Legislativo Judiciário Executivo

Eduardo Appio pedirá transferência da vara da Lava Jato após admitir conduta imprópria

Na prática, o juiz assume responsabilidade por um desvio genérico, mas não reconhece uma falta administrativa específica ou a autoria da ligação a filho de desembargador

Escrito por Diário do Nordeste/Estadão Conteúdo ,
Juiz Eduardo Appio. Eduardo Appio pedirá transferência da vara da Lava Jato após admitir conduta imprópria
Legenda: Magistrado disse que solicitará transferência para vara 'menos polêmica'
Foto: Divulgação/JFPR

O juiz Eduardo Fernando Appio assinou um acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nessa quarta-feira (18), em que desiste de reassumir o que restou da Operação Lava Jato. Após admitir conduta imprópria no comando da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, ele disse que pedirá transferência para outra "menos polêmica".

O magistrado, conhecido por ser crítico à operação federal, assumiu os processos remanescentes dela em fevereiro deste ano, mas logo foi afastado do cargo, suspeito de tentar investigar informalmente um desembargador do Tribunal Regional Federal da 4 ª Região (TRF4), próximo do ex-juiz Sergio Moro.

Na prática, ao admitir 'conduta imprópria', o juiz assume a responsabilidade por um desvio genérico, mas não reconhece uma falta administrativa específica ou a autoria da ligação ao filho do desembargador Mauro Malucelli. O telefonema (veja trecho abaixo) foi o ponto de partida da apuração contra o juiz no CNJ.

Veja também

Com o acordo firmado com o Conselho, Appio desiste oficialmente de reassumir o comando do que restou da Lava Jato. Ao Estadão, ele informou que não reconheceu culpa no caso e que pedirá remoção para outra vara "menos polêmica".

A expectativa é que o processo administrativo seja encerrado assim que ele for transferido, o que depende dos trâmites no TRF4. 

Suposta ligação para filho de desembargador

Appio teria ameaçado João Eduardo Barreto Malucelli, filho do desembargador federal Marcelo Malucelli, por telefone. Eduardo é sócio do escritório de advocacia do senador Sérgio Moro (União Brasil), ex-juiz da Lava Jato.

O caso foi denunciado pelo desembargador à Corregedoria Regional. Os detalhes do processo foram obtidos com exclusividade pela jornalista Andréia Sadi, da Globonews.

Segundo o g1, a ligação aconteceu no dia 13 de abril. Um dia antes, Appio havia sido notificado sobre correições parciais contra ele, em um caso que tinha como relator o pai de João Eduardo Malucelli. 

No telefonema, uma pessoa pede a João o contato de seu pai, Marcelo, se apresentando como servidor da Justiça Federal. João questiona se a pessoa é mesmo servidora e, em resposta, ouve: "E o senhor tem certeza que não tem aprontado nada?".

Conforme o TRF-4, com apuração da Polícia Federal, a voz de quem fez a ligação "se assemelha" à voz de Appio. Veja, a seguir, a transcrição do diálogo:

— João Malucelli: Me desculpe, o senhor tá ligando sem ID do chamador, eu ‘num’ ‘num’ não faço ideia quem quem seja.
— Voz 1: ‘Ah’ mas o s... o senhor, tudo bem. Mas consta o senhor aqui como sendo um dos filhos e consta aqui o seu número. Então, nós estamos ligando pra isso.
— João Malucelli: ‘Hum’, mas, assim, eu não, eh... essa história tá bem estranha, viu? Me desculpe, com todo respeito, mas é... se o Marcelo...
— Voz 1: Como é que eu teria o seu telefone aqui, é... é uma questão só de imposto de renda. Ah, se o senhor quiser eu ligo diretamente pro seu pai, não tem problema ligo (incompreensível)...
— João Malucelli: Então, então acho melhor o senhor fazer isso, né?
— Voz 1: Então eu faço isso, ligo diretamente pro seu pai e faço isso, eu só não queria incomodar, que aqui consta o seu número, seu nome, seu CPF e a questão de resíduos do passado de despesas médicas, a ideia era não incomodar. Mas se o senhor prefere assim, liga... nós ‘tamo’ só utilizando aqui um sistema aqui [...]
— João Malucelli: O senhor ligou e falou, eu gostaria de falar com o Marcelo Malucelli, agora o senhor tá falando que aparece aí que eu sou filho. Então assim, fica fica meio ambíguo, né? Até ah...
— Voz 1: É ah... o contato que eu tenho do do do doutor Marcelo Malucelli deve ser um contato antigo, aparece o seu telefone, então por isso que eu li... nós estamos ligando...
— João Malucelli: Não, esse número nunca foi do Marcelo Malucelli, senhor, me perdoa.
— Voz 1: Mas se o senhor prefere eu ligo pro seu pai diretamente, eu só não gostaria de incomodá-lo, só isso.
— João Malucelli: Tá bom, claro. Pode ligar então. Faça o que for melhor.
— Voz 1: Então eu ligarei, digo que eu falei com o senhor, digo que falei com o senhor e que o senhor me autorizou a ligar pra ele, incomodá-lo no próprio tribunal.
— João Malucelli: Ah pode pode falar. Incomodá-lo! Qual é o nome do senhor mesmo? Fernando Pinheiro Gonçalves, né?
— Voz 1: Isso [...] Pode pode chamar aqui no setor de saúde que nós estamos aqui.
João Malucelli: Setor de saúde, Fernando Pinheiro Gonçalves. Tem certeza que esse é o nome do senhor?
— Voz 1: Tenho certeza absoluta
— Voz 1: E o senhor tem certeza que que não não tem aprontado nada?

Assuntos Relacionados