Facções disputam controle de casas de apostas esportivas e de jogo do bicho na Capital e no Interior

Em razão do sucesso financeiro obtido por uma facção carioca, pelo menos outras duas organizações criminosas - nascidas no Ceará - também decidiram entrar no ramo, a partir de extorsões

Escrito por Messias Borges , messias.borges@svm.com.br
Representantes da facção recolhem os valores (acordados semanalmente ou mensalmente) na porta dos estabelecimentos, muitas vezes com uso de violência
Legenda: Representantes da facção recolhem os valores (acordados semanalmente ou mensalmente) na porta dos estabelecimentos, muitas vezes com uso de violência
Foto: Reprodução

As facções criminosas expandiram seus tentáculos para mais uma atividade econômica no Ceará. Elas tomaram o controle e disputam pontos de casas de apostas esportivas e de jogo do bicho, em Fortaleza e no Interior do Estado. No fim de julho último, uma operação deflagrada pela Polícia Civil do Ceará (PC-CE) e pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) prendeu sete suspeitos de participar do esquema criminoso, em dois municípios.

Mas uma fonte da Polícia ligada à investigação do crime organizado e um proprietário de uma casa de apostas, ouvidos pela reportagem sob anonimato, confirmaram que o esquema criminoso se espalha por todo o Ceará.

O jogo do bicho foi praticado nos municípios cearenses por décadas ilegalmente, como uma contravenção penal, mas foi autorizado por uma lei estadual em 2019 e reforçado por uma decisão da Justiça Estadual, em 2021. Nos últimos anos, multiplicaram-se as casas de apostas esportivas.

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Devido a legalidade e o crescimento dos negócios, uma facção criminosa de origem carioca, instalada no Ceará, viu no mercado uma possibilidade de lucrar e obrigou que os estabelecimentos pagassem uma cota para funcionar em territórios dominados pelo grupo. Nem todas as empresas aderiram, e apenas duas foram autorizada a continuarem os trabalhos.

Reportagem do Diário do Nordeste publicada em novembro do ano passado detalhou que 25% da arrecadação de uma loteria era destinada à facção, em troca da exclusividade do negócio na área; que os proprietários dos estabelecimentos foram ameaçados; e que aqueles que não aderiram ao esquema criminoso, tiveram imóveis atacados por incêndios e disparos de armas de fogo.

Outras facções também entram no ramo

Em razão do sucesso financeiro obtido pela facção carioca, pelo menos outras duas organizações criminosas - nascidas no Ceará - também decidiram entrar no ramo, a partir de extorsões realizadas nas áreas em que já dominavam o tráfico de drogas, neste ano.

"As facções criminosas seguem as tendências de mercado. Quando alguém que cria um negócio que dá certo, vão aparecer concorrentes. No crime, não é diferente", afirma um investigador do crime organizado no Estado.

Proprietários de casas de apostas e do jogo bicho, que não tinham cedido à primeira facção, ficaram sem saída. Pelo menos oito empresas criaram a Cooperativa Cearense de Jogos (com o lema "Unidos somos mais fortes), controlada por uma facção cearense. Um informativo, espalhado pelo grupo criminoso pelas redes sociais, lista outras 20 empresas que estão proibidas de atuar nas suas áreas.

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Um vendedor que já participou do esquema criminoso detalha que as empresas que possuem de 10 a 20 cambistas têm de pagar uma taxa mensal de R$ 15 mil; e aquelas que têm de 30 a 50 cambistas, precisam pagar R$ 30 mil mensais. Esses valores chegam a representar 50% do faturamento de algumas empresas.

"Onde era a facção carioca, perdemos tudo. Onde era a facção cearense, fizemos o acordo. Tivemos que fazer, fomos coagidos, não tivemos saída. Já trabalhamos com isso há décadas. Perdemos muito dinheiro", conta o vendedor.

Segundo ele, representantes da facção recolhem os valores (acordados semanalmente ou mensalmente) na porta dos estabelecimentos, muitas vezes com uso de violência. Os vendedores temem pela suas vidas e de familiares. "Estamos com medo e pensando em se desfazer dos pontos", revela.

Prisões de suspeitos de integrar o esquema

Um empresário carioca e três agentes da segurança pública (dois policiais militares e um guarda municipal), que faziam a sua segurança, foram presos em flagrante, após disparos em via pública, no bairro Planlato Ayrton Senna, em Fortaleza, em 27 de janeiro deste ano.

Conforme as investigações policiais, o grupo é ligado a uma facção criminosa de origem cearense e era responsável por realizar a cobrança das casas de apostas. Em uma "ronda" pela Capital e Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) naquele dia, os suspeitos se depararam com rivais que tentavam tomar seus pontos, o que motivou os tiros efetuados pelo empresário José Bezerra de Araújo Júnior, conhecido como 'Júnior Carioca'.

No dia seguinte à prisão, 'Júnior Carioca' foi solto pela Justiça Estadual, em audiência de custódia, com aplicação de medidas cautelares (como o pagamento de R$ 24 mil de fiança). Em depoimento à Polícia, o suspeito confessou que trabalhava com casas de apostas, mas negou o envolvimento com facção e com jogo do bicho e que tenha disparado os tiros.

Os policiais militares presos foram identificados como Fábio Vieira Gomes e Antônio Cleonildo Castro do Nascimento. De acordo com o investigador do crime organizado ouvido pela reportagem, é comum a contratação de policiais militares para realizarem a segurança particular de criminosos ligados a esses negócios.

No último dia 28 de julho, uma investigação da Delegacia Municipal de Pentecoste e da Promotoria do Município descobriu que uma facção criminosa de origem carioca ordenou o fechamento de várias casas de apostas e de jogo do bicho, para depois reabrir os estabelecimentos sob o seu comando, em Pentecoste e Apuiarés.

Foram apreendidos maquinários de aposta, dinheiro e um veículo Fiat Toro, na operação
Legenda: Foram apreendidos maquinários de aposta, dinheiro e um veículo Fiat Toro, na operação
Foto: Arquivo Pessoal

O delegado Ronivaldo de Oliveira explica que a Polícia Civil "começou a receber denúncias que pessoas ligadas a uma facção criminosa estavam determinando o fechamento de casas de apostas e de jogo do bicho". 

"Ia um grupo de bandidos armados, ameaçava as pessoas, que se obrigavam a fechar os estabelecimentos. Pouco tempo depois, uma pessoa aparecia nesses lugares com uma solução, dizendo que era autorizado pela facção, e os negócios reabriam. A gente entendeu que estava tendo uma ligação entre essas pessoas e a facção", detalha

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suspeitos foram presos, na operação. Dois deles praticariam as ameaças, Carlos Gabriel Damasceno Sousa e Lucas de Oliveira Silva; e cinco seriam gerentes das casas de aposta, Antônio Thiago Martins Rodrigues, Antônio Keslley Freitas dos Santos, Francisco Márcio da Costa, Lucas Sousa Moreira e Francisca Ribeiro Saldanha.

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