Economia do CE sente efeitos da seca; futuro preocupa

A fruticultura está entre os mais impactados. Já para a indústria e o comércio, os efeitos da seca ainda são amenos

Escrito por Redação ,
Legenda: Considerado o 4º maior produtor de frutas do País, o Estado vem sofrendo com a falta de irrigação para as culturas que produz e os recursos hídricos disponíveis não têm suprido a demanda necessária para o setor
Foto: FOTO: SILVANA TARELHO

No momento em que a principal região produtora do País, o Sudeste, sofre com a escassez de água, acende a luz amarela de alerta na economia brasileira, diante da possibilidade real de aumento de preços e da inflação, em decorrência de um cenário antes vivido apenas nas regiões Nordeste, notadamente no semiárido, e nos serrados do Centro-Oeste. No Ceará, no que pese ações - ainda que tardias - que vêm sendo adotadas para minimizar mais três anos seguidos de seca, o quadro de estiagem continuada preocupa economistas e representantes dos três setores, uns menos, outros mais, tendo em vista os riscos que a falta d'água e a consequente alta nos preços da energia elétrica acometem cada um dos segmentos da agropecuária, da indústria e do comércio e serviços.

Fruticultura

Dentre os principais setores afetados pela seca que acomete o Ceará desde 2012, a fruticultura é um dos ramos em situação mais crítica. Considerado o 4º maior produtor de frutas do País, o Estado vem sofrendo com a falta de irrigação para as culturas que produz. De acordo com Flávio Saboya, presidente da Federação da Agricultura do Ceará (Feac), os recursos hídricos disponíveis não têm suprido a demanda necessária para o setor.

"A fruticultura é uma atividade empresarial da mais alta importância econômica e já está ameaçada com o corte de água. Posso destacar, por exemplo, o perímetro irrigado da região do Baixo-Acaraú, onde a irrigação tem se resumido a um ou dois dias por semana, o que não é suficiente. Isso pode ter reflexos irrecuperáveis em cima da cultura", alerta Saboya.

A suspensão no abastecimento de água para as atividades agrícolas já começam a surtir efeito em culturas importantes para a economia local, como afirma Flávio Saboya: "Já tivemos as águas do perímetro Curu-Paraipaba cortadas e todas as atividades de irrigação desenvolvidas com o uso dessas águas estão suspensas. Isso resulta na morte das culturas, principalmente das permanentes. Nessa região temos a maior produção de coco verde do Ceará e os produtores já estão caminhando para uma situação extremamente difícil".

Consumo animal

Um outro impasse sentido pelo setor agropecuário diz respeito à alimentação para o rebanho. "O que está acontecendo é que ainda temos uma pequena reserva de forragens para o gado restantes da quadra chuvosa irregular que tivemos no início do ano, em fevereiro e março. Isso está permitindo uma relativa manutenção dos rebanhos do Estado. Mas também vamos enfrentar problemas nos próximos meses, pois uma alternativa seria a produção de forragens nos vales irrigados do Acaraú e do Jaguaribe. Contudo, essa opção será inviabilizada, em função da prioridade de consumo humano", aponta Flávio Saboya.

Indústria

Se no campo, os produtores já estão sentindo fortemente os efeitos da seca, no setor industrial o abastecimento de água ainda não preocupa tanto as empresas, quanto o custo da energia elétrica. À exceção dos setores têxtil e da construção civil, os demais segmentos tradicionais no Estado, calçado e confecção, são pouco demandadores de água, o que minimiza o impacto da estiagem no chão de fábrica.

"No Ceará, temos poucos setores industriais dependentes de água, diretamente; bem menos que no nacional", avalia o economista do Instituto de Desenvolvimento Industrial (Indi), da Federação das Indústrias do Ceará (Fiec), Guilherme Muchalle. Segundo ele, o Indi ainda não dispõe de um levantamento mais apurado para avaliar o atual quadro de seca no Estado. "Se tivéssemos indústrias de alumínio e celulosa, aí o impacto seria muito forte", cita.

Opinião semelhante tem o presidente do Sindicato das Indústrias Têxteis do Ceará (Sinditêxtil), Germano Maia. Para ele, a exceção das empresas que fazem tingimentos de tecidos de algodão - que já não muitas -, a estiagem não tem afetado o setor, como o preço da energia elétrica. "No Ceará, estamos com um cenário (de abastecimento hídrico) melhor do que no Sudeste", avalia Maia.

"Desde abril, a Abit (associação Brasileira da Indústria Têxtil) vem alertando a Sabesp de que poderia faltar água em São Paulo, mas não foi ouvida", acrescentou o líder classista. "Já a energia elétrica, ou repassamos o custo ou ficamos no prejuízo", ressalta Maia.

Investimentos

Para Guilherme Muchalle, a escassez de água - que no Nordeste já não é novidade - deve começar a ser vista como uma oportunidade para as indústrias. De acordo com ele, sustentabilidade é o foco do mercado e as empresas que não buscarem se adaptar à nova realidade perderão espaço e tempo, àquelas que já começaram a introduzir no seu modelo produtivo, políticas inovadoras e mais sustentáveis, como a adoção de práticas de reúso de água, dessalinização e utilização de energia limpa.

Ele reconhece que isso significa despesas e novos custos, mas argumenta que deve ser encarado como investimento e diferencial produtivo. Para o economista, no momento, os impactos da falta de água para a indústria cearense são mais sociais do que na estrutura produtiva das empresas, mas em breve vai afetar diretamente na atração de novos investimentos para o Estado. "A própria história hídrica da região (Nordeste) já afeta a atração de indústrias mais demandadoras de água", ressalta.

Comércio

Em relação ao comércio, apesar da falta de dados específicos, o sentimento é de que a ausência das estações chuvosas ainda não surtiu grandes impactos para o setor. "Não temos nenhuma informação de imediato sobre o impacto da seca para o comércio da Capital. O que eu posso dizer é que os resultados para o varejo cearense têm sido positivos, inclusive, melhores que os índices nacionais", diz o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Fortaleza, Freitas Cordeiro.

Na opinião dele, as políticas públicas tiveram papel importante para que o comércio não tenha sentido com firmeza os prejuízos causados pela seca. "Pode ser que nos municípios que dependem diretamente desse fator tenham um impacto diferente. É possível que, se estivéssemos na quadra chuvosa, os resultados do comércio fossem outros. Mas reconhecemos que há um trabalho do Governo do Estado com a contenção das reservas hídricas, além de outras políticas governamentais que vêm amenizando os prejuízos com a seca", opina o presidente da CDL.

Falta de chuva ajuda companhias aéreas

São Paulo. Pelo menos um setor da economia esta lucrando com a estiagem prolongada que atinge várias regiões do Brasil: as companhias aéreas. Em setembro, a demanda doméstica subiu 3% sobre um ano antes, puxada pelas viagens de passeio, segundo informou a associação que representa o setor.

"O clima ajudou o turismo", resumiu o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, ao anunciar os números do setor sobre o mês passado. "Esta calor, o pessoal vai viajar", completou, apostando em um aumento na lotação dos voos domésticos ainda este ano.

Negócio spostergados

As viagens de turismo compensaram com sobras a queda na procura corporativa por bilhetes, o que a Abear atribuiu a uma combinação de menor atividade econômica e cenário eleitoral, o que tem feito decisões de negócios serem postergadas.

Em geral responsáveis por cerca de 60% da demanda, as viagens de negócios também garantem maior rentabilidade às empresas aéreas, já que o preço médio dos bilhetes é bem maior.

De todo modo, a maior atividade nas viagens de lazer ajudou as companhias aéreas a conseguirem maior planejamento das frotas, com o nível médio de ocupação dos voos subindo 1,3 ponto percentual sobre setembro de 2013, para 78,67 por cento neste ano. Isso porque a oferta de assentos em aeronaves no mercado doméstico, avançou 1,3 % na mesma base de comparação, menos da metade do avanço da demanda.

No acumulado de janeiro a setembro, o nível médio de ocupação, chamado de "load factor", cresceu 4,2 pontos, para 79,5 por cento. "Foram números saudáveis para a indústria", disse o consultor técnico da Abear Maurício Emboaba.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA

Situação exige medidas a longo prazo

Qualquer programa de transferência de renda ajuda as pessoas a terem o mínimo de renda de sobrevivência. O Garantia Safra, que é um programa bem antigo, e o Bolsa Família são válidos porque garantem a sobrevivência, mas é importante incentivar a atividade produtiva. Tem que dar assistência técnica ao pequeno produtor, oferecer sementes de qualidade e criar projetos de irrigação. A seca é um problema que acontece desde sempre, temos que fazer programas que resolvam essas questões, como açudes e a própria transposição do rio São Francisco, para que, independente de chover ou não, as pessoas possam ter o mínimo de renda.
Ênio Arêa Leão
Vice-presidente do Ibef

Ranniery Melo/Carlos Eugênio
Repórteres

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