'Mais viva que nunca’: empreendedores resistem e mantêm ocupação na Rua dos Tabajaras
Patrimônio histórico e afetivo de Fortaleza, a charmosa ruazinha, localizada na Praia de Iracema, reúne comércio, restaurantes, moradias e vida noturna
Feiras itinerantes, lojas de roupa, restaurante, ateliê, balada. Uma passada pela charmosa ruazinha é como um ‘menu degustação’ de Fortaleza. Localizada na Praia de Iracema, a Rua dos Tabajaras é ponto de encontro de moradores e turistas e reúne boemia e potencial criativo.
Nos últimos anos, três casas emblemáticas fecharam na rua: Mambembe, Coração Selvagem e, mais recentemente, o Café Couture. Para muitos, fica a sensação de perecimento, mas para outros é a resistência dos que ficam que se mantém.
A Remember é uma das novas casas da ruazinha. Localizada no prédio que um dia abrigou o Mambembe, a boate chegou para a construção de novas memórias. “A ideia do nome veio por conta da rua. Todo mundo tem lembrança com a Rua dos Tabajaras, seja boa ou ruim”, relata o responsável pelo espaço Yury Moreira.
O empresário conta que foram as vivências que teve na rua que despertaram o desejo de ter o próprio negócio na Tabajaras, aberto durante a pandemia de Covid-19 e em pleno funcionamento desde 2021.
“Acho que tudo que movimenta a Rua dos Tabajaras é bem-vindo, inclusive porque é muito frequentada por turistas e eles percebem que existe uma identidade, um sentimento de querer manter a tradição. É por isso que tô tentando fazer com que a gente persista, quanto mais empreendimento, mais movimento, mais dinamismo, mais ocupação”.
Além de empreendimentos fixos, outros movimentam ainda o potencial criativo e o comércio colaborativo, como a feira La Grue, comandada pela produtora Fernanda Beviláqua. A ação itinerante acontece há um ano na Rua dos Tabajaras a cada dois meses. “Foi um ano intenso, de muita troca, movimentação entre criadores, projetos e ideias novas”.
Para ela, o fechamanto de algumas casas é uma perda para o ecossistema que se formou na ruazinha e um alerta que as pessoas “reconheçam a força dos locais que frequentam, dos projetos que gostam, das coisas que a gente quer ver no mundo”, destaca.
“Eu acho que todo mundo perde um pouquinho quando algo encerra, mas aí nasce a esperança de que algo novo surja também. Vamos apoiar as causas que a gente acredita pra que, no lugar de um que não deu pra continuar, nasça outro”.
‘A cidade sempre perde’
Naquela ruazinha há também quem resista há anos, construindo um movimento de união. Há mais de duas décadas, a designer Silvânia de Deus mora e trabalha no mesmo endereço. É na casa de número de 660 de onde saem suas manifestações artísticas que dão surgimento às roupas do Ateliê da Sil.
Como a própria designer fala, "é, ao mesmo tempo, cria e criador desse lugar". "A Praia de Iracema tem uma associação muito forte com a cultura, com a arte. Sempre foi casa de muitos ateliês criativos. O bairro comunga muito com a minha própria história, reforça muito essa veia criativa que eu tenho e que levo para o meu trabalho”.
Por isso, para ela, o fechamento de espaços é uma perda para a cultura da cidade, mas demonstra o reflexo da sociedade cearense. “Somos uma sociedade que faz pouco uso dos seus espaços. Já vi muitos bairros, lugares serem ocupados em massa e depois debandados. O mesmo público que frequenta é o mesmo que deixa de ir”.
De acordo com Silvânia, é preciso valorizar novos movimentos nas ruas, o que promovem ocupação e um ganho para a cultura da cidade.
"É um convite pra nossa ocupação, é um evento de resistência, um convite pra cidade olhar pra lá com outros olhos. É um bairro que tem muita história, todas as gerações ocupam aquele bairro de uma forma diferente. Rua violenta não é rua ocupada, é rua desocupada. Quanto mais a gente ocupa um lugar, mais vida ela vai ter”.
Mais viva que nunca
Desde 2019, Lidierre Galdino ocupa a Casa Azul da região com a loja Pump e, para ela, a rua está “mais viva que nunca, porque o movimento, o consumo e a visita nas Tabajaras existem, novas lojas abriram lá, novos espaços também. É um ambiente muito familiar”, aponta.
Para promover essa ocupação, ela e outras marcas que habitam a Casa Azul promoviam eventos, em que recebiam as pessoas com comidinhas, bebidas e música. São iniciativas como essa que Lidierre considera fundamentais para que esse ciclo permaneça em movimento.
“Existe um senso coletivo muito forte, a gente tá até querendo montar um grupo mais oficial entre os empreendedores pra fortalecer nossas demandas. É um movimento coletivo. A gente sabe que se a rua for bem vista, tiver movimento e estrutura legal, todo mundo vai consumir em todos os estabelecimentos”.
Quem corrobora com essa opinião são os empreendedores Manuela do Vale e Chico Gualbernei, responsáveis pelo restaurante Mar de Rosas e Vila Morena Open Mall, respectivamente. “Sou apaixonado por esse lugar, por isso, resolvi trazer meus negócios todos pra cá. A região tem a tradição de vida noturna, mas estamos transformando essa ocupação em algo diário”, aponta Chico.
Manu relata ter relação com a PI desde a infância. "Quando tinha alguma ocasião especial, eu e minha família vínhamos para comemorar em um restaurante que tinha aqui. Na adolescência, vivi nos bares, na ponte metálica", diz.
Por isso, ambos esperam, para os próximos anos, que os projetos aos redores da Ruazinha sejam concluídos para movimentar ainda mais. “Que o projeto do Edifício São Pedro seja levado pra frente, a conclusão da requalificação da PI e o do Acquario”.
Revitalização e investimento
Em 2020, a Prefeitura de Fortaleza realizou obras de revitalização na Rua dos Tabajaras para restaurar e requalificar a área, melhorando a circulação de pedestres, garantindo maior segurança e acessibilidade nos passeios.
Além de novos mobiliários como bancos, lixeiras, mesas com cadeiras, foram instaladas novas estações do programa Bicicletar. A Rua também recebeu um novo sistema de drenagem com as obras, cujo investimento foi em torno de R$ 4,2 milhões.
Conforme o projeto da Secretaria Municipal da Infraestrutura (Seinf), a revitalização pretende fazer um novo desenho da rua, para que se torne um grande calçadão, aumentando o fluxo de pedestres com bares, galerias de arte, escritórios e moradias.