OAB-CE recorre na Justiça contra captação de conversas entre presos e advogados

A medida judicial vale por 180 dias, cerca de 6 meses.

Escrito por
Bergson Araujo Costa bergson.costa@svm.com.br
(Atualizado às 18:34)
Unidade Prisional de Segurança Máxima do Estado, localizada em Aquiraz, no Ceará.
Legenda: Sistema foi instalado na Unidade Prisional de Segurança Máxima do Estado, localizada em Aquiraz.
Foto: Carlos Gibaja e Thiara Montefusco / Governo do Ceará.

A Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB-CE) anunciou, nesta terça-feira (16), que recorreu contra a decisão do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) que autoriza a captação de conversas entre presos e advogados na Unidade Prisional de Segurança Máxima do Estado, localizada em Aquiraz, no Ceará.

A medida foi determinada pela 3ª Câmara Criminal do TJCE, ao acatar pleito do Ministério Público Estadual. A tecnologia, já utilizada em presídios federais, com o objetivo de intensificar o controle sobre a comunicação de detentos de alta periculosidade, foi instalada nessa segunda-feira (15).

A medida judicial vale por 180 dias (cerca de 6 meses). Após esse prazo, a Justiça deve avaliar se prorroga ou encerra a captação ambiental na Unidade de Segurança Máxima.

A presidente da OAB-CE, Christiane Leitão, afirmou que a medida é inconstitucional e que a Ordem já recorreu ao TJCE e analisa a possibilidade de recorrer às instâncias superiores, se necessário.

“Entendemos que essa decisão afronta diretamente a prerrogativa do advogado prevista no artigo 7º do Estatuto da Advocacia e da OAB, que assegura o direito à entrevista reservada com o cliente, além de estar expressamente prevista na Lei de Execução Penal. Trata-se também de uma violação à Constituição Federal, por comprometer a ampla defesa”, pontuou Christiane.

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“ENFRAQUECIMENTO DO DIREITO DE DEFESA”

Foto de Christiane Leitão.
Legenda: Christiane Leitão, presidente da OAB-CE.
Foto: Davi Rocha / SVM.

Para a presidente, a decisão viola frontalmente garantias fundamentais do exercício da advocacia e do próprio sistema de justiça. Segundo ela, nenhuma política de segurança pode justificar o enfraquecimento do direito de defesa e das prerrogativas profissionais, que são instrumentos de proteção do cidadão.

“Não é razoável que, de forma antecipada, terceiros tenham acesso às tratativas entre advogado e cliente. Repudiamos quaisquer generalizações que atinjam a honra e a dignidade da advocacia cearense, formada, em sua imensa maioria, por profissionais éticos”, disse Christiane. 

A presidente afirma que, havendo eventual conduta ilícita por parte de advogado, a própria OAB dispõe de mecanismos institucionais para a devida apuração, por meio do Tribunal de Ética e Disciplina, sempre com observância do devido processo legal. 

“O que não se pode admitir é que toda a advocacia seja submetida a monitoramento, como se houvesse uma presunção coletiva de irregularidade. Trata-se de medida extrema, que afronta o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa”, completou.

“MUDANÇA PREOCUPANTE”

O diretor adjunto de Prerrogativas da OAB-CE, Márcio Vitor Meyer de Albuquerque, destacou que a Ordem acompanha o caso desde a primeira instância e que a decisão representa uma mudança preocupante de entendimento. 

“A OAB-CE tem acompanhado esse caso desde o início. Em primeira instância, na Vara da Corregedoria dos Presídios, o juiz corregedor negou o pleito do Ministério Público. No entanto, no Tribunal de Justiça houve essa mudança de posicionamento, e os desembargadores determinaram o monitoramento das conversas. Diante disso, estamos ingressando com todos os recursos cabíveis nas instâncias superiores”, afirmou.

A OAB-CE, em comunicado, reiterou que seguirá na defesa das prerrogativas da advocacia e do Estado Democrático de Direito, mantendo-se distante de qualquer politização do tema.

PRESOS FACCIONADOS

Presidio em Aquiraz.
Legenda: A tecnologia foi adotada a partir de pedido formalizado pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE).
Foto: Divulgação/MPCE.

Conforme noticiado pelo Diário do Nordeste, a maioria dos presos que se encontra na Penitenciária de Segurança Máxima é apontada como liderança de facções criminosas que atuam no Ceará. Assim, o sistema evitaria que os chefes de facções criminosas que estão presos ordenem crimes a serem cometidos nas ruas, transmitidos por advogados.

Nessa segunda, o procurador-geral de Justiça, Haley Carvalho, esteve na unidade para verificar de perto a implantação do sistema e avaliar os dispositivos de segurança atualmente em operação. Ele esteve acompanhado de promotores de Justiça que atuam diretamente em órgãos de investigação e inteligência do MP.

“Essa é uma medida estratégica para romper a cadeia de comando entre os chefes de facções e o mundo externo. Com esse nível de monitoramento, o Estado do Ceará dá um passo importante no enfrentamento à criminalidade organizada e reafirma o protagonismo do Ministério Público nesse processo”, afirmou o PGJ.

O que se sabe sobre o recurso

Imagem mostra tecnologia em presídio de Awuiraz.
Legenda: O procurador-geral de Justiça, Haley Carvalho, esteve na unidade para verificar de perto a implantação do sistema.
Foto: Divulgação/MPCE.

tecnologia foi noticiada pelo Diário do Nordeste em novembro. De acordo com o MPCE, "a medida representa um marco para a segurança pública estadual".

"Até então, a ausência de autorização para gravação ambiental era uma das principais justificativas para transferências de presos dessa unidade para o sistema prisional federal. Agora, com a nova estrutura, o Ceará passa a contar com o mesmo nível de controle adotado nos presídios federais de segurança máxima”, afirmou o MPCE.

O secretário executivo de Planejamento e Gestão Interna da Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará (SAP-CE), Álvaro Maciel, também esteve presente na instalação.

Também participaram da visita os promotores de Justiça Adriano Saraiva, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco); Breno Rangel, coordenador do Núcleo de Apoio Técnico à Investigação (Nati); Nelson Gesteira, do Núcleo de Segurança Institucional e Inteligência (Nusit); e Patrick de Oliveira, também integrante do Gaeco.

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