Pontos do Rio de Janeiro ganharam expressões artísticas de jovens da periferia

A bravura da mulher nordestina está entre as inspirações das intervenções do coletivo Artemisia Vulgaris

Escrito por Wolney Batista , wolney.santos@verdesmares.com.br

Duas mulheres nordestinas. Uma de João Pessoa, outra de Natal. Como tantas outras conterrâneas, ambas encararam com coragem as agruras da sobrevivência para criar os descendentes. Como tantos outros nordestinos, partiram para o Rio de Janeiro, há cerca de 20 anos, na busca de dar melhores condições para a prole.

As trajetórias das duas se cruzaram ao servir de inspiração para uma manifestação artística que as filhas delas elaboraram para a exposição Interferências19, projeto criado pelo Oi Kabum! Lab, um equipamento de formação e desenvolvimento de coletivos jovens das periferias cariocas.

As adolescentes Naiara Almirante e Dayana Dionisio, acompanhadas por um grupo de outras 11 jovens, manifestaram a pluralidade da potência feminina ao criar o projeto Artemisia Vulgaris. O coletivo estampou em lugares do Rio, como a Rocinha, lambes, ensaios fotográficos, ilustrações, relatos pessoais e frases que geram reflexão e ao mesmo tempo espalham ternuras sobre o universo da mulher.

"Artemisia Vulgaris é o nome científico para a planta Artemisia, que promove a cura por meio de chás e também muito ligada ao ciclo menstrual da mulher", explica Naiara.

"É uma arte que passa muito pelas nossas emoções, pelas nossas vivências e pelas vivências das nossas mães. Minha mãe veio do Nordeste, de uma vida bem miserável, em uma época que não tinha escolas e ela conseguiu educar os filhos, colocá-los na faculdade, mas até hoje ela não se alfabetizou", relata o esforço da mãe em tom emocionado.

O grupo é completamente formado por mulheres que expõem o talento como ilustradoras, designers, atrizes e cantoras, entre outras vertentes da arte. "É um projeto que a gente se fortalece muito junto, porque quando vamos para a rua sozinhas, a quantidade que a gente sofre de assédio é grande e acaba colocando medo, sim", expõe.

Interferências19

Além do Artemisia Vulgares, outros 14 projetos multiliguagens foram selecionados para serem desenvolvidos no laboratório do Oi Kabum! Lab e ganharem as ruas durante janeiro último e neste mês.

As ideias envolveram design, projeção, animações, curtas e minidocs em vídeo, grafite, live cinema, sensores interativos, instalações, performances e shows.

A violenta abordagem de policiais que disparam 111 tiros e mataram cinco jovens que estavam dentro de um carro no bairro Costa Barros, no subúrbio do Rio, em 2015, ecoou por meio da performance 111+. Relatos verdadeiros de parentes de pessoas assassinadas intercalados com histórias ficcionais são ladeados pelo áudio com os estampidos dos tiros.

"Desde 2003, o projeto mudou de formato, mas não mudou de público. Os criativos sempre foram e continuam sendo jovens da periferia. Talvez o sarrafo tenha aumentado, porque as pessoas que entram já precisam ter contato com a arte, mas, hoje, a seleção também já é uma experiência", evidencia o gestor de Cultura da OI Futuro, Roberto Guimarães, em relação ao público e ao processo.


*o jornalista wolney batista viajou a convite da oi futuro

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