Crise no IJF: hospital reduz números de atendimentos, internações e cirurgias em 2024
A maior queda registrada foi no números de consultas de emergência, com quase 10 mil atendimentos a menos em comparação com 2023
Referência no socorro a vítimas de traumas e fraturas, o Instituto Doutor José Frota (IJF), em Fortaleza, registrou redução em três indicadores em 2024, na comparação com o ano anterior. Houve queda no número de atendimentos na emergência hospitalar, nas internações e nas cirurgias realizadas na unidade.
Os dados foram consultados no portal Dados Abertos Fortaleza, que disponibiliza informações sobre diversas áreas do poder público municipal, e analisados pelo Diário do Nordeste.
Ao comparar os três indicadores para o período de janeiro a novembro de 2023 e de 2024, a maior redução ocorreu na quantidade de atendimentos na emergência do IJF. Neste ano, o Instituto registrou 57.462 atendimentos, quase 15% a menos do que os 67.190 realizados nos mesmos meses do ano anterior.
Em seguida, está o indicador referente às internações hospitalares, que tiveram queda de mais de 10% entre os dois anos. Se nos 11 meses de 2023 foram computadas 13.776 internações, neste ano esse valor caiu para 12.298. Já as cirurgias realizadas no IJF passaram de 12.677 para 11.534 nos períodos analisados — uma redução de 9%.
Os indicadores referentes ao ano de 2022 também foram disponibilizados no portal Dados Abertos Fortaleza. Ao contrário do que foi observado neste ano, todos eles tiveram aumento entre 2022 e 2023, com destaque para as internações, cuja variação foi de 5,5% a mais.
Além da diminuição desses indicadores, o funcionamento do IJF em 2024 também foi marcado por uma queda na quantidade de materiais hospitalares utilizados, segundo o prefeito eleito Evandro Leitão (PT) afirmou em entrevista exclusiva concedida ao Diário do Nordeste.
“Se fizermos um comparativo de 2023 para 2024, daquilo que foi consumido de insumos, de material hospitalar, vamos ter, claramente, uma redução de aproximadamente 50%. (...) Por isso que os insumos básicos estão faltando”, disse Evandro Leitão, citando informações colhidas durante o processo de transição de governo.
Crise no IJF
Desde o dia 8 de novembro, o Diário do Nordeste tem mostrado que o IJF tem passado por uma crise que envolve falta de medicamentos, de profissionais e até de alimentação para funcionários, pacientes e acompanhantes.
A reportagem buscou o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), que tem acompanhado essa crise, para uma avaliação sobre a variação nos indicadores do hospital. Em nota, o órgão atribuiu a redução dos indicadores ao “expressivo desabastecimento no Instituto Doutor José Frota”.
Além disso, o MPCE destaca que a abertura de duas portas de emergência em traumatologia no interior do Ceará. Uma delas foi inaugurada em setembro de 2023, no Hospital Regional Vale do Jaguaribe (HRVJ), em Limoeiro do Norte; e a outra, em agosto de 2024, no Hospital Regional do Sertão Central (HRSC), em Quixeramobim.
Com isso, “houve redução na procura de pacientes das duas regiões pelo IJF”, aponta a nota do MPCE. “De todo modo, de uma forma geral, o MP reforça que vem acompanhando a questão relativa ao desabastecimento no IJF com total atenção, adotando medidas extrajudiciais e judiciais cabíveis”, finaliza o órgão.
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O Sindicato dos Médicos do Ceará também foi procurado pelo Diário do Nordeste e se manifestou por meio de nota. Nela, a entidade aponta como mais preocupante a redução dos atendimentos de emergência, com quase 10 mil atendimentos a menos neste ano de 2024.
Para o Sindicato, a abertura de novas portas de emergência em traumatologia no Interior não é suficiente para justificar a amplitude da redução registrada nos indicadores. “A precariedade crescente enfrentada pelo IJF ao longo de 2024 é um fator determinante para essa queda”, afirma a nota.
“A falta de insumos, medicamentos, alimentação adequada para os pacientes e equipes, além da insuficiência no quantitativo de profissionais, tem comprometido não apenas a quantidade, mas também a qualidade dos atendimentos realizados no hospital. Essa situação reflete diretamente na capacidade do IJF de atender à população com o padrão de excelência que historicamente o caracteriza”, afirma o Sindicato dos Médicos.
A entidade finaliza o comunicado reiterando a preocupação com a manutenção e fortalecimento do IJF e reforçando a necessidade urgente de medidas que combatam o desabastecimento e a precarização do hospital, garantindo condições de trabalho dignas para as equipes e atendimento adequado para os pacientes.
De onde são os pacientes internados no IJF
A partir do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), do Ministério da Saúde, é possível analisar de onde são os pacientes que ficam internados nos estabelecimentos de saúde. Como os dados mais recentes só estão disponíveis até outubro de 2024 — e ainda estão sujeitos a atualização —, para comparar os diferentes anos, o Diário do Nordeste coletou informações de janeiro a outubro ao longo da última década.
Houve uma redução de quase 40% na quantidade total de internações entre 2023 e 2024: de 19.743 no ano passado para 11.899 neste ano.
Em 2015, nesse intervalo de meses analisado, os pacientes que residiam nas regiões de saúde do Sertão Central e do Litoral Leste/Jaguaribe corresponderam, juntos, a 15% das mais de 14,9 mil internações no IJF. Essa proporção oscilou ao longo dos anos, atingindo até 18%, em 2022.
Neste ano, porém, apenas 8% das 11,9 mil internações realizadas no Instituto Doutor José Frota foram de pessoas vindas dessas regiões do Estado. Essas duas regiões de saúde englobam, ao todo, 40 cidades do interior do Ceará — como Tauá, Quixadá, Canindé, Aracati, Jaguaribe, Russas e Limoeiro do Norte.
Mas o sistema do Governo Federal também aponta que 2024 foi o ano com menos internações de pessoas da região de saúde de Fortaleza, que abrange outros 43 municípios do Estado além da Capital. Se entre 2015 e 2023, a média era de 11.755 internações, em 2024 foram registradas 10,3 mil.
O Diário do Nordeste procurou a direção do Instituto Doutor José Frota, por meio da assessoria de imprensa, no dia 18 de dezembro. Novos contatos foram feitos nos dias 19, 20 e 26 de dezembro. Não foi possível marcar entrevista com porta-voz da instituição e não houve envio de nota para a reportagem.