Músicas para Fortaleza: quais as canções inspiradas em lugares da cidade tocam seu coração?
Projeto mapeia cerca de 200 músicas inspiradas em lugares de Fortaleza e cria aplicativo, álbum de figurinhas e livro
Para cada cantinho de Fortaleza, uma música. Da Messejana ao Pirambu, da Varjota ao Quintinho Cunha, canções compostas por cearenses de diferentes gerações ajudam a contar a história da Capital, ao mesmo tempo que embalam as memórias de quem transita por ela. É esse material que um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC) se dedicou a reunir nos últimos três anos, em um projeto que tem como produtos um aplicativo, um álbum de figurinhas e um livro acadêmico.
“Fortaleza em música” nasceu de uma inspiração lisboeta. A professora de Pós-Graduação em Comunicação e do Curso de Publicidade e Propaganda do Instituto de Cultura e Artes da UFC (Ica), Sílvia Helena Belmino, descobriu um aplicativo que apresentava os monumentos da cidade portuguesa com poesias de Fernando Pessoa.
Imediatamente, ela trouxe a referência para o Grupo de Pesquisa de Imagem, Consumo e Experiência Urbana (Giceu), no qual é responsável pela coordenação. “Temos pesquisas sobre as experiências com bicicletas em Fortaleza, com ônibus, com mega eventos, com feiras etc – e a ideia de trabalhar a música e a cidade se encaixaria perfeitamente na proposta do grupo. Assim nasceu o projeto Fortaleza em Música”, contextualiza a docente.
Os trabalhos, conta Sílvia, iniciaram em 2018 com a elaboração de uma pesquisa exploratória sobre as músicas que tinham a cidade como tema. Uma enquete foi disponibilizada nas redes sociais - Facebook e Instagram - perguntando se as pessoas conheciam canções que falavam sobre bairros, praias, lugares, espaços da capital cearense.
“A enquete teve uma participação significativa e recebemos nossos primeiros dados para a pesquisa. Depois, alimentamos nosso banco de dados com as entrevistas com os compositores/músicos. Eles, após falarem dos seus trabalhos, indicavam canções de outros/outras artistas".
Canções encontradas
Até o momento, o projeto já conseguiu mapear 200 músicas, de diferentes gêneros e ambientes da cidade. Desse total, foram realizadas 38 entrevistas com alguns dos compositores, trabalho desempenhado pelos bolsistas do Curso de Jornalismo, Renan Matos Brito e Rikelme Silva Souza.
“Nos surpreendemos com algumas descobertas que serão trabalhadas com um olhar mais analítico para o livro. Uma das surpresas foi a participação reduzida de mulheres compositoras nas músicas sobre Fortaleza. Ela é bem reduzida se comparada à presença masculina”, partilha.
Ainda assim, a seleção conta com nomes como o da cantora Mona Gadelha e a canção autoral “Cinema Noir”, com referência à Praia do Futuro; e da dupla Gigi Castro e Ângela Linhares, com a música “Chove em Messejana”, cujo cenário é a famosa lagoa deste bairro.
Na fase exploratória da pesquisa, segundo Sílvia, dois pontos importantes também foram identificados: a entrada das áreas periféricas da cidade com o rap e o número reduzido de músicas de forró.
“Downtown”, de Nego Gallo, e “Holocausto Capital”, de Má Dame, exemplificam esse olhar para as periferias da cidade, com letras que denunciam a violência, mas também chamam atenção para a união por justiça nas comunidades do Oitão Preto e do Quintino Cunha, respectivamente.
Entram ainda no baile compositores tradicionais da Capital, como Ednardo, com uma canção para o Passeio Público; e Fausto Nilo e Calé Alencar, com “Equatorial” e seus versos inspirados na Areninha do Pirambu.
Participam também grupos que se formaram nas décadas mais recentes, como Cidadão Instigado e a canção “Fortaleza”, denunciando a especulação imobiliária na Varjota; Breculê e o "Samba do Lago", ensaiado no Lago Jacarey; Casa de Velho e a música “Sapiranga”, com referência ao mangue da região; e Selvagens à Procura de Lei, com “Esperando o 51”, cujo cenário é o Terminal do Papicu.
Produtos
Entre os resultados práticos da pesquisa, está o aplicativo “Fortaleza em Música”, já disponível gratuitamente na Play Store para quem tem Android. Os usuários de iOS vão esperar mais um pouquinho. Mas a ideia principal é que a pessoa baixe o app e, ao andar pelos lugares de Fortaleza, receba uma notificação.
“Durante o trajeto, pode ver o vídeo, ler a letra da música, conhecer um pouco da história do lugar, da trajetória do/da artista e ainda saber o porquê do lugar ser inspiração. Também possibilita uma interação entre o aplicativo e o usuário. Ele pode enviar uma música sobre a cidade que não se encontra na lista, pode relatar alguma experiência pessoal com a música ou com o lugar”, descreve.
A parte técnica do aplicativo integra o Trabalho de Conclusão de Curso de Sistemas e Mídias Digitais do estudante Andrew Noronha. Quem também aproveitou o projeto para finalizar a trajetória na universidade foi a dupla do curso de Publicidade e Propaganda Vitor Alves e João Gabriel Freitas, responsáveis pela elaboração do álbum de figurinhas.
“O leitor visitará diversos pontos de nossa cidade apenas ao abrir um pacotinho. São 50 páginas reunindo fotografias e/ou pequenas ilustrações, além de informações sobre as músicas, letras, seus autores e os espaços cantados da cidade. O livro foi impresso em formato A4 e as figurinhas tem dimensões 5x7cm, um padrão do mercado”, explica Sílvia, que também é orientadora do trabalho.
Lançamentos
O lançamento oficial do aplicativo e do álbum de figurinhas deve acontecer entre a terceira e quarta semana de fevereiro, a depender do contexto sanitário. A atividade será conduzida no Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (Adufc-Sindicato), com a presença dos compositores participantes da pesquisa.
Logo após, os álbuns de figurinhas, cujas 400 impressões foram doadas pela Assembleia Legislativa do Ceará, ficarão disponíveis na Adufc e no Instituto de Cultura e Arte (Ica), sendo disponibilizados em troca de alimentos a serem destinados aos músicos.
Já o livro acadêmico com a análise das composições deve ser lançado somente em 2023. Colaboram com esta iniciativa, além dos estudantes já citados, o vice-coordenador do Giceu, Robson Braga, os pesquisadores Fábio Marques e Thaís Aragão; a aluna Patrícia Morais e o fotógrafo Pedro Campos.
Na visão da professora Sílvia, os produtos deste projeto podem ser utilizados com diferentes objetivos, alcançando públicos diversos.
“Pode ser uma forma de conhecer as músicas sobre Fortaleza; uma ferramenta nas escolas da rede pública para que os/as alunos/alunas possam conhecer a cidade; um banco de dados para futuras pesquisas e também um roteiro de percurso, como um roteiro turístico; além de ser ótimo para colecionadores de álbuns de figurinhas”, celebra.