Ceará pode ter 27 mil casos novos de câncer por ano; saiba principais tipos e como prevenir

Especialistas defendem que diagnósticos precoces e evolução de tratamentos tirou da doença a carga de “sentença de morte”.

Escrito por Nícolas Paulino , nicolas.paulino@svm.com.br
Legenda: Socorro Cavalcante foi diagnosticada com câncer de mama em 2019; no ano passado, já comemorava a cura.
Foto: Arquivo pessoal

O diagnóstico de câncer assusta e, muitas vezes, cria uma contagem regressiva na cabeça do paciente. Só no Ceará, cerca de 27 mil novos casos da doença podem ser diagnosticados a cada ano, no triênio 2020-2022, de acordo com estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Neste 4 de fevereiro, que lembra o Dia Mundial contra o Câncer, médicos lembram que é possível prevenir a doença.

Conforme a entidade, o termo abrange mais de 100 tipos de doenças malignas em que ocorre o crescimento desordenado de células, que tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, formando tumores capazes de se espalhar para outras regiões do corpo.

A vigilância de câncer pode ajudar gestores a monitorar e organizar ações de prevenção e controle. Para o Ceará, o Instituto estima a ocorrência de diversos tipos da doença, sendo o de pele não-melanoma o mais comum:

As mulheres devem responder por um pouco mais da metade (52%) desses números, com cerca de 14 mil casos, puxados principalmente pelo câncer de mama e do colo do útero. Os homens representam 48%, com 13 mil, a maioria por câncer de próstata.

O levantamento também faz a projeção por capitais. Fortaleza pode responder por 30% dos novos casos do Ceará, com cerca de 8 mil registros a cada ano.

O médico oncologista Roberto Furlani, membro da Associação Médica Cearense (AMC), acredita que as projeções refletem sim a realidade do cenário oncológico no país, mas em condições “normais”. Por outro lado, a pandemia da Covid-19 levou a um “enorme déficit no diagnóstico e tratamento” das neoplasias. 

“Os pacientes deixaram de realizar exames mesmo em situações de forte suspeita. Além disso, houve a suspensão de inúmeros procedimentos cirúrgicos, o que contribuiu para possível subnotificação dos casos. Somente após a normalização dos procedimentos  se poderá avaliar com certeza o cenário”, percebe.

Adriano Veras, oncologista do Instituto de Prevenção do Câncer do Ceará (IPC),  unidade da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) que atende principalmente ao público feminino, concorda que o período pandêmico prejudicou o acesso a diagnósticos precoces, ideais para a cura da doença.

“As mulheres não tiveram acesso aos exames de prevenção nos postos de saúde, e os programas de rastreio foram paralisados. Agora, muitas estão retornando já num estágio grave; isso dificulta a cura e pode levar ao óbito porque não tivemos a oportunidade de tratar”, lamenta. 

Origem e sinais de alerta

Segundo Roberto Furlani, de forma geral, a origem do câncer está ligada de forma mais importante (90%) a fatores esporádicos/ambientais, enquanto a influência genética representa cerca de 10%. Entre os fatores associados, estão:

  • Estilo de vida: tabagismo, uso de álcool, poluição ambiental, exposição solar desprotegida, obesidade e sedentarismo e alguns vírus e bactérias oncogênicas, dentre outros;
  • Ambiente: como especificidade local do Ceará, há a elevada incidência de radiação solar, contribuindo para as neoplasias de pele.

Furlani também apresenta diversos sinais de alerta que indicam procura de assistência médica:

  • presença de sangue nas fezes;
  • mudanças inexplicadas de hábito intestinal;
  • sangramento vaginal anormal;
  • perda de peso não intencional;
  • fadiga, surgimento de nódulos no pescoço/axilas/região inguinal;
  • tosse persistente com presença de sangue;
  • falta de ar;
  • aumento do volume abdominal.

Superando a doença

Os sinais não eram tão claros para a dona de casa Socorro Cavalcante, 46 anos, em dezembro de 2019. Mesmo hoje curada do câncer de mama invasivo grau 3, ela relembra vivamente o susto da notícia.

“Nem fui pegar o resultado da biópsia, já olhei logo pela internet. Gritei “E agora?” e depois fiquei uns 30 minutos paralisada. Mas depois pensei que, graças a Deus, consegui descobrir logo, e sei que tem cura. No outro dia, já amanheci com outra cabeça”, conta.

Para Socorro, enfrentar a doença exige disposição e mentalidade positiva para enfrentar sessões e mais sessões de quimioterapia e, como no caso dela, cirurgia. “Não foi fácil por causa da agressividade dele, mas só com a quimio meu nódulo reduziu de tamanho em dez vezes, já não dava nem para apalpar”, explica.

Legenda: Atualmente, Socorro se dedica ao ciclismo e a outras práticas de bem-estar físico e mental.
Foto: Arquivo pessoal

Sempre me perguntam como foi ficar careca. Para mim, foi normal. Não usava peruca nem lenço. Raspei antes do tempo, já depois da primeira quimioterapia, e me achava belíssima. Então foi assim: eu levei muito de boa, muito leve, porque queria que as pessoas me vissem com a mesma alegria de antes.

Após a cura, ela se percebe uma nova mulher. Passou a integrar um grupo de ciclismo que sai de Fortaleza para Caucaia, várias vezes por semana, e também se dedica a estudar para concursos públicos, porque não quer ser limitada pela idade. 

O médico Adriano Veras ressalta diversos avanços na medicina, desde o século passado, que aboliram as mutilações cirúrgicas relacionadas ao câncer de mama. “Hoje, o câncer deixou de ser uma doença fatal e sim tratável. O diagnóstico e o tratamento estão mais eficientes e, se feitos de forma precoce, trazem consequências melhores”, diz.

Como prevenir o câncer?

Na campanha de conscientização deste ano, o Inca alerta que a falta de equidade no acesso à prevenção, ao diagnóstico e ao tratamento das doenças pode custar muitas vidas, porque renda, educação, local de moradia e discriminação (por etnia, gênero, orientação sexual, idade, deficiência e estilo de vida) “podem afetar negativamente o atendimento”, aponta. 

O oncologista Roberto Furlani destaca que a principal estratégia é a prevenção, baseada em mudanças de hábitos de vida sabidamente relacionados ao maior risco de câncer. 

“Sempre é tempo de parar de fumar e de beber, iniciar atividade física, mudar hábitos nutricionais, tomar as vacinas indicadas e ter a maior arma nesta guerra: informação. Mesmo quando a doença está estabelecida, o diagnóstico precoce e o acesso aos especialistas e tratamentos adequados podem oferecer a cura”.

Adriano Veras complementa que a prevenção primária está disponível a qualquer pessoa, eliminando três grandes fatores para o desenvolvimento do câncer: alcoolismo, tabagismo e obesidade. Para isso, é preciso promover uma mudança comportamental alicerçada numa alimentação saudável com a prática de atividades físicas.

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