Alvo de polêmica, livro 'O Avesso da Pele' vira leitura obrigatória de vestibular no RS

Universidade pública passa a adotar obra de Jeferson Tenório que foi recolhida em três estados

Escrito por Marcos Moreira , marcos.moreira@svm.com.br
Exemplares do ‘O Avesso da Pele’ foram recolhidos após críticas da oposição ao Governo Federal
Legenda: Exemplares do ‘O Avesso da Pele’ foram recolhidos após críticas da oposição ao Governo Federal
Foto: Divulgação

O livro ‘O Avesso da Pele’, do escritor Jeferson Tenório, passou a integrar a lista de leitura obrigatória para o vestibular de 2025 da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A inclusão foi divulgada pela instituição nesta quinta-feira (28).

Além da publicação, três produções foram incluídas na lista obrigatória estruturada pela Comissão Permanente de Seleção (Coperse) da UFRGS. As outras novas obras são: ‘Niketche: uma história de poligamia’, de Paulina Chiziane; ‘Mas em que mundo tu vive’, de José Falero; e uma seleta de canções de Lupicínio Rodrigues. 

‘O Avesso da Pele’ passou a integrar a listagem em meio à polêmica de recolhimento de exemplares do livro em escolas públicas de três estados: Paraná, Goiás e Mato Grosso do Sul. As secretarias de Educação avaliaram que a obra traz passagens consideradas impróprias para menores de 18 anos.

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Em Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul, a diretora de uma escola da região fez um vídeo acusando o livro de usar palavras de "baixo calão" e de conter passagens de atos sexuais. Segundo o autor da obra, após a repercussão e de uma moção de um vereador da cidade gaúcha, a 6ª Coordenadoria Regional de Educação mandou recolher os exemplares de escolas e bibliotecas. A Secretaria de Educação do RS negou a orientação para a devolução da obra.

ENTENDA O CASO

No início de março, ‘O Avesso da Pele’ foi alvo de críticas de políticos da oposição ao Governo Federal, como a deputada federal Bia Kicis (PL). Em publicação no Instagram, a parlamentar diz que o “Ministério da Educação distribuiu para instituições de ensino públicas um livro que contém trechos com descrições explícitas de atos sexuais.” Após a repercussão, exemplares da obra passaram a ser recolhidos em alguns estados do Brasil.

A publicação literária faz parte do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) do Ministério da Educação desde 2022, ainda no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). De acordo com o MEC, as obras que compõem o catálogo são avaliadas por professores, mestres e doutores. Após aprovação, as escolas escolhem os materiais que mais se adequam à sua realidade pedagógica.

Segundo a pasta, “peças de desinformação” estavam distorcendo a escolha da obra como material didático no Brasil. A pasta defendeu que o “envio de obras literárias para escolas sem o devido e expresso interesse das instituições é falso.”

Ganhadora do Jabuti, principal prêmio literário brasileiro, o ‘O Avesso da Pele’ trabalha identidade, racismo e violência como temas centrais. A narrativa traz a história de Pedro, que, após a morte do pai, assassinado em uma abordagem policial, sai em busca de resgatar o passado da família e refazer os caminhos paternos.

AUTOR APONTA CENSURA

Em uma série de publicações nas redes sociais, o autor Jeferson Tenório denunciou o que chamou de “censura” ao livro. “O mais curioso é que as palavras de 'baixo calão' e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras. Não vamos aceitar qualquer tipo de censura ou movimentos autoritários que prejudiquem estudantes de ler e refletir sobre a sociedade em que vivemos”, apontou.

O escritor defendeu ainda que nenhuma autoridade tem o poder de mandar recolher materiais pedagógicos de uma escola. “É uma atitude inconstitucional. É um ato que fere um dos pilares da democracia que é o direito à cultura e à educação. Não se pode decidir o que os alunos devem ou não ler com uma canetada.”

Motivada pelo caso no Paraná, a editora Companhia das Letras entrou com um mandado de segurança na Justiça para tentar barrar o recolhimento de exemplares do livro de bibliotecas de escolas do Estado. O instrumento judicial busca impedir um ato considerado ilegal ou abusivo por parte de autoridade pública.

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