tanto do lado governista quanto do oposicionista. O governismo o apoiou com unanimidade e na oposição não houve disputa pela candidatura, pois nenhuma das lideranças tinha desejo de concorrer contra ele”, acrescenta.

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Pedro ressalta também que dois terços do Senado estarão em disputa no próximo ano. “É natural que haja mais pessoas disputando”, pondera. Das 81 cadeiras da Casa, 54 estarão em jogo — duas em cada estado. Os eleitos terão mandato previsto até 2034.

“Como é uma das mais cobiçadas politicamente e, ao mesmo tempo, uma das mais restritas, o perfil dos candidatos competitivos tende a ser de políticos mais experientes e com mais capital político, pois precisam ter força para ser escolhidos candidatos por seus partidos e condições de ganhar uma eleição que se dá por voto majoritário, onde o candidato depende apenas de sua votação individual, diferentemente dos deputados que se elegem por voto proporcional quando, mesmo com votações menores, podem se beneficiar dos votos dados a outros candidatos do mesmo partido”
Pedro Barbosa
Cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa

Professora de graduação e pós-graduação em Direito da Unifor e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Mariana Dionísio de Andrade acrescenta ainda na lista de “vantagens” do Senado o mandato mais extenso, de oito anos, e o acesso a emendas parlamentares. “Ser senador ajuda a mediar interesses junto ao governo federal, o que é particularmente importante em um Estado com demandas de infraestrutura e desenvolvimento econômico, como no caso do Ceará”, pontua.

Disputa na base governista

Integrantes do grupo de aliados do governador Elmano de Freitas (PT) apontam pelo menos oito nomes cotados para disputar o Senado. Além de Cid Gomes, que disputaria uma reeleição, a lista inclui os deputados federais José Guimarães (PT), Eunício Oliveira (MDB), Júnior Mano (PSB) e Luizianne Lins (PT), o ex-senador Chiquinho Feitosa (Republicanos), o ex-vice-governador Domingos Filhos (PSD) e o chefe da Casa Civil, Chagas Vieira.

Na última segunda-feira (7), Luizianne foi lançada por aliados como pré-candidata. Na ocasião, ela disse que "ninguém pode fugir às tarefas que coletivamente estão colocadas". 

Atual detentor do cargo, Cid Gomes já disse reiteradas vezes que não pretende disputar a reeleição, contudo seu nome ainda aparece no horizonte de possibilidades do grupo governista. Desde o início deste ano, o político defende a candidatura Júnior Mano para o cargo. 

Durante participação na live do PontoPoder, na última quinta-feira (10), Guimarães fez a fala mais enfática até agora entre os possíveis candidatos. “O PT tendo uma vaga para o Senado no Ceará, esqueça, o nome é José Nobre Guimarães. Pode cobrar isso de mim”, disse. O parlamentar também revelou que Lula já “disse na frente do Elmano e do Camilo que o Guimarães é o senador do Ceará”.

“Quer sinal mais forte de que eu represento o projeto nacional? É claro, o Lula gosta muito do Eunício, então é uma grande possibilidade. Onde vou, todo mundo pergunta, essa é a dupla que vai disputar?”
José Guimarães (PT)
Líder do Governo Lula na Câmara dos Deputados

Já na oposição, o ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT) e o ex-deputado federal Capitão Wagner (União) têm promovido encontros com parlamentares estaduais e federais para tentar unificar as diferentes alas oposicionistas. Ex-adversários, eles se aproximaram no segundo turno das eleições municipais de 2024, quando apoiaram o então candidato André Fernandes (PL). O deputado do PL, no entanto, tem sido um desafio nesse plano de unificação, já que defende a candidatura do PL para todos os cargos.

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Do lado oposicionista, os discursos se alinham na defesa da cautela. Tanto Roberto Cláudio quanto Capitão Wagner afirmam publicamente o desejo de ter aliados disputando o Senado, mas defendem que antes haja uma unificação dos opositores. Até o momento, o único nome da direita citado foi o do deputado estadual Pastor Alcides (PL). No último dia 24 de março, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) citou o parlamentar como nome do bolsonarismo para a disputa ao Senado em 2026 pelo Ceará.

“É preciso esclarecer que uma vaga no Senado não só fortalece a influência em Brasília, mas também redistribui o poder localmente. Essa nova aliança que se formou entre PL, União Brasil e a ala mais conservadora do PDT reforça a mudança dos padrões de comportamento partidário no Ceará e evidencia a perda de fôlego da hegemonia de Ciro Gomes. Para essa composição, que há pouco tempo era improvável, ter uma vitória no Senado significaria a consolidação do grupo e um ganho considerável de visibilidade, o que tende a abrir portas para candidaturas ao governo do Estado e Presidência da República”
Mariana Dionísio de Andrade
Professora de graduação e pós-graduação em Direito da Unifor e doutora em Ciência Política pela UFPE

Pedro Barbosa acrescenta que, no caso da base governista, ampliar o número de cadeiras no Senado seria uma significativa “demonstração de força política e enfraquecimento do grupo adversário”.

“Especialmente para o governo, significaria um reforço na representação política em Brasília e, consequentemente, maior destinação de recursos para o estado. Para a oposição, e mais especificamente a oposição bolsonarista, a eleição para o senado nos estados foi elencada como a prioridade do grupo político a nível nacional, porque é lá onde se pautam e julgam processos contra os ministros do STF. Essa disputa com o STF e mais especificamente com o ministro Alexandre de Moraes está, hoje, no centro da atuação política do grupo político bolsonarista”, avalia.

Ampla vantagem

Conforme  o cientista político, o pleito para o Senado neste ano marca também uma disputa mais “aberta” entre os postulantes, diferentemente do que ocorreu em 2022. À época, o ex-governador Camilo Santana vivia um pico de popularidade e renunciou ao cargo no Executivo estadual para disputar uma cadeira no Senado. No pleito, ele contou com o apoio oficial de oito legendas e fez uma dobradinha com Elmano de Freitas e Lula.

Eduardo Girão, Camilo Santana e Cid Gomes no Senado Federal
Legenda: Eduardo Girão, Camilo Santana e Cid Gomes no Senado Federal
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

A candidatura do petista também ocorreu em meio ao fim da aliança estadual entre PT e PDT no Ceará, o que levou muitos pedetistas a apoiar informalmente o ex-governador. Além disso, o PSDB e o PDT, mergulhados em rachas internos, não conseguiram viabilizar candidaturas. PSTU e Psol também tiveram chapas consideradas inaptas pela Justiça Eleitoral.

No fim, Camilo foi eleito com 69,8% dos votos, o maior percentual desde a redemocratização. Aliada de Capitão Wagner (União), Kamila Cardoso (à época, no Avante) ficou em segundo lugar, com 26,2% dos votos. Em terceiro lugar, com apoio de parte do PDT, Érika Amorim totalizou 3,98% dos votos.

A vitória de um outsider

Por outro lado, quatro anos antes, o resultado das urnas surpreendeu muitos eleitores. Enquanto disputava a reeleição para o Governo do Ceará, Camilo Santana apoiou os nomes de Cid Gomes (à época, PDT) e Eunício Oliveira (MDB). O então pedetista conseguiu ser eleito com ampla margem de votos, chegando a 41,62% de apoio. 

Já Eunício tinha mais obstáculos, entre elas uma forte resistência de alguns nomes governistas em apoiá-lo. Quatro anos antes, o próprio emedebista tinha disputado o Governo do Ceará, sendo derrotado por Camilo. Dentro do PT, algumas alas também eram contra o nome de Eunício. O político ainda enfrentava uma crise de popularidade pela proximidade com o então presidente Michel Temer (MDB). Por outro lado, o então senador acumulava uma grande influência e trazia no currículo a experiência como presidente do Senado Federal. 

Girão, Mayra, Tasso e Wagner durante a campanha de 2018
Legenda: Girão, Mayra, Tasso e Wagner durante a campanha de 2018
Foto: JL Rosa

Contudo, com 16,93% dos votos, o político não conseguiu se reeleger. Em seu lugar, foi eleito um estreante. Na primeira vez em que disputou um cargo eletivo, o empresário Eduardo Girão (à época, Pros) foi eleito senador da República com 17% dos votos. Defensor de pautas conservadoras, o político ganhou projeção ao combater o aborto, criticar o STF e defender a redução da máquina pública.

No pleito, o político teve apoio de lideranças oposicionistas, como Capitão Wagner, que disputava o Governo do Ceará, e Tasso Jereissati (PSDB), que, à época, era senador. Os oposicionistas também lançaram Mayra Pinheiro como candidata ao cargo, mas ela ficou em quarto lugar, com 11,37% dos votos. 

Falando de forma simplificada, o fenômeno dos candidatos outsiders, como o atual senador Eduardo Girão, têm sido algo mais pontual. Em 2018, quando Bolsonaro foi eleito presidente, muitos governadores e senadores com esse perfil foram eleitos. Naquele momento, setores da sociedade não se sentiam representados pelos políticos, o que levou pessoas de fora a se candidatarem. Porém, alcançadas essas posições relevantes nos governos e parlamentos, o fenômeno perde força, visto que o objetivo foi alcançado e a atuação política agora se dá pelo lado "de dentro", perdendo-se a condição de outsider
Pedro Barbosa
Cientista político e diretor técnico do Instituto Opnus de Pesquisa

A derrota e o retorno de Tasso Jereissati ao Senado

Nas disputas para o Senado em 2010 e 2014, o desempenho do ex-governador Tasso Jereissati ganhou destaque nas duas ocasiões. Em 2010, o político viu seus antigos aliados, liderados pelo então governador Cid Gomes, apoiarem a campanha casada entre Eunício Oliveira (MDB) e José Pimentel (PT). A chapa era uma frente ampla que incluiu siglas como PSC e PSB, além de contar com apoio do então presidente Lula, que apoiou fortemente a reeleição de Cid Gomes.

Apesar da projeção nacional e do apoio do PSDB, à época em que a sigla fazia frente ao PT no País, Tasso Jereissati amargou sua primeira derrota em uma disputa eleitoral na carreira política. Ele obteve 23,7% dos votos, enquanto Pimentel chegou a 32,39% e Eunício totalizou 36,32%. Após o resultado das urnas, Tasso chegou a dizer que não iria mais disputar eleições e fez críticas ao grupo governista. Aquele resultado também marcou um enfraquecimento do PSDB no Ceará, com uma crescente perda de influência sobre prefeitos e nos parlamentos.

Campanha
Legenda: Campanha "casada" de Cid Gomes, Eunício Oliveira e José Pimentel em 2010
Foto: Queiroz Netto/Divulgação Campanha Cid Gomes

O tucano, no entanto, voltou a disputar eleições e a vaga escolhida foi de senador, em 2014. Coordenando no Nordeste a campanha de Aécio Neves à Presidência, o cearense se aliou a Eunício Oliveira — à época, oposicionista disputando o Governo do Ceará contra Camilo Santana — e fez uma dobradinha para o Senado.

Tasso também atuou na indicação do vice do emedebista, escolhendo Roberto Pessoa para a função. O tucano teve como principal adversário Mauro Filho, que acomodou aliados estaduais, como os irmãos Cid e Ciro Gomes, Camilo Santana, além da então candidata à presidência Dilma Rousseff (PT). Com as urnas abertas, Tasso somou 57,9% de apoio, derrotando Mauro Filho, que ficou com 39,3%. A vitória marcou o retorno o político ao cargo no Senado Federal, função que exerceu até 2022, quando decidiu não disputar a reeleição.

Disputa pelo Senado em 2006

Já em 2006, a disputa pela vaga cearense no Senado Federal reeditou o pleito de 2004 para a Prefeitura de Fortaleza. Dois políticos experientes, derrotados na disputa municipal para Luizianne Lins (PT), travaram uma corrida rumo ao Congresso. Inácio Arruda (PCdoB) contou com apoio de nomes de peso nacionalmente, entre eles o presidente Lula. O então candidato a governador Cid Gomes também fazia uma campanha casada com a de Inácio Arruda.

Já o adversário mais competitivo do comunista era Moroni Torgan (à época, PFL). Aproveitando a popularidade de disputar o segundo turno em Fortaleza dois anos antes, o político também contou com apoio do então governador, Lúcio Alcântara, e do então candidato a presidente Geraldo Alckmin. Contudo, Inácio se saiu melhor e foi eleito com 52,25% de apoio do eleitorado.

Primeiro mandato de Tasso e a primeira mulher senadora

Quatro anos antes, em 2002, a disputa pelas duas vagas terminou com a eleição de Tasso Jereissati e Patrícia Saboya. O tucano encerrava o mandato como governador e seguiu direto para a cadeira no Congresso Nacional. À época, o cearense chegou a ser pré-candidato à Presidência da República e detinha grande influência nacionalmente. 

Patrícia Saboya foi a primeira mulher eleita senadora pelo Ceará
Legenda: Patrícia Saboya foi a primeira mulher eleita senadora pelo Ceará
Foto: José Cruz/Senado Federal

O tucano foi eleito para o Senado com 31,52% dos votos. Patrícia Saboya travou uma disputa acirrada pelo primeiro lugar no pleito, chegando a 30,67% de apoio do eleitorado. Ela acumulava experiência como vereadora de Fortaleza e deputada estadual no Ceará. Ela também havia sido primeira-dama do Estado e da Capital durante as gestões do seu então marido, Ciro Gomes. Em 2002, Patrícia fez uma campanha alinhada ao político, que disputou a Presidência da República. Diferentemente de Ciro, Patrícia foi eleita, tornando-se a primeira mulher senadora do Estado.

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