Filme de Gentil Barreira afirma vitalidade da fotografia analógica no presente
"Sais de Prata", curta-metragem lançado no último sábado (30), revisita a obra do fotógrafo cearense, feita da década de 1970 aos 90
O excesso de imagens na comunicação atual, atravessada pela reprodução incessante de fotografia digital nas redes sociais, pode gerar a falsa impressão que o formato "engoliu", inteiramente, as demais formas de se fotografar. No entanto, a fotografia analógica não só vive, como é celebrada feito um recurso imagético de autêntica expressão artística, dentre os artistas visuais. "Sais de Prata", curta-metragem dirigido por Tibico Brasil, toca na obra do fotógrafo Gentil Barreira e, sobretudo, no seu "feitio" junto à linguagem analógica.
Lançado no último sábado (30), pelo canal de Gentil no You Tube, o vídeo revisita a obra do autor cearense, produzida da década de 1970 até os 90, por meio de depoimentos dele e de Patrícia Veloso, curadora de seu acervo.
O fotógrafo observa que, a exemplo da expectativa "não confirmada", no passado, sobre o cinema substituir o teatro, por exemplo, a tensão entre foto analógica e digital não anula nenhuma das possibilidades. Gentil Barreira recorda que, quando da participação de suas fotografias na exposição do Salão de Abril de Artes Visuais em Fortaleza, pela primeira vez, em tese havia uma sugestão de "substituição" da pintura pela foto no panorama das artes local.
"Mas como vimos, não foi isso que aconteceu exatamente. A nova linguagem vem para acrescentar novas possibilidades de expressão ao artista. Hoje temos uma valorização importante do processo analógico, gerando um interessante retorno às raízes da captura da imagem não só por quem viveu esse momento, mas também por artistas mais jovens", situa o fotógrafo.
No filme, a edição traz fotografias que participaram do próprio Salão de Abril, além de outras imagens premiadas. O processo criativo de Gentil Barreira é apresentado de um modo muito sutil, com o artista revelando afeições (pelas árvores, por exemplo), mas sem entregar nenhuma fórmula pronta para fotografar.
A recusa à obviedade na obra de Gentil Barreira, inclusive, é um dos tons da fala da curadora Patrícia Veloso. Ela reforça como o curta-metragem tende a apresentar uma "construção muito pessoal" na trajetória do fotógrafo.
"Ele vai, de alguma forma, tendo oportunidade de adquirir informações sobre história da arte, formação acadêmica ou uma introdução a isso. Mas ele decide seguir uma linguagem própria, uma descoberta pessoal, sem se limitar a muitas questões de seguir um autor, uma determinada linguagem estética. Se sente muito livre, sem amarras de seguir o mercado ou tendências", reflete Patrícia.
Filmagem
A curadora coloca que as imagens do filme circularam em espaços expositivos e situam o espectador no universo dos primeiros 30 anos de criação de Gentil Barreira. Com trilha sonora de Cristiano Pinho, o curta-metragem teve a direção e ainda o roteiro assinado pelo fotógrafo Tibico Brasil.
"Revisitar a produção do Gentil, no período da fotografia analógica, foi uma forma de voltar a um passado romântico da minha própria paixão pela fotografia. Para mostrar seu olhar sofisticado, e sua forma de criar imagens, optei por deixá-lo à vontade em seu estúdio. E em uma saída fotográfica para coletar os depoimentos e imagens de forma espontânea, sem interferir nas cenas e respeitando o tempo e a sua forma de se expressar", recapitula Tibico Brasil.
Os depoimentos e as imagens foram gravados nos últimos dias 8 e 9 de janeiro, e apenas 20 dias depois o curta já estava finalizado. Para os novos públicos que devem conhecer Gentil Barreira por meio do filme, Tibico adianta que o trabalho do fotógrafo cearense é uma grande referência para todos os fotógrafos de sua geração.
"Tive o privilégio de acompanhar sua trajetória profissional, admirar sua competência técnica, sua constante busca pela qualidade e inovação; reconhecer seu enorme talento e prazer de compartilhar conhecimentos e fazer amigos na fotografia", elogia o diretor.
Preservação
Hoje, boa parte da obra de Gentil Barreira está preservada na Imagem Brasil Galeria (Aldeota). No espaço, outros fotógrafos também têm seus acervos analógicos preservados em salas climatizadas.
Patrícia Veloso situa que o ambiente é mantido a fim de evitar, por exemplo, a deterioração rápida de imagens com mais de 40 anos de idade. "Há material de 40, 50 anos. Já passou pela minha guarda negativo do (fotógrafo) Chico Albuquerque (1917-2000), com até 60 anos", especifica a curadora.
"Boa parte do material está catalogado, tem publicação de autor, número de sequência. Alguns estão posicionados conforme a própria lógica do fotógrafo. Mas é possível chegar a essas imagens com uma certa organização", complementa ela.