Legislativo Judiciário Executivo

CPI do INSS: três pontos para entender articulação da oposição contra fraude no governo

Grupo almeja a instalação de uma Comissão Mista para apurar descontos indevidos em aposentadorias e pensões

Escrito por
Marcos Moreira marcos.moreira@svm.com.br
Investigações apontam a existência de irregularidades relacionadas aos descontos de mensalidades associativas aplicados sobre os benefícios previdenciários
Legenda: Investigações apontam a existência de irregularidades relacionadas aos descontos de mensalidades associativas aplicados sobre os benefícios previdenciários
Foto: José Cruz/Agência Brasil

O escândalo que escancarou o esquema de descontos não autorizados em aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) motivou novas investidas da oposição contra o governo Lula (PT), principalmente de lideranças ligadas ao Partido Liberal (PL). É nesse sentido que os parlamentares do grupo buscam, atualmente, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o caso. 

Diante das revelações das fraudes, o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi (PDT) e o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, já deixaram os cargos. A ideia da CPI é justamente apurar a possível responsabilidade deles e de outros envolvidos nos desvios. 

Inicialmente, a movimentação dos políticos ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) mirava a criação de uma CPI na Câmara dos Deputados. No entanto, os parlamentares já admitem que o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), pretende respeitar a fila de pedidos para abertura de Comissões — atualmente com 12 requerimentos. Além disso, apenas cinco CPIs podem funcionar simultaneamente na Câmara Baixa.

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Por conta dessa dificuldade, o grupo já almeja a instalação de uma CPI mista, que é formada por deputados e senadores. Assim, a responsabilidade da abertura ou não passaria para o senador Davi Alcolumbre (União-AP), que preside o Congresso Nacional. 

CRISE NO INSS

Em 23 de abril, uma operação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU) constatou que associações que oferecem serviços a aposentados cadastravam beneficiários sem autorização e com assinaturas fraudulentas para descontar mensalidades dos benefícios pagos pelo Instituto Nacional.

O esquema teria iniciado em 2019, ainda na gestão de Jair Bolsonaro (PL), e teria prosseguido no atual governo. O prejuízo aos aposentados é estimado em R$ 6,3 bilhões — o montante total dos descontos não autorizados ainda será apurado. 

Em síntese, as fraudes aconteciam da seguinte forma: entidades sem estrutura falsificavam assinaturas para "associar" aposentados sem autorização, o que depois resultava em descontos indevidos de mensalidades. Assim, as supostas organizações ofereciam serviços de assistência jurídica para aposentados, bem como descontos em planos de saúde, por exemplo.

Por meio da ‘Operação Sem Desconto’, foram cumpridos 211 mandados judiciais de busca e apreensão, ordens de sequestro de bens no valor de mais de R$ 1 bilhão e seis mandados de prisão temporária no Distrito Federal e nos estados de Alagoas, Amazonas, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe, segundo a PF. Além de Stefanutto, cinco servidores públicos foram afastados de suas funções após a ação.

Diante dos desdobramentos da operação, a Controladoria-Geral da União (CGU) suspendeu todos os acordos de Cooperação Técnica firmados entre o INSS e entidades envolvidas. Ao todo, a estimativa é de que 11 associações teriam cometido irregularidades e, por conta disso, tiveram contratos cancelados.

Inicialmente, Carlos Lupi permaneceu à frente do cargo. No entanto, ele pediu demissão em 2 de maio, afirmando que tomou a decisão sem que seu nome tivesse sido citado nas investigações. A pressão sobre ele aumentou ainda mais após uma reportagem do Jornal Nacional, da TV Globo, revelar em 26 de abril, que o ministro foi avisado das denúncias em junho de 2023, mas teria levado quase um ano para tomar as primeiras providências. 

Após a exoneração, Wolney Queiroz (PDT-PE) assumiu o Ministério — até então ele era secretário-executivo da Pasta. Já o procurador federal Gilberto Waller Júnior assumiu como novo presidente do INSS.

Lula e Gleisi com o nome ministro da previdência
Legenda: Lula nomeou o novo ministro na sexta-feira (2)
Foto: Ricardo Stuckert

O QUE QUER A CPI E QUEM JÁ ASSINOU O PEDIDO

Conforme a oposição, o objetivo é criar a Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o esquema de fraudes em benefícios previdenciários, além de apurar possíveis falhas nos sistemas de controle e responsabilizar agentes públicos ou privados envolvidos nas irregularidades.

A proposta para a CPI no âmbito da Câmara dos Deputados era encabeçada pelo deputado federal Coronel Chrisóstomo (PL-RO). Ainda na semana passada, o parlamentar anunciou que o requerimento para a instalação já contava com 185 assinaturas — número que superaria o mínimo necessário de 171.

Entre os nomes divulgados, estão quatro políticos da bancada federal do Ceará

  • André Fernandes (PL)
  • Dr. Jaziel (PL)
  • Dayany Bittencourt (União)
  • Matheus Noronha (PL)

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Com a mudança de rota para a instalação de uma CPI mista, a deputada federal Coronel Fernanda (PL-MT) e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) passaram a liderar a empreitada. Em publicação conjunta, a dupla anunciou que já reuniu as assinaturas necessárias — 27 senadores e 171 deputados federais, pelo menos. No entanto, a lista completa de apoio à CPMI ainda não foi divulgada nos canais oficiais. 

“Conquistamos as assinaturas necessárias para o requerimento de urgência da CPMI do INSS. É o primeiro passo rumo à verdade sobre os descontos ilegais que atingiram milhares de aposentados e pensionistas. Vamos apurar responsabilidades, cobrar justiça e garantir que esse dinheiro volte para quem realmente precisa”
Deputada federal Coronel Fernanda (PL-MT)
Autora do pedido de abertura da CPMI do INSS

De acordo com o Senado Federal, as CPIs têm poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, podendo:

  • Realizar diligências que julgar necessárias;
  • Convocar Ministros de Estado;
  • Tomar o depoimento de qualquer autoridade;
  • Inquirir testemunhas, sob compromisso;
  • Ouvir indiciados;
  • Requisitar de órgão público informações ou documentos de qualquer natureza; 
  • Requerer ao Tribunal de Contas da União a realização de inspeções e auditorias que entender necessárias.

A legislação aponta que, a partir da conclusão dos trabalhos, a comissão deve encaminhar o relatório final ao Ministério Público ou à Advocacia-Geral da União para que os órgãos, a partir disso, promovam a responsabilidade civil e criminal dos infratores ou adotem outras medidas legais.

Entretanto, a CPI não tem poder de julgar ou punir investigados. Além disso, não pode processar e nem determinar medidas cautelares, como prisões provisórias, ou outras medidas que dependem de decisão judicial.

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O QUE É PRECISO PARA INSTALAR A CPI 

A partir da reunião de assinaturas necessárias, o requerimento pode ser protocolado junto ao Congresso Nacional. Em seguida, caberá a Davi Alcolumbre a decisão de ler o documento durante sessão conjunta da Câmara e do Senado. Somente após a leitura, a CPMI poderá ser oficialmente instalada. Ainda não há previsão para que isso ocorra, embora a oposição avalie que o processo será mais rápido do que se a Comissão estivesse a cargo de Hugo Mota. 

Após ser oficialmente instalada, é feito o cálculo de proporcionalidade partidária, quando o presidente da Casa solicita aos líderes a indicação dos membros. Na sequência, a primeira reunião do colegiado será realizada para a eleição do presidente e do vice da CPMI, além da designação do relator posteriormente.

Inicialmente, uma CPI tem o prazo de 120 dias, prorrogável por até metade para conclusão dos trabalhos. Essa prorrogação depende de deliberação do Plenário da Casa.

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