Pesquisadores descobriram uma potencial variante de interesse do Sars-CoV-2 no Brasil. A cepa possui a mutação E484K, tida como de maior atenção e também achada nas variantes P.1 (identificada no Brasil) e B.1.351 (observada primeiramente na África do Sul).
A nova variante foi identificada primeiro em São Paulo, em 11 de novembro de 2020, conforme pesquisa publicada no fórum de discussões Virological. Os pesquisadores estimam que a cepa tenha se originado nos estados de São Paulo, Bahia ou Maranhão em agosto.
Mesmo já circulando há algum tempo, os pesquisadores afirmam que a VOI N.9 (expressão que traduzida do inglês significa variante de interesse N.9) não é muito prevalente no Brasil. De acordo com o estudo, ela foi encontrada, até o momento, em dez estados: Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Bahia, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, São Paulo e Santa Catarina.
A mutação E484K na proteína S (que se liga às células humanas para ocorrer a invasão) desperta atenção por ter sido associada a uma possível fuga imunológica.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já emitiu um alerta recentemente sobre o assunto. "As mutações encontradas na variante P.1 podem reduzir a neutralização por anticorpos; no entanto, estudos adicionais são necessários para avaliar se há mudanças na transmissão, severidade ou ação de anticorpos neutralizantes como resultado dessa nova variante", afirmou a entidade.
Ação da variante contra vacinas
A ação da mutação já foi estudada em laboratório em relação às vacinas da Pfizer/BioNTech e Moderna. Foi verificada redução nas taxas de anticorpos neutralizantes presentes no soro de indivíduos que receberam os imunizantes.
"Temos que continuar estudando e vigiando essa variante, mas ela não apresenta ainda algumas outras mutações relacionadas, por exemplo, com maior transmissibilidade", afirma Marilda Mendonça Siqueira, pesquisadorauz do laboratório de vírus respiratório e sarampo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e uma das autoras da pesquisa.
Segundo Fernando Spilki, virologista professor da Universidade Feevale (RS) e coordenador da Rede Corona-ômica, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), a cepa, até o momento, pode ser definida como uma variante de interesse e não variante de preocupação. Isso em razão da baixa presença da variante no País — encontrada somente em cerca de 3% das amostras analisadas desde novembro de 2020.
Preocupação
Mesmo que a VOI N.9 ainda não desperte preocupação, outras variantes presentes em território brasileiro, como as citadas P.1 e B.1.351, além da B.1.1.7 (identificada no Reino Unido), trazem o sentimento. Outro estudo da Fiocruz afirma que, neste momento, tais cepas já dominam pelo menos sete estados do País.
Apesar de muitas melhorias terem de ser feitas na vigilância genômica brasileiro, Siqueira afirma que o País tem conseguido acompanhar cepas que merecem atenção em espaço de tempo relativamente curto. A preocupação, porém, é o grave momento de total descontrole da pandemia no Brasil, o que pode levar ao surgimento de muitas outras variantes.
"Se a pandemia continuar com essa transmissibilidade, com uma parte das pessoas não preocupada com uso de máscara, com distanciamento, isso vai facilitar que o vírus se transmita mais, se multiplique mais em diferentes organismos humanos, o que pode aumentar a chance de nós termos mais variantes no nosso país", diz Siqueira.
Aumento de casos no País
A nova onda da Covid-19 fez explodir o número de mortes em grandes cidades do País, e é na multiplicação que mora o problema. Erros no processo de cópia do material genético acabam gerando as mutações ao acaso, muitas vezes inúteis, mas outras, com potencial de melhorias na capacidade de disseminação do vírus, por exemplo. Dessa forma, quanto mais um vírus circula e se multiplica, maior é chance de aparecerem mutações.
Spilki diz que o espaço dado para o vírus circulas e medidas de restrição insuficientes fizeram com que agora tenhamos que conviver com variantes nacionais mais preocupantes, como a P.1 e a P.2 (observada no Rio de Janeiro e também com a mutação E484K). "Realmente seria necessário que tivéssemos adotado medidas muito mais eficazes para tentar conter a diversificação do vírus", afirma Spilki.