No mês da fotografia, profissionais debatem sobre imagens periféricas e anticoloniais
Conferência virtual lança diferentes olhares sobre território, gênero, etnia, sexualidade e raça
O que é periferia, quem assim a denominou e onde ela está localizada? Com esses questionamentos propostos, a artista visual cearense Nágila Gonçalves, 28 anos, uma das idealizadoras da Carcará Foto Conferência - a ser realizada neste que é considerado o mês da fotografia -, começa a tecer considerações sobre os estereótipos que acompanham tal conceito e toda sua dimensão simbólica.
“É um termo elaborado por pessoas não periféricas para distinguir povos e comunidades não pertencentes ao centro”, explica, ao mesmo tempo que faz uma ressalva importante sobre o lugar daqueles que recebem essa “nomeação”.
As pessoas periféricas, ao se assumirem assim, carregam consigo a percepção do que as implicações das culturas periféricas vêm provocando nas comunidades e nas políticas públicas, sem negar a existência de inúmeros problemas, a potencialidade criativa, as reinvenções e as reinvindicações por melhorias das condições de vida”, diz.
Nágila afirma abordar em imagens a periferia do interior do estado, o imaginário do sertão do Ceará, o cotidiano, as lutas e resistências ao domínio e poder entre os grupos e classes sociais antagônicas, a (des)integração do território, as relações cidade-campo, entre outras temáticas.
“Tendo parte de minha família advinda da região dos Inhamuns - CE, trago para a realização deste trabalho, aspectos que tratam sobre estar aproximada da memória coletiva e do sertão que habita em cada um de nós”, pontua.
Ótica indígena
Aos 27 anos, Alleff Utah, professor e fotógrafo da comunidade Tapeba, igualmente encontra na produção de imagens uma forma de expressar sua identidade.
Queremos mostrar que ainda existem povos indígenas, que ainda continuamos com nossos costumes e tradições, e que mesmo com o avanço da tecnologia deste mundo global ainda temos nossa ancestralidade muito bem guardada e passada para a geração seguinte”, reforça.
A história dele com a fotografia começou em meados de 2013, sem muitas ambições, mas rapidamente identificou ali um meio de vida.
“Nós povos indígenas sempre temos encontros dos povos, assembléias e sempre tem alguém com câmera fotográfica. Foi dessa forma que comecei a dar os meus primeiros clicks. Desde então, não parei mais, sou fotógrafo profissional, mas não deixo de ser fotógrafo indígena, que é o que mais gosto de clicar”, conta.
Diálogos
Outros detalhes sobre sua experiência, Alleff compartilhará na Carcará Foto Conferência, que tem como objetivo, nesta segunda edição, debater a respeito das imagens periféricas e anticoloniais em todas as sextas e sábados de agosto.
Virtual e gratuito, o evento será transmitido via YouTube e, além de contar com apresentações de pesquisas, trabalhos e processos artísticos com transmissão ao vivo, também ocupará demais espaços de formação, como cursos de fotografia da Rede Cuca.
“Os encontros e as live do Carcará e de outros apoiadores fortalecem ainda mais o nosso movimento indígena, sempre quebrando esses estereótipos de que o indígena é um ser ignorante, que não sabe das coisas, que ainda vive em 1.500”, partilha Allef.
Temos esse dever de mostrar para a sociedade que nós somos cidadãos como qualquer outro, temos celulares, temos notebooks, temos acesso às universidades, dentre outras coisas, mas com um diferencial, que é a nossa ancestralidade, nossa cultura e nosso modo de viver dentro das nossas aldeias”, completa.
João R. Ripper, Vilma Neres, Flávia Almeida, Sy Gomes e Vita da Silva também estão entre os convidados da Foto Conferência, que dá apenas um passo em direção aos desejos dos idealizadores.
“Outras ações que estão sendo pensadas e elaboradas estão ligadas ao Núcleo de Formação da Carcará, com o intuito de fomentar formações acerca da imagem, crítica e reflexão. Serão experiências de pesquisa e formação, sobre o ponto de vista do aspecto cultural e periférico, elaboradas por pessoas de periferia, abordando questões como: história da imagem indígena, afrovisualidades, descolonização do olhar, leitura de imagem, cosmovisões, curadorias em diálogo dentre outros”, conta Nágila Gonçalves.
A realizadora cultural defende uma ação que não se esgote no trabalho de um único artista e propõe à juventude uma experiência conjunta. “Inquietações coletivas também são necessárias”, finaliza, num convite ao debate.
Serviço
II Carcará Foto Conferência (@carcara.fotoconferencia)
Dias 6, 7, 13, 14, 20, 21, 27 e 28 de agosto (sex - sáb)
Horário: 16h, 18h e 20h
Transmissão pelo canal do Youtube da Carcará Foto Conferência