Você é viciado em internet? Confira nove passos para descobrir

Saiba como evitar o problema e de que forma pais, parentes, amigos e escola podem ajudar os jovens de 12 a 20 anos de idade a se recuperar e seguir com uma vida saudável

Escrito por Daniel Praciano , daniel.nobre@diariodonordeste.com.br

Navegar pela internet, acessar e jogar games online é uma realidade nos últimos anos. A grande e massiva quantidade de aplicações e aparelhos que nos conectam à internet diariamente só vêm aumentando. E, com isso, horas e horas são dedicadas a navegar sem fim. É um curtir aqui, um compartilhar acolá, um postar bem ali e o tempo para atividades no mundo real vai ficando cada vez mais raro. Pior: até mesmo quando estamos com amigos e familiares, naquele almoço de domingo ou no bar, a conversa cara a cara é trocada por interações digitais.

Transtorno

Sabemos que isso não é o que deveríamos estar fazendo, mas não conseguimos aceitar que o exagero de tempo dedicado à internet seja um vício, como o uso de drogas. Estamos errados. É sim um vício. Segundo a Associação Americana de Psiquiatria, por meio do livro DSM 5 (Manual de Diagnóstico e Estatística de doenças mentais, em tradução para o português), de 2013, este problema tem até nome: transtorno do uso da internet.

"Esse transtorno é especialmente observado em jovens, faixa da população muito suscetível a esse tipo de uso de tecnologia. Mas pode ser em qualquer idade. O mecanismo de dependência ao uso da internet é extremamente comum em vício por drogas. É como se fosse uma substância. As áreas cerebrais que estão envolvidas são as mesmas que chamamos de recompensa da dopamina (circuito que se ativa quando recebemos estímulos que nos dão prazer). O que caracteriza o uso abusivo da internet são algumas situações em que são colocadas nove ações que o paciente precisa preencher cinco em um ano (veja arte) para dizer que a pessoa tem transtorno de uso da internet", afirma o médico Fábio Gomes de Matos, psiquiatra e chefe do Serviço de Saúde Mental do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC).

Este problema é muito mais comum que possamos imaginar, garante o psiquiatra do HUWC. E ainda está associado a outros transtornos, diz o profissional. "Principalmente, o déficit de atenção e hiperatividade. As pessoas com esse transtorno adoram telas: de computador, celular, iPad, de TV, por exemplo. Sacrificam isso em relação a outras atividades", afirma Fábio Gomes.

E a quantidade? Segundo o DSM 5, em torno de 4% da população do sexo feminino e 8% da do sexo masculino na faixa etária de 12 a 20 anos são afetados pelo problema de vício em internet. E esse número tende a ficar ainda pior com o tempo, visto que cada vez mais cedo temos crianças entrando no mundo da internet sem supervisão ou mesmo supervisionada sem o devido cuidado pelos pais. Muitas vezes, os genitores largam os pequenos com o celular ou tablet para que os mesmos fiquem quietos e os deixem trabalhar ou assistir a um filme na TV.

Mais afetados

E os jovens são ainda mais afetados, pois usam a internet como uma forma muito clara não só de lazer, mas com um propósito de vida, garante o médico que conta uma história sobre um determinado paciente e o vício dele. "Tenho um paciente que está num jogo online. Este game tem 5 mil fases e após 4 meses, ele só chegou à fase mil. Ele vai passar mais de um ano para chegar ao fim. E eu perguntei o que ele vai ganhar com isso. Ele disse: o prazer de chegar ao final".

Por conta disso, o profissional do HUWC faz um apelo para que pais e demais familiares possam ficar mais atentos. A maioria dos pacientes atendidos pelo psiquiatra está na faixa entre 12 e 20 anos, mas o problema não fica restrita só a essa camada. "Há crianças mais novas, de 6 a 9 anos, com o mesmo problema. Adultos de 30 a mais anos com esse problema. Logicamente, o pico está na faixa de 12 a 20 anos, mas afeta a todos", alerta. Ele acredita que um limite no tempo que as crianças e adolescentes passam conectadas é um bom começo para impedir uma relação viciosa. "É preciso ter um controle da internet. Não dá para você ficar imaginando que as coisas vão ser resolvidas sem intervir. É importantíssimo a escola também explicar sobre o uso da internet. Eu não estou demonizando a internet, mas é como comida. Se você exagerar na comida vai ficar obeso. Você sai de uma alimentação saudável para uma alimentação desbalanceada. Exercício é bom, mas tem gente que exagera na academia e não é razoável. Fica quase o dia todo lá dentro. Temos que ter cuidado com os excessos. Precisamos orientar os jovens, principalmente, para que isso não venha comprometer seu desenvolvimento social e psicológico. Para que possamos ter uma juventude mais saudável", afirma Fábio Gomes.

Atendimento

O chefe do Serviço de Saúde Mental do HUWC frisa que o hospital tem um serviço para tratar os dependentes de internet, mas para isso é preciso que os pacientes sejam encaminhados por um médico de um posto de saúde ou de uma unidade do Capes.

"Atendemos por encaminhamentos em dois turnos. Primeiro, a pessoa passa por uma triagem. Depois há uma divisão de 20 pessoas por turno (trabalham em turno manhã e tarde). Atendemos variados problemas e não só deste transtorno de vício de internet", completa Fábio Gomes afirmando que, no Hospital Universitário Walter Cantídio, são atendidas 100 pessoas por mês só do vício de internet na faixa de 12 a 20 anos de idade.

O que fazer?

Por fim, o que fica claro é que usar a internet e estar conectado o tempo todo têm, obviamente, dois lados. O positivo é ficar atento às notícias e informações que estão chegando de sites, redes sociais e comunicadores instantâneos, bem como de promoções, por exemplo. Porém, é preciso ficar atento para não exagerar. Por isso, quando estiver naquele churrasco, esqueça o celular de lado e curta o momento. Nas férias, evite ser a pessoa que só vai lembrar daquela viagem pelas fotos e vídeos e viva mais o momento.

Para os pais e responsáveis a dica é ficar de olho nos filhos. Conversar com eles, mostrar casos em que o exagero no uso da internet e de games online trouxe problemas para a vida de outros jovens. Nós, os pais, precisamos orientar para que eles possam ter atividades físicas também. Só assim, para evitarmos problemas futuros para eles.