Líder do CV que ordenou morte de jovem após homicídio em 'brincadeira' de 'roleta russa' vai a júri
O réu já responde pelo crime de roubo e será julgado por homicídio qualificado e associação criminosa
A 3ª Vara do Júri de Fortaleza decidiu que um líder do Comando Vermelho (CV), acusado de ser o mandante da morte de um adolescente, no bairro Barroso, irá a júri popular. A sentença de pronúncia foi proferida na última segunda-feira (6).
O Poder Judiciário levou em consideração a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE) sobre o caso. Segundo o órgão acusatório, o réu, identificado como Marlon Gomes Alves, conhecido como 'MR' ou 'TI', teria ordenado o assassinato de Luan Victor Rocha Mesquita Marinheiro, o 'Gordim', em 8 de novembro de 2022.
Até a publicação desta reportagem, a defesa de Marlon Gomes não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestações futuras.
No documento sobre a investigação do caso, que a reportagem teve acesso, é narrado que, no dia anterior ao crime, Luan Victor teria matado de forma acidental um colega durante uma "brincadeira de roleta russa".
Essa atividade perigosa consiste em um jogo de azar em que apenas uma bala é colocada no tambor de um revólver, e pessoas alternam o controle da arma enquanto giram o tambor mirado na cabeça.
O colega de Luan, reconhecido como Ronald Oliveira Freire, era integrante da mesma facção criminosa que o réu. Por isso, conforme a denúncia do MP, após saber da morte do rapaz, Marlon Gomes ordenou que a vítima fosse assassinada como um ato de vingança.
"No relatório técnico produzido a partir da análise dos dados extraídos do aparelho celular apreendido com o irmão do denunciado, o indivíduo Mateus Gomes Alves, comenta sobre a dinâmica do homicídio da vítima deste procedimento, afirmando que 'foi porque ele matou o Rony sem querer... Mas matou, aí o cara mandou matar'”, diz um trecho do documento, obtido pelo Diário do Nordeste.
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'Tropa do MR'
A morte de Luan aconteceu em um condomínio comandado pelo CV no bairro Barroso. A denúncia do Ministério Público aponta que pichações encontradas no local, como 'Tropa do MR', uma alcunha associada ao grupo dominado pelo réu, indicam que ele possui um papel de liderança na área.
Para chegar aos indícios de autoria do crime, foram analisadas mensagens trocadas entre Marlon Gomes e pessoas próximas a ele. Trechos de conversa encontrados nos aparelhos celulares do irmão do acusado, Mateus Gomes Alves, mostram que o réu anunciava "ser dono" do território onde o crime ocorreu.
Mateus Gomes também teria mandado mensagens à mãe dele confirmando o envolvimento do CV na morte de Luan Victor. "Quando questionado pela sua genitora se quem matou Luan foi 'os pilantra', ele responde que 'foi os menino', numa evidente comprovação que os responsáveis pela morte da vítima foram membros da própria organização criminosa", complementa a denúncia do MP.
O órgão também acusa Marlon Gomes de envolvimento com tráfico de drogas, após um episódio com a companheira dele. Durante as investigações, policiais teriam ido à casa da mulher para procurar o réu. Enquanto isso, uma pessoa fugia pela porta dos fundos e jogou um pacote com 9,4 kg de maconha no telhado.
As suspeitas iniciais dos investigadores eram de que o fugitivo em questão seria o réu. Contudo, até o momento, nenhuma prova foi apresentada no inquérito que sustente esse indício.
Motivação torpe
Após levantados os indícios, o Ministério Público entendeu que o crime aconteceu com motivo torpe. "Nesse contexto, as informações colhidas durante a investigação indicam que os próprios integrantes da facção foram os executores da morte da vítima, sendo a execução ordenada pelo denunciado", cita o documento.
A sustentação do órgão ainda leva em consideração os depoimentos de quatro testemunhas, colhidos durante a fase de instrução do processo. Em um deles, é dito que moradores do condomínio onde o crime aconteceu acreditam que Luan Victor foi "jurado de morte", mesmo que ele tenha causado uma morte acidental.
Outra testemunha afirma que a vítima era associada à mesma facção criminosa que o réu, e que trabalhava como entregador em uma pizzaria e uma açaiteria.
Ouvido nas fases inquisitorial e judicial, o réu negou ser o mandante do crime, assim como estar associado ao Comando Vermelho. Ele também afirmou que no dia do crime estava no bairro Rodolfo Teófilo para "retirar uma tornozeleira eletrônica", resultado de um roubo que cometeu anteriormente.
Nos memoriais finais que a reportagem também teve acesso, a defesa dele sustenta que não há indícios que liguem Marlon Gomes à autoria do assassinato.
Veja-se que o Réu negou veementemente a prática das infrações penais narradas na inicial acusatória e que, analisando se os depoimentos prestados em juízo pelas testemunhas arroladas pelo MPCE, fácil é perceber-se que nenhuma delas sabe, viu ou ouviu falar quem teria sido o autor do disparo que matou Luan Victor
Decisão a favor do júri popular
No entendimento do Poder Judiciário, as provas apresentadas pelo MPCE são suficientes para ligar Marlon Gomes Alves ao assassinato de Luan Victor. O Juízo da 3ª Vara do Júri também afirma que a acusação de que crime foi cometido por motivo torpe deve ser levada em consideração pelo Conselho de Sentença.
"Coletaram-se indícios de que o réu integrava a organização criminosa Comando Vermelho e nela exercia posição de mando no bairro Barroso, mais especificamente na comunidade onde ocorreu o crime narrado nos autos, provas que se afiguram suficientes para levar essa tipificação penal ao Plenário do Júri, como crime conexo ao homicídio", disse o juiz na decisão da 3ª Vara do Júri de Fortaleza.
Contudo, o magistrado desconsiderou levar o réu a julgamento pelo crime de tráfico de drogas, pois não achou indícios suficientes para tal no depoimento da companheira do acusado.
Assim, Marlon Gomes irá ao Tribunal Popular do Júri pelos crimes de homicídio qualificado e associação criminosa, agravado pelo emprego de arma de fogo. A decisão cabe recurso.