Encontro de Karim Aïnouz com suas raízes no filme O Marinheiro das Montanhas encerra 31º Cine Ceará
Filmado durante a primeira ida do cineasta cearense à Argélia, país em que seu pai nasceu, longa-metragem é um tocante mergulho na reconstrução da memória e dos afetos
Os destinos à mercê do coração nem sempre são fáceis de trilhar. Oposto à idealização dos contos de fadas, é o desencontro quem teima em marcar inúmeras relações amorosas. Algumas histórias de vida podem ser geradas em meio a incertezas.
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Novo filme de Karim Aïnouz, "O Marinheiro das Montanhas", parte de uma delicada vivência no passado familiar do diretor cearense. Após aplaudida estreia em Cannes, o documentário encerra o 31º Cine Ceará – Festival Ibero-americano de Cinema, com exibição hors concours.
Em 2019, Aïnouz atravessou o mar de Marselha até a Argélia. Partiu na missão de desbravar o lugar natal do pai, o engenheiro Majid, a quem conheceu apenas aos 18 anos. Sua mãe, a bióloga marinha Iracema, conheceu o argelino nos anos 1960, durante viagem de estudos aos Estados Unidos.
Grávida, Iracema retornou ao Brasil. Majid voltou a Argel. O reencontro jamais aconteceu. E o longa-metragem que percorre estas memórias é feito como uma espécie de longa carta destinada à mãe, morta em 2015. Um diário de viagem capaz de aproximar universos tão distantes.
Perder-se no caminho
Majid esteve na guerra de independência da Argélia. E o contexto político e social desta nação permeia boa parte das observações do filho viajante. Nessa jornada pessoal, Aïnouz reúne imagens oníricas e contemplativas para atravessar presente e passado.
A comovente narração do próprio diretor nos situa naquele universo desconhecido. Generoso, o realizador divide seus estranhamentos e descobertas. Seu olhar adentra de quartos de hotel à realidade noturna das ruas de Argel. Mesmo sendo um mergulho particular, não estamos apartados de suas observações ao longo do caminho.
Cores, sons, saudades, cheiros e mistérios envolvem esta busca. Estamos diante de um protagonista disposto a dialogar com os costumes daquele lugar. Em determinado momento, Aïnouz se perde na cidade. O que para muitos turistas seria desconforto, para o autor representa uma ferramenta valiosa de compreensão daquela realidade.
Sempre com a câmera à mão, o cineasta registra uma série de ricos personagens. Quando questionado das suas intenções com o equipamento, o brasileiro explicava ser jornalista. E da arte do encontro, o realizador vai montando este quebra cabeça tão particular.
Memórias
Desde o curta-metragem "Seams" (1993), Aïnouz percorre temas cravados em sua própria família. Disposto de registros da viagem, filmagens caseiras, arquivos históricos e trechos de super-8, "O Marinheiro das Montanhas" percorre as minúcias de uma história de amor separada por dois mundos.
Respiramos a Guerra de Independência Argelina, memórias de infância e os contrastes entre Cabília (região montanhosa no norte da Argelia) e a capital cearense. É um registro delicado e corajoso de uma história nascida do amor.
Viajar à Argélia tornou-se uma jornada emocionante e com duplo resultado. Além de "O Marinheiro das Montanhas", a saga pela Argélia rendeu o documentário “Nardjes A", que estreou no ano passado em Berlim.
Serviço
CERIMÔNIA DE PREMIAÇÃO DO 31º CINE CEARÁ
Cineteatro São Luiz
19h30
EXIBIÇÃO ESPECIAL
O Marinheiro das Montanhas
Documentário, Karim Aïnouz, 98'. Brasil. 2021
Classificação indicativa: 14 anos