Mais instruídas que homens, mulheres têm menor inserção no mercado e vida pública, diz IBGE

Menores remunerações e maiores dificuldades enfrentadas pelas mulheres no mercado de trabalho não podem ser atribuídas à educação, diz a pesquisa

Escrito por Cinthia Freitas , cinthia.freitas@svm.com.br
Legenda: Mulheres receberam, em média, 77,7% do rendimento dos homens em 2019
Foto: Shutterstock

A falta de políticas sociais que conduzam à equidade de gêneros continua promovendo um arranjo social que privilegia homens e deixa mulheres em condições inferiores em esferas como a do mercado de trabalho e a de tomadas de decisão. É o que mostram os dados da segunda edição da pesquisa "Estatísticas de Gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil", publicada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nesta quinta-feira (4). 

Segundo os números, em média, as mulheres são mais escolarizadas do que homens, mas continuam tendo menor inserção no mercado de trabalho e na vida pública em geral.  

“As menores remunerações e maiores dificuldades enfrentadas pelas mulheres no mercado de trabalho não podem ser atribuídas à educação. Pelo contrário, os dados disponíveis apontam que as mulheres brasileiras são em média mais instruídas que os homens”, destaca a pesquisa.  

Em 2019, a “taxa ajustada de frequência escolar líquida no ensino superior” foi de 29,7% para mulheres e 21,5% para homens.   

Veja também

Já em relação à taxa de participação, que mede a parcela da população em idade de trabalhar que está na força de trabalho (ou seja, atuando ou buscando emprego), há uma diferença de 19,2 pontos percentuais entre homens e mulheres. Os homens têm taxa de participação na força de trabalho de 73,3%, contra 54,4% das mulheres.  

“O patamar elevado de desigualdade se manteve ao longo da série histórica e se manifestou tanto entre mulheres e homens brancos, quanto entre mulheres e homens pretos ou pardos”, aponta a pesquisa.  

Filhos e mercado de trabalho 

As desigualdades se aprofundam de acordo com o perfil da família. Conforme a estatística, mulheres sem filhos têm maior ocupação no mercado: 67,2%. Já aquelas com filhos tiveram 54,6% de participação em 2019. 

“O nível de ocupação dos homens é superior ao das mulheres em ambas as situações, sendo inclusive maior entre os homens com crianças com até três anos vivendo no domicílio, situação em que a diferença para as mulheres chegou a 34,6 pontos percentuais em 2019”, destaca a pesquisa. 

Mulheres pretas ou pardas com crianças de até três anos no domicílio apresentaram os menores níveis de ocupação – menos de 50% em 2019. “Ao passo que, entre as mulheres brancas, a proporção foi de 62,6%. Para aquelas sem a presença de crianças nesta faixa etária, os percentuais foram de, respectivamente, 63,0% e 72,8%.” 

Segundo o IBGE, a divisão social do trabalho que leva mulheres a dedicarem quase o dobro do tempo que os homens aos cuidados de pessoas e afazeres domésticos é um fator considerado “limitante” para uma maior e melhor participação delas no mercado de trabalho. 

“Embora na Região Sudeste as mulheres dedicassem mais horas a estas atividades (22,1 horas), a maior desigualdade se encontrava na Região Nordeste. O recorte por cor ou raça indica que as mulheres pretas ou pardas estavam mais envolvidas com os cuidados de pessoas e os afazeres domésticos, com o registro de 22,0 horas semanais em 2019, ante 20,7 horas para mulheres brancas. Para os homens, contudo, o indicador pouco varia quando se considera a cor, raça ou região.” 

Educação  

Em relação ao acesso à educação, as desigualdades são ainda mais evidentes para as mulheres pretas ou pardas. A frequência escolar no ensino superior de mulheres brancas (40,9%) é quase 50% maior do que de mulheres pretas ou pardas (22,3%) entre 18 e 24 anos. Em comparação a homens brancos (30,5%), a taxa de frequência de mulheres pretas ou pardas é quase 30% menor.  

A menor taxa ajustada de frequência escolar líquida se verificou entre os homens pretos ou pardos (15,7%).  

As estatísticas também ressaltam a diferença de gêneros no corpo docente no ensino superior.  

“Apesar do maior acesso ao ensino superior, as mulheres ainda são ligeiramente minoritárias entre os docentes desse nível de ensino. Em 2019, segundo o Censo da Educação Superior, as mulheres representavam 46,8% dos professores de instituições de ensino superior no Brasil. Essa proporção vem crescendo, ainda que lentamente, nas últimas duas décadas. Desagregada por Unidades da Federação, a Proporção de mulheres entre os docentes de ensino superior atinge extremos de 51,8% na Bahia e 43,4% em São Paulo.”   

Legenda: Desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho

Salários desiguais  

A remuneração também é desigual entre os gêneros, com as mulheres recebendo 77,7% do rendimento dos homens em 2019. Segundo o IBGE, o desequilíbrio é maior entre as pessoas inseridas nos grupos que recebem maiores salários, como diretores e gerentes, e profissionais das ciências e intelectuais. Nesses grupos, as mulheres receberam, respectivamente, 61,9% e 63,6% do rendimento dos homens.  

Quando o tema é liderança no mercado de trabalho, o levantamento mostra que 62,6% dos cargos gerenciais no Brasil eram ocupados por homens, enquanto apenas 37,4% eram ocupados por mulheres.  

“A desigualdade entre mulheres brancas e os homens brancos era maior do que entre as mulheres pretas ou pardas e os homens de mesma cor ou raça, em 2019. Tal resultado pode decorrer do fato de que a maior desigualdade por sexo foi encontrada nos 20% da população ocupada com os maiores rendimentos do trabalho principal (77,7% contra 22,3%), em que se concentram as pessoas brancas, revelando, também, que as mulheres estão ainda mais sub-representadas em cargos gerenciais mais bem remunerados e com potencialmente mais responsabilidades. Do mesmo modo, a desigualdade se aprofunda nas faixas etárias mais elevadas”, ressalta a pesquisa. 

Mulheres na vida pública 

No Brasil, o percentual de parlamentares mulheres em exercício nas câmaras baixas (câmara de deputados) ou parlamento unicameral passou de 10,5%, em dezembro de 2017, para 14,8%, em setembro de 2020. 

De acordo com o IBGE, apesar do aumento, o Brasil era o país da América do Sul com a menor proporção de mulheres exercendo mandato parlamentar na Câmara dos Deputados e encontrava-se na 142ª posição de um ranking com dados para 190 países. 

O País fica atrás de países como Ruanda, Cuba, México, África do Sul, Namíbia e Suriname, por exemplo. 

A sub-representação é ainda mais profunda em relação a mulheres pretas e pardas. “Embora representassem, respectivamente, 9,2% e 46,2% das mulheres na população em 2019, alcançaram 5,3% e 33,8% das cadeiras nas câmaras municipais obtidas pelas mulheres nas eleições de 2020”, diz a pesquisa. 

“Assegurar às mulheres igualdade de oportunidades nos processos de tomada de decisão é uma meta tanto do CMIG quanto da Agenda 2030. Segundo esses parâmetros, as mulheres devem participar efetivamente da vida pública, em seus campos cívico, econômico e político, assumindo posições de liderança tanto no setor público, quanto no setor privado”, informa o IBGE.

Os destaques das últimas 24h resumidos em até 8 minutos de leitura.
Assuntos Relacionados