Venda direta sem estoque: como o dropshipping faz a Cacau Show alcançar mais clientes

No modelo, o empreendedor age como um intermediador: anuncia o produto e vende, mesmo sem ter um estoque próprio

Escrito por Carolina Mesquita e Ingrid Coelho , negocios@svm.com.br
Legenda: Na Cacau Show, o revendedor se abastece do estoque das unidades franqueadas, o que é logisticamente mais interessante para a empresa e também confere praticidade às vendas
Foto: Ismael Soares

A maior rede de franquias de chocolates finos do mundo, a Cacau Show, nasceu depois do fundador, Alexandre Costa, ver a mãe vender chocolates por catálogo. Apesar de ter enveredado e tomado proporção através do modelo de franquia, a venda direta ainda faz parte significativa da empresa e responde por cerca de 7% do faturamento da companhia no Brasil – percentual que representa R$ 280 milhões dos R$ 4 bilhões arrecadados em 2022. 

Somente no Ceará, são 1.328 revendedores ativos da marca, segundo o gerente de venda direta da Cacau Show, Rubian Figueiredo. Ele detalha que os revendedores parceiros ganham 15% de comissão nas vendas e cada um deles são ligados a uma loja franqueada, normalmente a mais próxima da casa do revendedor. O modelo foi implementado em 2017, quando a área de venda direta foi reformulada. 

A ligação direta entre os revendedores e franqueados tem o objetivo de gerar benefícios nas duas frentes. Por um lado, o revendedor tem um local próximo onde pode adquirir os produtos e repassar aos clientes de forma mais rápida. Por outro, o franqueado tem um canal de vendas, além da própria loja e do e-commerce.

Legenda: Venda direta responde por 7% do faturamento da Cacau Show, de acordo com a marca
Foto: Ismael Soares

“A logística é a do franqueado, que compra os nossos produtos para atender aos mais diversos canais e ele quem atende a revendedora. A revendedora consome o estoque dele, nada é enviado centralmente aqui de São Paulo. Esse é um diferencial estratégico nosso: a gente usar o estoque do franqueado, isso nos dá capilaridade muito maior, porque conseguimos atender mais prontamente”, explica Figueiredo.

Revendedor multimarca

O gerente detalha que o perfil dos revendedores é composto majoritariamente por mulheres, mães, com idade entre 25 e 40 anos e utilizam a atividade para complementar a renda, vendendo os produtos para familiares, vizinhos e colegas de trabalho.

Outra característica é que elas costumam ser revendedoras de outras marcas também, fator que não é um problema para a Cacau Show. 

“O nosso modelo consome a revendedora multimarca, que é a mesma revendedora Natura, Avon, Mary Kay. A gente não busca exclusividade das revendedoras, a gente gosta inclusive que elas vendam outras marcas, porque a gente se aproveita desse momento de venda dela para o consumidor final”, pontua.

No catálogo de produtos, as trufas e tabletes se destacam nas vendas dos revendedores Cacau Show. Por ser um produto perecível, Rubian aponta que as vendedoras não costumam ter grandes estoques de itens em casa, mantendo apenas o suficiente para durar alguns dias.

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A falta de produtos para pronta-entrega não se apresenta como um problema que prejudique a consolidação da venda, já que a revendedora possui a loja física mais próxima para pegar o item desejado. 

Além disso, Figueiredo explica que o público atendido pelos revendedores são clientes que nem as lojas físicas, nem o e-commerce da marca conseguem alcançar: é a pessoa com um familiar ou vizinho que já é conhecido por trabalhar com esses produtos e, pelo relacionamento e facilidade, já recorre a esse revendedor quando precisa de algo. 

A venda direta pega uma jornada de varejo diferente da que a loja e o e-commerce pegam, que é aquela venda de relacionamento, aquela venda da mulher que vai no churrasco da família e vende. Por mais que a gente seja muito conhecido, mesmo que triplicássemos o número de lojas, não conseguiríamos pegar essa fatia do varejo que é tão importante no Brasil, que é o que o Alexandre viu lá atrás na mãe dele”.
Rubian Figueiredo
Gerente de Venda Direta da Cacau Show

Dropshipping aplicada à venda direta

O modelo de venda direta da Cacau Show, de ligar a revendedora diretamente a uma franqueada para que ela possa comprar o estoque dessa unidade para atender aos próprios clientes, é um claro exemplo de uma técnica de mercado conhecida como dropshipping.

Nela, o empreendedor age como um intermediador: anuncia o produto e vende, mesmo sem ter um estoque próprio, fazendo-se necessário recorrer ao estoque de um fornecedor. No caso da Cacau Show, seria a franqueada. 

O professor da Strong Business School, Ulysses Reis, pontua que o dropshipping, se for aplicado a um negócio online, acaba reproduzindo a essência do comércio eletrônico quando este surgiu na década de 1990. O especialista argumenta que, apesar de estar caindo na popularidade, o dropshipping sozinho pode acabar não oferecendo vantagens nem ao lojista, nem ao consumidor. 

A pessoa criava uma empresa, montava um site e fazia as vendas. A diferença era que, na época, uma parte do estoque que era comprado por esse varejista ficava na casa dele ou em um galpão. Posteriormente, eles perceberam que não valia a pena fazer esse tipo de logística, que era mais interessante não ter estoque e fazer só a intermediação. Ou seja, o varejista fazia a venda no site dos produtos de diversos fornecedores e arrumava empresas de logística para entregar na casa do cliente". 
Ulysses Reis
Professor da Strong Business School

Reis pontua que a lógica fazia sentido e funcionava para a época, mas que hoje pode refletir em prazos de entrega muito maiores do que os consumidores estão dispostos a esperar. Isso porque os grandes varejistas se valem dos dados dos clientes para traçar previsões de comportamento e antecipar as compras aos fornecedores. 

O acesso à tecnologia tão complexa ainda é um gargalo para os pequenos empreendedores, conforme o docente, de forma que estes acabam realizando os pedidos apenas quando a venda é realizada, sendo necessário esperar o tempo de produção do item pelo fornecedor, em alguns casos. 

A avaliação de Reis em relação ao dropshipping acaba tendo uma virada quando se fala da técnica aplicada à venda direta. Ele argumenta que a motivação que leva um consumidor a comprar de uma revendedora é a proximidade, o relacionamento, de forma que variáveis como o preço e o prazo de entrega assumem menor peso do que quando a compra acontece em grandes lojas. 

Legenda: No dropshipping, o empreendedor anuncia o produto e vende, mesmo sem ter um estoque próprio, fazendo-se necessário recorrer ao estoque de um fornecedor
Foto: Thiago Gadelha

Além disso, o especialista destaca que, no caso da venda direta, a parte logística acaba ficando para o próprio empreendedor, o que acarreta redução de custos e propicia o fortalecimento do relacionamento entre revendedor e cliente. 

“Cria relacionamento, que é uma coisa boa, porque o sacoleiro não só faz amizades como ensina o uso de produtos, principalmente itens de beleza, técnicos. Então, é um modelo interessante a fusão da venda direta com o dropshipping. No momento que a gente está vivendo de mercado, que é muito desafiador para o varejo, eu acredito que tenha espaço para esse tipo de operação, essa casada, porque grandes empresas varejistas estão com muita dificuldade de sobrevivência”, avalia. 

“Agora, quando a pessoa que você conhece vai vender para você, cria diferencial competitivo: amizade, relacionamento, informação. Então, o que está decidindo não é mais o preço ou prazo é a relação pessoal”, acrescenta Reis. 

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