'Sucessão de erros', denuncia pai de Benício após prescrição errada de adrenalina

Em entrevista ao Fantástico, família descreveu o atendimento ao menino.

Escrito por
Redação producaodiario@svm.com.br
Família de Benício em hospital de Manaus.
Legenda: As imagens exibidas pelo Fantástico mostram que Benício chegou andando ao hospital na companhia dos pais.
Foto: Reprodução Fantástico.

Os pais de Benício Xavier, menino de 6 anos que morreu após receber uma dose errada de adrenalina na veia, em um hospital de Manaus, denunciaram uma sucessão de erros no atendimento, em reportagem do Fantástico exibida nesse domingo (7). 

A criança foi levada ao Hospital Santa Júlia com tosse seca e febre no dia 22 de novembro, e a suspeita era laringite. "Eu falei para o meu esposo: 'vamos levar ele na emergência?' Porque eu acredito que seja a garganta dele que está muito inflamada", relatou a mãe, Joice Xavier de Carvalho.

As imagens exibidas pelo Fantástico mostram que Benício chegou andando ao hospital na companhia dos pais. "Nenhum pai, nenhuma mãe, leva seu filho para um hospital para morrer. Ainda mais da forma que o Benício morreu. Dessa sucessão de erros, dessa negligência que a gente verificou", disse o pai, Bruno Mello de Freitas. 

Joice afirma que o quadro do filho não foi considerado grave. "Só podia entrar um no consultório, eu entrei com ele. E aí, ela (a médica Juliana Brasil Santos) pediu para avaliar ele. Falou que ele ia fazer adrenalina. Ela não explicou o meio, só falou em fazer a adrenalina", disse. 

A mãe disse que Benício tinha sido tratado com adrenalina por inalação no mesmo hospital, um mês antes, quando a criança apresentou o mesmo quadro.

Ao ver o soro injetável, a mãe afirmou ter questionado. "Cadê a inalação para adrenalina? Sempre foi por inalação". Segundo ela, a técnica de enfermagem respondeu que também nunca tinha aplicado o remédio na veia, mas que isso estaria indicado na prescrição médica.

Após receber a adrenalina na veia, os pais afirmaram que Benício ficou pálido e reclamou de dor no coração. Ele foi levado às pressas para a sala vermelha, de emergências, com dificuldade para respirar. Quatro horas depois, foi transferido para a UTI, e horas depois, intubado. "Eu falava com ele internamente: 'bora, filho. Bora. Melhora essa oxigenação'. Eu rezava muito", afirmou Bruno.

Benício teve seis paradas cardíacas e não resistiu. "É uma dor muito grande que vou levar para a minha vida toda", disse o pai. "Pelo que a gente está analisando, verificando, observando, é uma sucessão de erros."

Veja também

Investigação

A investigação sobre a morte do menino ganhou novos desdobramentos após o delegado Marcelo Martins afirmar que ao menos três testemunhas relataram que a médica Juliana Brasil Santos, responsável pela prescrição da adrenalina, teria tentado alterar o prontuário para esconder o erro.

Segundo ele, essas pessoas trabalhavam no hospital durante o atendimento e relataram a tentativa de manipulação dos dados, conforme informações do g1.

A médica já havia admitido o equívoco em um documento enviado à Polícia e em mensagens trocadas com o médico Enryko Queiroz, embora a defesa sustente que essa confissão ocorreu "no calor do momento".

A técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva, que aplicou a medicação, também responde ao inquérito em liberdade.

Segundo o delegado, testemunhas afirmaram que Juliana buscou acessar a prescrição original para alterar ou suprimir informações. "Essa é uma afirmação de algumas testemunhas. Nós temos três testemunhas que indicaram, que apontaram essa situação", disse Martins ao comentar os depoimentos ao g1.

Ele também detalhou a suspeita de tentativa de apagar o erro no sistema hospitalar. "A médica teria tentado obter acesso à prescrição médica original para suprimi-la e editar os dados no sistema para que não aparecesse o fato dela ter prescrito errado a adrenalina pela via endovenosa e não pela via de nebulização", afirmou.

A Polícia do Amazonas analisa se houve dolo eventual, considerando a possibilidade de indiferença ao risco à vida da criança. "Estamos nos atentando a todos esses detalhes para poder verificar se teve dolo eventual ou se foi só um homicídio culposo", declarou o delegado.

Apesar dos relatos de tentativa de adulteração, um pedido de prisão não pode ser feito por causa de uma liminar concedida no habeas corpus da defesa da médica. "Se não fosse esse habeas corpus, isso seria uma causa forte de prisão. Como existe essa liminar, não pode ser formulado novo pedido", ressaltou Martins.

O que diz a defesa da médica

A defesa de Juliana argumenta que o erro pode ter sido provocado por falha no sistema automatizado usado para registrar prescrições, alegando que a via de administração teria sido modificada automaticamente. "Juliana não escreveu a prescrição manualmente. O próprio sistema pode entender que está incorreta e alterá-la automaticamente", disse o advogado Felipe Braga, também ao g1.

A família de Benício contesta essa versão e publicou carta afirmando que não houve instabilidade no software. "Está demonstrado que não houve qualquer falha de sistema", diz o documento.

O caso é investigado como homicídio doloso qualificado.

Assuntos Relacionados