Albertu’s Restaurante, na Barra do Ceará, é transformado em Museu Orgânico de Fortaleza

Com a titulação, espaço deve realizar mais atividades de valorização da cultura e memória da Capital; até 2025, outros dois Museus Orgânicos serão inaugurados em Fortaleza

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: A partir de agora, mais que um lugar para apreciar a gastronomia fortalezense, o Albertu's Restaurante amplia a vocação para reunir pessoas, povos e comunidades
Foto: Fabiane de Paula

“Quando abri as portas, nunca imaginei esse momento”, confessa Alberto de Souza, emocionado. Comoção justificada. O empreendimento do cearense, o Albertu’s Restaurante, localizado na Barra do Ceará, é o primeiro Museu Orgânico da rede SESC em Fortaleza. Inaugurado nessa sexta-feira (16), representa passo importante na cultura da cidade.

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Isso significa que, a partir de agora, mais que um lugar para apreciar a gastronomia fortalezense, o negócio amplia a vocação para reunir pessoas, povos, comunidades – algo já vivenciado na dinâmica da casa. “Aumenta a missão de dizer que aqui tem a história da Barra do Ceará e um pouco da nossa história e de quem nos visita”, explica o proprietário.

Fartura de imagens, espalhadas pelos quatro cantos do recinto, dão conta de expressar essa riqueza. O visitante mais atento perceberá uma cartografia: juntos, os registros abraçam tanto os primeiros passos da Barra do Ceará – do Cruzeiro de Santiago à construção de Clube de Regatas – quanto flashes únicos da trajetória pessoal de seu Alberto.

Legenda: Fartura de imagens, espalhadas pelos quatro cantos do recinto, dão conta de expressar a riqueza do empreendimento
Foto: Fabiane de Paula

O homem herdou a veia empreendedora do pai, outro Alberto. Ao fincar os pés no bairro, em 1964, o patriarca abriu um botequim e otimizou a vinda da família de Pacoti, no Maciço de Baturité, para Fortaleza. Em 1970, porém, a maré derrubou o prédio, fraturando o sonho. Foi o filho quem reergueu a estrutura, evoluindo o status da empresa para restaurante.

“Eu tinha o desejo de fazer algo e dizer ao meu pai: ‘Taí, pai, o que o senhor queria fazer foi feito’. Esse orgulho eu dei. Faz 30 anos que ele faleceu, mas chegou a ver tudo pronto. Com certeza estaria muito feliz agora, ao saber que aquele pequeno espaço se tornou o primeiro Museu Orgânico de Fortaleza”.

Legenda: Verdadeira cartografia no restaurante: juntos, registros abraçam tanto os primeiros passos da Barra do Ceará quanto flashes da trajetória pessoal de seu Alberto
Foto: Fabiane de Paula

Segundo o comerciante, a Barra do Ceará nunca tinha tido um restaurante “raiz”, alinhada às mais tradicionais expressões da cultura do Estado. Recorda apenas do Pólo de Lazer, mas era projeto do poder público. Com teto baixo, arquitetura simples, mas muito capricho no trato e no paladar, o Espaço Gastronômico Cultural Albertu’s Restaurante fez e faz história.

Mas o que é um Museu Orgânico?

Alemberg Quindins responde. Diretor-criador da Fundação Casa Grande - Memorial do Homem Kariri, em Nova Olinda, ele é um dos envolvidos na criação do projeto de Museus Orgânicos. Nas palavras do pesquisador, a iniciativa premia a simplicidade

“É um museu de gente pra gente que tem essa peculiaridade de ser orgânico – de funcionar sendo ponto de memória e, ao mesmo tempo, lugar onde as pessoas que o frequentam sentem que ali é como se sempre tivesse existido um museu”, destrincha.

Legenda: Inauguração da placa chancelando o Espaço Gastronômico Cultural Albertu’s Restaurante
Foto: Fabiane de Paula

No livro dedicado ao tema, publicado pelo Sesc em 2021, consta que são expressões dinâmicas da criatividade humana. Cenários vivos e ativos da cultura e do saber popular abertos nas casas dos mestres que os receberam de herança dos ancestrais e os mantêm autênticos. Em suma, lugares inovadores de partilha da memória.

“Escolher o Albertu’s Restaurante como o primeiro Museu Orgânico de Fortaleza implica uma representatividade. O ponto onde ele está foi onde Pero Coelho de Sousa viu pela primeira vez o litoral cearense. Além disso, é aqui onde também surge um dos principais bairros da cidade, a Aldeota. Um grupo desse território se desmembrou e foi para outro local da cidade intitulando-o exatamente de Aldeota por significar ‘pequena aldeia’”.

Legenda: Cenas como apresentações artísticas no restaurante deverão ser cada vez mais comuns com a nova titulação
Foto: Fabiane de Paula

A própria história do Estado contada em paisagem e presença. A partir da Barra do Ceará, destaca Quindins, começa um processo de colonização de todo o litoral com consequente mergulho no território por meio dos caminhos da navegação. 

“O Albertu’s marca justamente a vinda de uma pessoa de dentro do território para o litoral – no caso, seu Alberto, vindo do Maciço de Baturité, como muitos cearenses faziam”, completa o historiador, notadamente feliz por inaugurar o 15º Museu Orgânico. 

“Agora ele vai contar as próprias histórias a partir de uma pauta que está na parede. É muito legal quando você chega em um lugar que já tem uma informação histórica. Você lê e, a partir dali, desenvolve uma conversa com o proprietário”.

Próximos museus

Também gerente de cultura do Sesc Ceará, Alemberg adianta os próximos Museus Orgânicos da Capital: a casa-ateliê do artista plástico Zé Tarcísio, com previsão de inauguração no segundo semestre deste ano; e o Minimuseu Firmeza, previsto para janeiro de 2025 – este, inclusive, seria o primeiro Museu Orgânico da Capital; contudo, devido a questões envolvendo a infraestrutura de acesso ao local, precisou ser adiado.

“Não é o Sesc que cria um Museu Orgânico. Ele simplesmente faz essa celebração que reconhece um lugar já orgânico, popular, de memória. É muito importante saber disso”, enfatiza.

Legenda: Placa referenciando o novo Museu Orgânico, o Espaço Gastronômico Cultural Albertu’s Restaurante
Foto: Fabiane de Paula

Até lá, o festejo em torno do Espaço Gastronômico Cultural Albertu’s Restaurante é grande. Alardeado pelas águas do Rio Ceará, o ponto congregou diversidade de expressões na inauguração do museu. Um dos três filhos do proprietário, o professor Jefferson de Souza, era todo contentamento. Cresceu nessa atmosfera.

“Moro na Barra do Ceará praticamente desde que nasci. Fomos criados estudando e ajudando no restaurante, brincando com todo mundo ao redor. Sempre foi uma convivência intensa, e espero que aumente”, torce. Igualmente defende o lugar como espaço de resistência e referência. A peixada preparada pela mãe, dona Marisa, é prova máxima disso.

Legenda: Seu Alberto reergueu a estrutura primeiro construída pelo pai, evoluindo o status do botequim para restaurante
Foto: Fabiane de Paula

“Eu imagino o restaurante sediando rodas de conversa, trocas de saberes, o Encontro Sesc Povos do Mar… Seria um sonho”. O pai, do outro lado, já fala em talvez abrir um café, esticar as possibilidades de usufruir do “pôr do sol mais lindo do mundo”. Não deixa de ser um presente, e compartilhado.

“A Barra do Ceará é o marco-zero da cidade, um bairro muito emblemático. O fato de termos aqui um Museu Orgânico é um presente também para Fortaleza. Não se deve apenas aos 60 anos da minha família no local, é algo mais. Quem nunca passeou de barco no Rio Ceará? Quem nunca comeu uma peixada no Albertu’s Restaurante? Isso é a Barra, um presente para a sociedade cearense. Que surjam mais espaços como esse”.

 

Serviço
Espaço Gastronômico Cultural Albertu’s Restaurante
Avenida Radialista José Lima Verde, 746, Barra do Ceará. Funcionamento somente aos fins de semana, de 10h às 19h. Passeios de barco via agendamento. Contato: (85) 3485-6945.

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