Legislativo Judiciário Executivo

Por que focar em eleger deputados federais é mais lucrativo para os partidos

Divisão dos fundos partidário e eleitoral atrai atenção dos dirigentes partidários

Escrito por Igor Cavalcante , igor.cavalcante@svm.com.br
Partidos têm investido nas articulações em busca de ampliar as bancadas na Câmara
Legenda: Partidos têm investido nas articulações em busca de ampliar as bancadas na Câmara
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Apesar da corrida eleitoral pelo comando do Executivo (governos estaduais e presidência da República) ganhar sempre maior destaque nas disputas eleitorais, o foco das movimentações da maioria dos partidos está em reforçar as bancadas legislativas, principalmente na Câmara dos Deputados.

Além das atribuições históricas desses parlamentares, as siglas estão de olho nos recursos partidários, nas emendas orçamentárias e no poder de barganha com o Executivo, apontam analistas eleitorais.

Essa atenção às eleições proporcionais fica ainda mais clara no caso das legendas do chamado centrão, como o PP e o Republicanos. Siglas mais tradicionais, como o MDB, ou mesmo as que estão em processo de construção, como o União Brasil, também concentram esforços para eleger o maior número de deputados. 

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Atualmente, o PP tem 42 deputados eleitos, já o Republicanos soma 31. Ainda assim, as siglas não planejam lançar nomes para disputar o Palácio do Planalto. O União Brasil encara cenário semelhante. A sigla, formada pela fusão do DEM e do PSL, nasce como o maior partido da Câmara, com 81 cadeiras, mas não tem nome previsto para disputar o Executivo nacional.

Manutenção partidária

A explicação para esse movimento está na manutenção das atividades partidárias e no poder que o parlamento federal passou a ter nos últimos anos. Conforme o advogado e presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados - Secção Ceará (OAB-CE), Fernandes Neto, as duas principais fontes de recursos de uma sigla – os fundos eleitoral e partidário – dependem de bancadas amplas.

“Partidos do centrão, por exemplo, se preocupam mais com a candidatura de deputados, sem um projeto exatamente de poder, de enfrentar problemas reais. Busca-se, na verdade, a manutenção do acesso ao orçamento e aos recursos. Esse modelo posto atualmente, com fundos altos e emendas produz uma disfunção política”, critica o jurista. 

Fundo partidário

O fundo partidário é aquele que financia atividades rotineiras das legendas, como o pagamento de água, luz, aluguel, passagens aéreas, além de impulsionamento de conteúdo digital, contratação de contadores e advogados, entre outros. Ele também pode ser aplicado em campanhas eleitorais, caso a sigla consiga poupar o valor repassado.

Os recursos saem de dotações orçamentárias da União, multas e penalidades pecuniárias de natureza eleitoral, doações de pessoas físicas depositadas diretamente nas contas dos partidos (aquelas específicas para o Fundo) e outros recursos que eventualmente forem atribuídos por lei. 

“Esse fundo é repassado todos os anos aos partidos e está previsto no Orçamento Federal. Em 2021, o valor chegou a R$ 939 milhões, sendo que 95% desse valor é com base no tamanho da bancada e os outros 5% são repassados à maioria dos partido”, explica o jurista.

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Pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará (Lepem/UFC), Paula Vieira ressalta que esse é o motivo de os partidos dedicarem tanto esforço às eleições proporcionais.

"Quanto mais cadeiras, quanto mais representantes, mais recursos terá desse fundo. Esse dinheiro é direcionado ao diretório do partido, mas depende da quantidade de deputados. A referência é a Câmara”, destaca.

Cláusula de barreira

No entanto, conforme pondera o advogado eleitoral, nem todos os partidos são beneficiados. A divisão dos recursos é afetada pela chamada “cláusula de barreira”. Para ter acesso ao montante, pela regra, o partido  precisa ter, neste ano, pelo menos 2% dos votos válidos, distribuídos em ao menos um terço dos estados. 

A alternativa é eleger 11 deputados federais distribuídos em nove estados. Como a cláusula de barreira fica mais rígida com o passar do tempo, ela passa a exigir, em 2026, 2,5% dos votos válidos e, no mínimo, 3% a partir de 2030. Em 2018, o valor foi de 1,5% dos votos válidos.

Assim, superada a cláusula de barreira, os partidos ganham o “direito” de receber o fundo partidário. O tamanho da fatia abocanhada por cada sigla, no entanto, varia. Ao todo, 5% é distribuído a todas as siglas em partes iguais. O restante é proporcional ao número de deputados eleitos.

Fundo eleitoral

Já o fundo eleitoral é mais recente. Ele foi criado em 2017 após o fim do financiamento das campanhas eleitorais por pessoas jurídicas. A distribuição dos recursos segue os critérios previstos na Lei das Eleições. O total desse montante, conforme a Lei Orçamentária Anual de 2022, é de R$ 4,9 bilhões. Esse valor é mais que o dobro enviado aos partidos nas eleições de 2018, quando o montante foi de R$ 1,7 bilhão. 

“O fundo eleitoral vem aumentando bastante, o que faz os partidos terem mais interesse. Isso representa uma mudança na perspectiva de poder, porque tornou-se mais interessante ter acesso a esse fundo, sem falar na influência dos parlamentares no Orçamento, com as emendas de bancadas, emendas individuais e, principalmente, as emendas de relator”, aponta o advogado. 

R$ 4,9 bi
É o valor do fundo eleitoral aprovado para este ano

“O fundo eleitoral beneficia todos os partidos, mas, analisando a própria legislação, que distribui 95% (no caso do fundo partidário) e 98% (do fundo eleitoral) dos recursos com base nas bancadas, é possível notar como fica muito limitado para os pequenos partidos. O fundo já era concentrado nos partidos grandes, com a cláusula de barreira ficou ainda mais”, avalia Fernandes Neto. 

Neste caso, 2% dos recursos são divididos para todos os partidos políticos do Brasil em parcelas iguais. Outros 35% são rateados entre as legendas que contam com pelo menos um deputado federal, seguindo a proporção de votos que cada partido recebeu nas eleições anteriores.

As siglas com representação na Câmara dos Deputados recebem ainda 48% conforme o tamanho das respectivas bancadas. Os 15% que restam são distribuídos proporcionalmente à representação dos partidos no Senado Federal.

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