Quem são as lideranças de facção por trás de ataques e ameaças a moradores no Vicente Pinzón

Na última quinta-feira (17), as forças de segurança do Ceará iniciaram uma operação integrada no bairro

Escrito por
Emanoela Campelo de Melo emanoela.campelo@svm.com.br
(Atualizado às 06:43)
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Legenda: Segundo levantamento da Prefeitura de Fortaleza residem cerca de 45 mil pessoas no bairro Vicente Pinzón
Foto: Natinho Rodrigues

Por trás das ameaças a moradores, ataques e até mesmo homicídios no bairro do Vicente Pinzón, em Fortaleza, estão três nomes de lideranças da facção criminosa Guardiões do Estado (GDE). Conforme documentos a que a reportagem teve acesso, o trio lidera os crimes na região desde o último mês de março e tenta coagir moradores a apoiar o grupo criminoso ao qual pertencem.

Francisco Carlos Davi Filho, o 'Pedim'; Andreza Ferreira de Souza, a T.A'; e Mikael da Silva Oliveira Pereira, o 'Tchuco', são acusados formalmente por, pelo menos, um assassinato, uma tentativa de homicídio no bairro. No entanto, o grupo é investigado por outras mortes que ocorreram na região nos últimos meses.

'Pedim' é quem comandaria a região da 'Cidade de Deus' e "é o responsável por liderar ataques, homicídios e expulsões de moradores da localidade das Placas, na tentativa de coagir os moradores a apoiar a facção GDE". Junto a Andreza e 'Tchuco' executariam ordens para matar, principalmente, àqueles que mostrassem se opor à GDE.

'Pedim' foi preso na última sexta-feira (18) devido a um mandado de prisão em aberto pela morte de João Vitor Dias Pereira. Andreza e Mikael já estavam detidos

Na última quinta-feira (17), as forças de segurança do Ceará iniciaram uma operação integrada no bairro. O governador do Ceará, Elmano de Freitas, acompanhou a saída de policiais militares, civis e penais para a operação com objetivo de "coibir crimes violentos letais e intencionais e inibir a atuação de organizações criminosas".

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Segundo o chefe do Executivo Estadual, os últimos indicadores criminais apontam que "efetivamente há uma disputa de facções por territórios, uns faccionados tirando a vida de outros faccionados".

Conforme Elmano, é preciso "proteger a população e a vida de todos os cearenses que estão no meio disso", e a escolha de começar a megaoperação no Vicente Pinzón se dá pelos homicídios registrados na região.

REVIDE A UM ATAQUE

Segundo informações obtidas pela reportagem em documentos que fazem parte da investigação, no dia 26 de março de 2025, João Vitor Dias foi morto a tiros "em circunstâncias que indicam um possível revide a um ataque prévio. Familiares da vítima que estavam no local informaram para a equipe de local de crime que a vítima era envolvida com facções criminosas e que residia na comunidade das Placas e que o local onde o crime ocorreu se trata da comunidade conhecida como “Fazendinha”, a qual estaria na iminência de ser tomada pela facção denominada “Massa”.

Além disso, afirmaram que a vítima teria ido ao local do fato para realizar um atentado, mas acabou sendo morta em confronto".

Mikael foi reconhecido por testemunhas como um dos autores do ataque ordenado por Andreza e 'Pedim'.

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Legenda: Muros pichados com sigla de facção no bairro. Local próximo aonde o corpo de João Vitor Dias foi encontrado
Foto: Arquivo/Diário do Nordeste

A testemunha afirmou que Andreza estava expulsando moradores da comunidade das Placas, "caso não concordassem em se aliar à 'GDE'. Informou também que, após as ameaças de Andreza, precisou sair da comunidade para não ser morta pelo referido grupo criminoso".

João Vitor já usava tornozeleira eletrônica e, supostamente, queria sair da 'GDE' para integrar a facção 'Massa Carcerária' ou 'Tudo Neutro'.

No bairro, era 'Pedim' quem estaria ordenando pichações nos muros com ordens aos moradores. Em um dos escritos, segundo os documentos, constava que 'Moradores contra a GDE tinham 24 horas pra sair, se não iriam explodir tudo' (sic).

MORADORES ATERRORIZADOS

Nos últimos meses, segundo fontes ligadas à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), os grupos armados Comando Vermelho (CV) e GDE travam disputa por território de drogas na região.

Tiroteios e homicídios amedrontam os moradores, que passaram até mesmo a alterar suas rotinas habituais: "academia que fechava às onze da noite, agora fecha às nove horas. As pessoas têm medo de sair de casa, a gente tá vivendo dias de terror" (sic), disse uma moradora que reside no local há mais de 30 anos.

"Tá uma guerra mesmo, Castelo Encantado, Cais do Porto, o grande Vicente Pinzón. Olha, pra gente tá muito difícil. Uber tem dificuldade de entrar no bairro. Há duas semanas tá um desespero, horrível. Muitas mortes. Ainda bem que a Polícia está muito presente, Polícia tem bastante, mas mesmo assim a gente se sente muito inseguro. Está todo mundo aterrorizado mesmo, com medo"
Moradora

A mulher, de identidade preservada, diz ainda que "quando dá oito da noite ninguém mais fica na calçada, nem na porta de casa. É todo mundo dentro de casa e de porta trancada. É Polícia direto, não para. Polícia que a gente nunca nem tinha visto. É a nossa sorte, Deus e a Polícia, porque tá uma guerra mesmo, um negócio sinistro".

De acordo com as estatísticas da Superintendência de Pesquisa e Estratégia da Segurança Pública do Ceará (Supesp-CE) vinculada à SSPDS, de janeiro até junho foram registrados 19 Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) na Área Integrada de Segurança (AIS) 1, que abrange os bairros Vicente Pinzón, Cais do Porto, Mucuripe, Aldeota, Varjota, Praia de Iracema e Meireles.

O ápice da violência no primeiro semestre deste ano na AIS 1 foi em abril, com seis mortes violentas.

Um dos casos mais emblemáticos foi o assassinato do skatista Marco Felipe Mendes de Sousa, o 'Felipe Maracajá', de 15 anos, vítima de um 'Tribunal do Crime'.

O adolescente foi torturado e morto a tiros no último dia 30 de junho. A vítima foi interceptada e cercada em via pública, no bairro Vicente Pinzón, pelos criminosos, que seriam integrantes da GDE.

Pelo menos seis suspeitos foram flagrados participando diretamente do homicídio. Quatro foram presos e são suspeitos de integrarem a facção Guardiões do Estado. Não há indicação que Felipe integrava ou não uma facção criminosa.

 

 

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