População preta do Ceará tem mais idosos do que jovens, aponta Censo; entenda possíveis motivos

Dados do IBGE mostram que a população preta é a mais envelhecida no Ceará, enquanto a indígena é a menos envelhecida

Escrito por Theyse Viana e Gabriela Custódio , gabriela.custodio@svm.com.br
Idoso caminha em rua
Legenda: Entre os pretos do Ceará, a idade mediana é 39 anos. Com isso, metade da população preta do Estado tem até 39 anos e outra metade é mais velha que isso
Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

A população preta residente do Ceará é a mais envelhecida entre os grupos étnico-raciais. A cada 100 crianças e adolescentes de até 14 anos, há 168 idosos nessa parcela da população. Esse indicador, que faz parte do Censo Demográfico 2022 e foi divulgado nesta sexta-feira (22) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta uma contradição da sociedade cearense, que permite que pretos envelheçam, mas tem altos índices de violência contra a juventude.

O Índice de Envelhecimento é calculado pelo IBGE ao dividir o total da população idosa (a partir dos 60 anos) pela quantidade de pessoas com até 14 anos. Quanto maior o indicador, mais envelhecida é a população analisada.

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Após a população preta, aqueles que se identificam como amarelos são o segundo grupo com maior índice: são 124 idosos para cada 100 jovens. Essas duas populações também são as que apresentam idades medianas mais elevadas. Esse indicador representa a idade que divide a população em duas partes iguais: metade daquele grupo tem idade abaixo da mediana e a outra metade, acima.

Entre os pretos, a idade mediana é 39 anos. Dessa forma, metade da população preta do Estado tem até 39 anos e outra metade é mais velha que isso. Já entre quem se declarou de cor ou raça amarela, a idade mediana é de 36 anos.

No outro extremo, a população indígena é a menos envelhecida entre os grupos de cor ou raça. O Índice de Envelhecimento dessa população é 56, enquanto a idade mediana é de 30 anos.

Entre os pardos, a idade mediana é de 33 anos, enquanto há 63 idosos para 100 jovens. Por fim, a população que se declara branca tem idade mediana de 34 anos e índice de envelhecimento de aproximadamente 80.

Cidade "mais velha" do Ceará, São João do Jaguaribe é o município com maiores índices de envelhecimento para as populações preta (1.071) e parda (164). Já as cidades com menores índices de envelhecimento para essas duas categorias de raça ou cor são Morrinhos (72) e Eusébio (35), respectivamente.

PARA A JUVENTUDE PRETA VIVER E CHEGAR À VELHICE

Se por um lado a maior longevidade da população preta aponta para uma melhoria de condições de vida, por outro as desigualdades de classe e raça expõem os jovens à mortalidade precoce. A avaliação é do sociólogo Hilário Ferreira, professor universitário, doutorando em História Social e pesquisador da história e da cultura negra do Ceará.

“É uma relação muito complexa e paradoxal em que a população negra está inserida. Esse envelhecimento pode ser traduzido, de forma positiva, pela diminuição de riscos de vida das pessoas mais velhas, mas quando fazemos o recorte racial do Mapa da Violência, a maior parte das vítimas são jovens negros”, lamenta Hilário.

Há um certo quase projeto de extermínio e genocídio da juventude negra. A violência chega nessa população muito cedo.
Hilário Ferreira
Sociólogo, professor universitário e pesquisador

O professor destaca, ainda, que as disparidades de classe e que o próprio racismo atua atuando como “elemento selecionador” no mercado de trabalho e leva muitos jovens à marginalidade, “porque precisam sobreviver, infelizmente”.

Outra possível explicação para a diferença proporcional de idosos e jovens pretos no Ceará diz respeito à natalidade de pessoas pretas, como observa o pesquisador. “O racismo no Brasil faz com que muitos jovens não desejem ter filhos, porque não querem que os filhos passem pela discriminação que eles passaram”, diz.

É preciso um trabalho profundo para que a juventude negra possa viver e chegar à velhice.
Hilário Ferreira
Sociólogo, professor universitário e pesquisador

Um dos caminhos para garantir a sobrevida saudável dos jovens, como aponta Hilário, é “desnaturalizar o racismo e fazer uma política em que ele seja, aos poucos, extinto”, por meio de empregos e qualidade de vida para essa população.

O pesquisador também cita “um trabalho profundo de mudança de mentalidade das forças de segurança pública, porque a maioria das balas perdidas encontram corpos negros” como ponto crucial de proteção à população jovem preta.

Hilário acrescenta que o respeito global à população negra, que inclui ainda o combate à intolerância religiosa e a garantia de direito à terra para comunidades quilombolas, são aliados para que a juventude preta chegue à velhice de forma saudável.

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