Melatonina: O que é, para que serve, como tomar

A substâncias produzidas pelo organismo é responsável por regular o sono e outras funções

Escrito por Carol Melo , carolina.melo@svm.com.br
Mulher negra dormindo em cama com lençóis brancos
Legenda: A liberação do hormônio no sistema está diretamente ligado a exposição a luz
Foto: Shutterstock

Prevenção de doenças crônicas, redução do estresse e mais qualidade de vida são alguns dos benefícios associados a uma boa noite de sono. Estudos científicos apontam que um adulto deve dormir, em média, 8 horas por dia, sem interrupções. Algumas substâncias produzidas pelo organismo são responsáveis por regular o repouso do corpo  uma delas é a melatonina.

Conhecida como hormônio do sono, ela é produzida na glândula pineal, que fica localizada entre as sobrancelhas e é responsável por sincronizar o "relógio interno" baseada no ciclo claro-escuro. Ou seja, a liberação da substância no sistema está diretamente ligada à exposição a luz, logo, a quantidade de melatonina no corpo aumenta ao anoitecer, provocando sonolência.

Ambientes muito iluminados ou o uso de dispositivos, como computadores e celulares, durante a noite podem causar alterações no relógio biológico, não só pela luz, mas pelos estímulos. Esses podem ser alguns dos casos em que a suplementação com a melatonina pode auxiliar e facilitar que o indivíduo durma bem.

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O que a melatonina faz no corpo e onde é produzida 

Homem dormindo em cama com lençóis azuis
Legenda: O pico de produção da substância aumenta entre 20 e 21 horas
Foto: Shutterstock

Derivada da serotonina — neurotransmissor responsável por estimular o sistema serotoninérgico, relacionado a humor e bem-estar —, a melatonina é um hormônio confeccionado pela glândula pineal e atua no ciclo vigília-sono, conforme a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). Basicamente, ela sinaliza ao organismo que a noite chegou. 

O pico de produção da substância aumenta entre 20h e 21 horas, segundo o nutrólogo Fernando Guanabara*, que explica que ela é importante para a manutenção da homeostase metabólica — processo de estabilidade fisiológica do organismo.

A falta da substância no corpo ou o comprometimento da qualidade do sono pode interferir na composição corporal e desencadear diversos efeitos maléficos ao indivíduo.  

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O hormônio pode ser encontrado em pequenas concentrações nos alimentos, como morango, cereja, uva, banana, abacaxi, laranja, mamão papaia, manga, tomate, azeitona, cereais, vinhos, carne (frango, carneiro, porco), leite de vaca e outros produtos alimentícios, conforme a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A melatonina também pode ser produzida sinteticamente, e, desde outubro deste ano, é comercialização em forma de suplemento alimentar, após a liberação da agência reguladora brasileira. 

Para que serve a melatonina 

Tratar transtornos do sono 

Segundo o nutrólogo, o hormônio favorece a melhora da qualidade do sono, facilitando que o usuário entre mais facilmente no sono REM — fase considerada fundamental para a manutenção das funções cognitivas, como memória, criatividade e a capacidade de aprender, além de proporcionar bem-estar.

O uso clínico da melatonina é indicado, conforme a SBEM, no tratamento de alguns distúrbios do sono, como insônia por fase retardada, ciclo vigília-sono com períodos diferentes de 24h, latência prolongada para o sono, fragmentação do sono, distúrbios comportamentais do sono REM e correções do sono do idoso.

Devido à função cronobiótica, isto é, um agente capaz de sincronizar circadianamente muitas funções do organismo, ela também tem sido usada na correção dos distúrbios causados pelo "jet-lag" — distúrbio do sono que pode afetar pessoas que viajam rapidamente em vários fusos horários. 

Distúrbios causados pela cegueira  

As desordens do sistema visual aferente são classificadas em pré-quiasmáticas, quiasmáticas e retroquiasmáticas. Geralmente, as lesões pré-quiasmáticas são as que apresentam comprometimento da acuidade visual (AV) — capacidade de percepção de objetos e formas — por refletirem a função macular, região no centro da retina que permite que uma pessoa possa ver detalhes.

Nesse tipo de cegueira é observado com frequência a dessincronização entre o ciclo vigília-sono e o dia e a noite, condição em que o uso da versão sintetizada da melatonina pode auxiliar no tratamento, segundo a SBEM. 

Tratar depressão 

Mulher dormindo enquanto viaja em um jatinho particular
Legenda: A substância é usada na correção dos distúrbios causados pelo "jet-lag"
Foto: Shutterstock

As pesquisas científicas sobre o papel fisiológico da melatonina, o uso dela e dos análogos farmacológicos como agentes terapêuticos na clínica médica têm se expandido enormemente. Assim, a versão sintética do hormônio e os análogos têm sido usados no tratamento em distúrbios depressivos, conforme a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.

A substância também tem sido utilizada contra certos tipos enxaqueca, anestesia, e como um coadjuvante no tratamento antitumoral e/ou antimetastático, além de como um poderoso agente limitador das lesões pós-isquêmicas — associadamente à hipotermia no caso da hipóxia e isquemia perinatais, na displasia broncopulmonar do prematuro, AVC —, em doenças metabólicas, síndrome do ovário policístico, etc. 

Estimular o crescimento

A sigla GH (Growth Hormone) se refere ao hormônio do crescimento. Ele é produzido pela glândula hipófise, situada na base do crânio, e está presente em todas as pessoas. É indispensável durante o período de crescimento e sem ele a estatura adulta normalmente não pode ser alcançada, conforme SBEM.

Um sono de qualidade estimula a produção do GH, logo, a melatonina auxilia no crescimento, explica o nutrólogo. Como a produção do endógeno acontece principalmente durante a noite, ter bons níveis da substância favorece a fabricação do hormônio responsável pelo crescimento. 

Além de ser um importante agente regulador do ciclo vigília-sono, a melatonina é um antioxidante que auxilia no controle dos radicais livres — moléculas altamente instáveis liberadas pelo metabolismo que podem causar doenças degenerativas. Conforme Fernando Guanabara, devido a essa ação, ela consegue prevenir o aparecimento de diabetes tipo 2, Alzheimer, Parkinson e alguns cânceres.

O efeito antioxidante combinado às propriedades antiamiloidogênica, neurotrófica e neuroplástica do hormônio, listados pela SBEM, possibilitam que ele seja usado como um coadjuvante terapêutico no tratamento de doenças neurológicas e degenerativas — como transtornos do espectro autista, Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), a síndrome de Smith-Magenis (SMS), etc —, que resultam em distúrbios do sono e dos ritmos biológicos circadianos.

Retardar envelhecimento 

Idoso com insônia
Legenda: A produção da melatonina cai em pessoa idosas, que acabam por sofrer mais com distúrbios do sono
Foto: Shutterstock

Além de causar doenças crônicas, os radicais livres danificam as células, acelerando o processo de envelhecimento. Devido ao efeito antioxidante, a melatonina atua no combate ao envelhecimento precoce.

Distúrbios do sono também auxiliam nesse processo, ao alterar a liberação de cortisol — hormônio que atua no controle do estresse, reduz inflamações, auxilia o sistema imunológico e equilibra a pressão arterial. O que, segundo Fernando Guanabara, acelera o envelhecimento, aumenta retenção de líquidos, edema, inchaço e cansaço.

A partir dos 60 anos a produção do hormônio cai e chega a ser 25% menor do que em jovens. A suplementação da substância pode auxiliar no tratamento de distúrbios do sono em idosos.

Recuperação muscular 

Quem não dorme bem e não consegue manter bons níveis de melatonina pode acordar cansado, fadigado, indisposto, além de ter retenção, inchaço, mais fome, menos saciedade, aumento da termogênese, e, consequentemente, um ganho de peso, segundo o nutrólogo.

Uma noite de sono de qualidade é reparadora para organismo e auxilia na recuperação muscular, detalha o especialista.

Distúrbio no metabolismo e diabetes 

Nos últimos 20 anos, acumularam-se evidências experimentais e algumas clínicas, sobre o importante papel da melatonina na regulação do metabolismo energético, conforme a SBEM. Assim, animais ou indivíduos que apresentam ausência ou redução da produção do hormônio, desenvolvem resistência insulínica, intolerância à glicose, distúrbios na secreção de insulina, dislipidemia, distúrbios do balanço energético e obesidade.

Além disso, a habitual distribuição diária do metabolismo associada ao ciclo vigília-sono e ao ciclo de ingestão alimentar-jejum desaparece completamente. Ou seja, o ciclo metabólico diário caracterizado por uma fase que associa temporalmente o aumento da sensibilidade insulínica e aumento na secreção estimulada por glicose ao grande surto diário de alimentação, e por outra fase que associa a resistência insulínica, principalmente hepática, e a subsequente neoglicogênese ao período de sono ou repouso, desaparece completamente, caracterizando um quadro onde há uma perturbação da ritmicidade circadiana, chamado cronorruptura.

Dessa forma, a ausência ou redução na produção de melatonina provoca distúrbios metabólicos e distúrbios rítmicos circadianos que acabam intensificando uns aos outros, e culminando em uma das consequências imediatas desse círculo vicioso que é a ocorrência da obesidade.

Como tomar?  

Homem usando celular na cama, antes de dormir
Legenda: Ambientes muito iluminados ou o uso de dispositivos, como computadores e celulares, durante a noite podem causar alterações no relógio biológico
Foto: Shutterstock

Segundo Fernando Guanabara, a substância deve ser tomada a partir de uma prescrição médica, pois o profissional da saúde poderá avaliar qual a dose personalizada indicada para o paciente, considerando a indicação e as contraindicações.

Para tratar distúrbios do sono, fabricantes aconselham que a dose de 0,21 mg seja administrada uma vez ao dia, preferencialmente antes de dormir.

Efeitos colaterais 

Os efeitos adversos mais frequentes relacionados ao consumo da suplementação de melatonina, segundo a agência francesa de alimentação, desenvolvimento, saúde e segurança ocupacional (ANSES, da sigla em francês), são dores de cabeça, tonturas, sonolência, tremores, enxaqueca, náusea, vômito, dor abdominal, pesadelos e irritabilidade.

Na maior parte dos suplementos, a substância estava associada a outros ingredientes. Assim, é destacado que a ocorrência dos efeitos adversos pode ter sido facilitada por interações entre os diferentes componentes do suplemento ou entre o suplemento e outros medicamentos consumidos concomitantemente.

Contraindicações 

Conforme a Anvisa, há preocupações de uso do hormônio sintetizado por indivíduos que apresentem problemas hepáticos, cardiovasculares, renais ou doenças autoimunes, quadros de depressão e distúrbios convulsivos.

Pessoas com epilepsia, asma ou que sofrem de transtornos de humor, comportamento ou personalidade, ou qualquer pessoa em tratamento com medicamentos, devem procurar aconselhamento médico sobre o consumo de melatonina na forma de suplementos alimentares.

A utilização do suplemento de melatonina é contraindicada para gestantes, lactantes e indivíduos menores de 18 anos, conforme a agência regulatória. No entanto, Fernando Guanabara, afirma ser possível que a substância seja prescrita para criança, adolescentes e grávidas, desde que o paciente passe por uma avaliação médica e ela seja prescrita pelo profissional.

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Sobre a caracterização do perigo, estudos realizados com animais mostraram baixa toxicidade aguda da substância e ausência de características genotóxicas. O risco carcinogênico foi considerado como mínimo pelas Autoridades Europeia e Australiana, considerando dentre outros aspectos, que o uso dela não deve ser contínuo nem por longo período.

Em relação aos resultados dos estudos em humanos, diversas metanálises que avaliaram a eficácia do uso do hormônio indicam que o consumo da melatonina pode ser considerado seguro por curtos períodos, de até 3 meses

Interações e cuidados ao tomar melatonina 

Mulher dormindo em cama com lençóis azuis
Legenda: Melatonina é um antioxidante que auxilia no controle dos radicais livres
Foto: Shutterstock

As informações a respeito do potencial de interação da melatonina com outros medicamentos ou suplementos alimentares ainda são insuficientes, conforme a Anvisa. Devido às muitas interações farmacocinéticas e farmacodinâmicas possíveis entre ela e certos 94 medicamentos, o uso como suplemento alimentar associado à terapia medicamentosa não é recomendado sem que um médico seja consultado.

Também foram encontradas recomendações sobre a não utilização da melatonina concomitantemente com outros suplementos alimentares, a fim de limitar os riscos de interação. 

Dosagem  

A Anvisa liberou a comercialização como suplemento da dosagem de 0,21 mg, quantidade parecida com a produzida fisiologicamente. Em continentes como Europa, as doses à venda mais comuns são de 1 mg ou 2 mg e, enquanto nos Estados Unidos, as doses costumam ser de 3 mg, 5 mg e até 10 mg.

No mercado brasileiro, é possível encontrar a substâncias em formato de comprimidos, em cápsula e em gotas a venda em farmácias, lojas de produtos naturais e suplementos alimentares. O preço varia, mas, em média, é possível adquirir o produto a partir de R$ 19.

*Fernando Guanabara é médico, com CREMEC 13226 / CREMESP 180494. É fundador e diretor do Complexo Stimma Saúde & Bem-Estar e membro da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN). Profundo conhecedor da fisiologia hormonal e metabolismo humano. Na prática clínica, emprega o conceito sistêmico sobre saúde, entendido pela harmonia entre os estados físico e mental do ser humano.

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