BNB tem prejuízo de R$ 683 mi com crédito irregular
Maioria das empresas envolvidas é do setor energético, inclusive, já investigadas pela Operação Lava Jato
O Banco do Nordeste do Brasil (BNB) teria prejuízo de pelo menos R$ 683 milhões devido à concessão de créditos fraudulentos, denunciaram, nessa sexta-feira, o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Ceará (MPCE). Os financiamentos concedidos de modo irregular a mais de dez empresas - a maioria do setor energético - somariam cerca de R$ 1,5 trilhão.
De acordo com Oscar Costa Filho, procurador da República, as práticas criminosas se dariam mediante à manipulação das notas de risco das empresas e à desobediência aos normativos internos do banco, como exigências de garantias para que os empréstimos tivessem segurança. As operações investigadas teriam se iniciado em 2003 e continuado em gestões posteriores.
"O Banco do Nordeste, há algum tempo, enfrenta o desvio de valores vultosos através da concessão ilegal de créditos. Os balanços das empresas eram maquiados para manipular a capacidade de crédito de cada uma, os diretores cobravam, inclusive, propina para conceder esses empréstimos", relatou o promotor de Justiça Ricardo Rocha.
Segundo Oscar Costa Filho, o órgão já investiga o caso há mais de três anos e tem enfrentado dificuldades por conta de um impasse na Justiça. "Das seis ações de improbidade que demos entrada, duas foram rejeitadas por entender que não havia elementos suficientes; e as demais não foram aceitas porque o juiz entende que a competência é da Justiça Estadual", explicou.
Lentidão
Na esfera da Justiça Estadual, o promotor Ricardo Rocha entrou com uma ação de medida cautelar para quebra do sigilo bancário de dois diretores do banco em maio de 2014, ação que só veio a ter o primeiro despacho do juiz um ano e dois meses depois de ter sido protocolada.
Para superar a situação, MPF e MPCE resolveram entrar com uma ação conjunta no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para que a instituição decida em qual instância o processo deve correr. "Vamos pedir que o relator já decida, em caráter liminar, pela urgência do fato. Daqui para o final do processo, muita coisa pode acontecer", pontuou.
Casos
Um dos casos, segundo os procuradores, é o da empresa espanhola Ventos Brasil Geração e Comercialização de Energia Elétrica S/A, cuja nota foi rebaixada pelo banco em março de 2013 de "B" para "C", de forma destoante da sistemática utilizada pela instituição financeira.
Conforme o processo, o dono da empresa à época afirmou ter sido procurado por um consultor que não era do quadro pessoal do banco, que teria informado a ele que a empresa somente seria aprovada se houvesse o pagamento de uma comissão correspondente a 2,5% do financiamento. A matéria foi rejeitada pela Justiça Federal por falta de provas. O MPF está recorrendo.
Procurada pela reportagem, a Ventos Brasil informou que o financiamento tomado pela empresa seguiu todos os trâmites regulares junto ao BNB, em conformidade com a Lei e os normativos internos; apresentou e constitui todas as garantias e condições exigidas pelo BNB para liberação do financiamento concedido; e encontra-se adimplente com todas as suas obrigações com o banco.
A empresa ainda destacou entender que há um equívoco ao citarem seu nome, uma vez que jamais foi notificada ou convocada para se manifestar a respeito de qualquer suposta concessão de crédito fraudulento; é controlada por uma multinacional, e desenvolve suas atividades de forma correta e honesta, preservando os princípios morais e éticos; que não pagou e jamais pagará qualquer propina; é auditada por uma empresa de auditoria internacional, e adota regras claras de transparência; e está à disposição da justiça e do ministério público para prestar quaisquer esclarecimentos que venha a ser requerida.
Noutro caso, a classificação global da G Brasil Participações S/A teria sido alterada de "D" para "C" em setembro de 2012, o que a favoreceu para receber o financiamento de R$ 99 milhões. De acordo com o promotor Ricardo Rocha, pouco tempo depois, a empresa entrou com um pedido de recuperação judicial, o que possibilitou a renegociação do débito e gerou um prejuízo de R$ 96 milhões à instituição. A empresa foi procurada pela reportagem, mas, até o fechamento da matéria, não enviou uma resposta.
Além dessas duas empresas, também são investigadas preliminarmente no processo: Vale Grande Indústria e Comércio de Alimentos; Rede Energia e a sua controladora, Celpa; Gusa Nordeste; e Energio Nordeste Energia, que também é investigada pela Operação Lava Jato.
Em nota, a Energio disse que "nunca celebrou qualquer contrato de crédito com o BNB ou com qualquer outro banco público. Portanto, nunca foi devedora de qualquer valor em relação ao referido banco".
A Celpa, também por meio de nota enviada à reportagem, informou que tem como controladora a Equatorial Energia e que não possui mais vínculos com a Rede Energia. A reportagem entrou em contato com todas as demais empresas citadas, mas nenhuma respondeu a tempo.
Falta de cobrança
Além de conceder empréstimos fraudulentos, o MPF e o MPCE ainda apuram a ausência da cobrança dos títulos pelo banco. "Esses créditos não foram cobrados porque eles não foram concedidos para serem pagos", declarou o procurador Oscar Costa Filho. "Inclusive, muitos títulos sumiram nesse tempo".
Resposta do BNB
"Em relação às notícias divulgadas nos últimos dias sobre operações de crédito firmadas no período de 2008 a 2011, o Banco do Nordeste informa que todas as operações já foram ou estão sendo apuradas e que, sistematicamente, comunica os resultados dos trabalhos aos órgãos de controle. Destaca que, uma vez identificadas irregularidades, o Banco adota todas as medidas administrativas e judiciais cabíveis", afirmou, por meio de nota, a instituição financeira.